domingo, 9 de agosto de 2020

KANT, o Moisés alemão...


Neste domingo de inverno, daqui de trás  das cortinas de minha prisão voluntária, ouvi o Mendigo K, lá na parada de taxi, discutindo com sete ou oito outros mendigos, sobre Kant. Sobre o Imperativo Categórico de Kant!
Sabe o que é isto?
Me parecia inacreditável! 
Pensei, antes de tudo, que o chá de cidreira que estava tomando pudesse estar me causado algum tipo de alucinação, mas apurei os tímpanos, passei as mãos pelos olhos e confirmei que se tratava da mais pura realidade. 
Imperativo categórico de Kant!?
Me recordo de ter ouvido esse papo de apenas um ou dois professores em minhas incursões academicas, que não foram poucas, e nada mais.
Um mendigo do grupo, inquieto e agressivo, com os pés apoiados nas rodas de um taxi, não se conteve e resmungou: Imperativo Categórico de Kante? Que porra é essa?
Ninguém lhe deu importância e o Mendigo K continuou suas explicações, agora até com um ar sacerdotal. Dizia, numa linguagem que parecia ser de outro mundo: trata-se de uma série de regras morais, de maneiras educadas de agir para com os outros, nossos irmãos, e para conosco mesmo. Truques para que sejamos bonzinhos, pacientes, tolerantes e tolerados!  Protocolos, obrigações que envenenaram o mundo para sempre! Categorias de ameaças que imperam no mundo contra quem tente deixar-se levar pelos instintos. Quase como uma ética primitiva para subalternos; um TCC sobre a subserviência necessária para que o mundo superior nos deixe seguir existindo, satisfeitos com um ou outro cobertor no inverno e com um ou outro litro de leite, na primavera, e, para que assim, eles possam seguir cumprindo com o Imperativo Categórico deles por lá e nos cumprindo o nosso Imperativo Categórico por aqui! Sei lá, digamos que trata-se de um chamado para que cada um cumpra com os desígnios e propósitos de seu destino, de sua bondade inata! Me entendem?? 
Tanto a mendigada como os taxistas estavam visivelmente furiosos com aquele papo surrealista e sem sentido. O mesmo mendigo que estava com os pés apoiados nas rodas de um taxi, deu uma cusparada para o lado e vociferou: Em síntese, esse cara, esse tal de Kant, seria então mais ou menos como uma espécie de Moisés alemão!
Todos gargalharam sem saber exatamente a razão e o "seminário" foi encerrado.



Nenhum comentário:

Postar um comentário