segunda-feira, 31 de agosto de 2020

Sobre a vacina russa... (No jornal cubano de ontem)

 

Tal como ocorreu desde o início da pandemia, perante o anúncio da Rússia de que tem pronta a primeira vacina contra a Covid-19, no mundo se contrapõem duas maneiras de ver a realidade.

Por um lado, países como Cuba, China e a Rússia coincidem em promover o multilateralismo e a solidariedade para enfrentar a Covid-19, enquanto os EUA e seus aliados mais próximos torcem pela concorrência desleal, o unilateralismo e a falta de solidariedade.

O anúncio da Rússia gerou de imediato as mais diversas reações. Por um lado, a negativa dos grandes meios de comunicação ocidentais de anunciar a boa nova, e por outro, a diatribe imediata e a negação de alguns governos ocidentais da capacidade desse país para produzi-la com a qualidade necessária.

O ministro da Saúde russo, Mikhail ­Murashko declarou, em 12 de agosto, que as críticas de colegas estrangeiros à vacina «são infundadas».

Alexandre Guintsburg, diretor do Centro de Epidemiologia e Microbiologia Gamaleya, com sede em Moscou, afirmou que, em seu tempo, a Organização Mundial da Saúde (OMS) foi informada dessa tecnologia que «foi testada sob todas as condições possíveis e foi tema de publicações e debates».

Além do mais, os fármacos criados a partir dessa tecnologia ajudaram a proteger as pessoas do vírus do Ébola na África.

O Governo de Donald Trump tentou minimizar o avanço científico conseguido por Mosco, enquanto confia a todo o custo em seu «remédio miraculoso», seu próprio candidato de vacina.

Não é a primeira vez que a Rússia se enfrenta à desconfiança internacional sobre sua liderança na ciência, quando a política se interpõe no caminho dos avanços científicos.


domingo, 30 de agosto de 2020

A negação e os conflitos com a rachadinha...

[...Las mujeres? No sé, las inventaron los hombres. El movimiento de Liberación de la Mujer? No existe!, fue inventado por la prensa. No somos del movimiento, estamos en movimiento; no somos un grupo, somos un fenómeno...]
Entrevista de Mariella Reghini a estudiantes franceses
(IN: Ni diosa ni mártir p. 83)


O jornal aqui da cidade publica hoje a encrenca em que a escritora Joanne. K. Rowling (a criadora das bobagens de Harry Potter, aquela que já foi até casada com um português) está metida, por ter dito, nem sei em que contexto, que as pessoas que menstruam devem ser chamadas de mulher. Alguma novidade? Alguma heresia? 
Mas... os pelotões transgêneros, transplanetários e das causas impossíveis consideraram isso uma desumanidade, uma falta de humanismo, um crime reacionário, fascista e hediondo e voltaram imediatamente suas metralhadoras de festim contra ela passando a acusá-la de ser trans-fóbica. Trans-fóbica? Que merda e que porra é essa? E se for? Qual é o problema? Em primeiro lugar, as fobias não podem ser confundidas com ideologias; em segundo lugar, o direito de pensar e de dizer o que bem se entende é fundamental para que a pessoa tenha o mínimo de soberania, e em terceiro lugar, é evidente que quem menstrua, veio pelos séculos a fora sendo conhecida por mulher, fêmea, e até por adjetivos nada nobres. Ali no setor de oficinas mecânicas - por exemplo - chamam fêmea a uma peça com um buraco que se adapta a outra... 
Parole! Parole! 
Se quiserem, a partir de agora, por amor a uma causa ainda misteriosa, podem passar a chamá-la de JTU4, ou FRB3 ou por qualquer outro codinome, mas tendo consciência que o tal menstruo, como bem disse a senhora Joanne, qualquer idiota e qualquer veterinário sabe, é um transtorno e uma estupidez mensal com a qual, por sorte, foram condenadas apenas as mulheres.

Em síntese: uma sociedade falida, falsificada e medíocre que, há no mínimo dois mil anos, vem cambaleando, desesperada e delirante em busca de um 'consolo' deveria ter mais auto-critica, harmonizar-se de uma vez por todas com as rachadinhas, lembrar que são elas que movem o mundo e que, se não despertarmos agora, um dia ainda iremos ter vergonha e gargalhar de tudo isso...








quinta-feira, 27 de agosto de 2020

A Flor-de-lis, o Padre Eterno, O passaporte paraguaio, o Messi, A casa Verde/Amarela e os 7 tiros pelas costas lá nos EEUU...




Até os entregadores de gás, enquanto regulam o registro dos bujões, não param de falar da Flordeliz. Não da planta, mas da pastora do Rio de Janeiro, aquela que, segundo a policia de lá, mandou um de seus 50 "filhos" meter trinta balaços no seu marido e também pastor... Quanto aos tiros, ninguém está muito  surpreso, o que realmente causou um terremoto, principalmente no mundo masculino, foi a doçura e a simulação daquela mulher durante o funeral. Qualquer um diria que se tratava de uma mulher loucamente religiosa e perdidamente apaixonada pelo morto... Quem é que poderia supor que havia sido ela a decretar o seu fim? Quantos de nós podemos ter uma Flordelis em casa, sem saber? (gargalhou) 

Fez um silêncio e perguntou: E por quê Flordeliz?  Logo essa flor que enfeitava os jardins de todas as nossas avós e que tem um lugar quase sagrado tanto na mitologia como nas religiões... Sabia que suas três pétalas representam a fé, a sabedoria e o valor? Que os imigrantes italianos traziam seus bulbos umedecidos junto a escapulários e patuás no fundo dos baús já que para eles (os católicos), a flor era o símbolo da Santíssima Trindade? Pura literatura!

E que os gregos, naquele panteísmo e naquela viadagem toda, depois de uns tragos de absinto, gostavam de dizer que essa flor havia sido semeada aqui na terra, por uns respingos de leite que escorreram das tetas da deusa Hera?

Enfim, o caso escabroso e surreal dessa senhora, (que era deputada, pastora, mãe  de uns 50 filhos e esposa do morto) colocou em cheque e aprofundou a falência dessas 4 instituições... Concorda?

Disse isso já quase terminando de regular o gás e, antes de sair, agregou. E se não bastasse isso, tem o caso do padre ali do interior de Goiás, aquele que gerenciava a igreja do Pai Eterno que, segundo noticias de jornal, estava desviando o dinheiro dos fiéis para a compra de fazendas, casas de praia e etc. Dizem que  o papa argentino, logo que percebeu um crash no Livro Caixa despachou  fiscais e auditores para o vilarejo goiano para verificar os desvios. Disse isso e puxou do bolso traseiro das calças um Carnet através do qual sua mulher contribui todos os meses com aquela confraria... E - agregou, com indignação - são milhões de pessoas ingênuas e quase primitivas, país a fora, enviando dinheiro para os Bancos do Vaticano, através desses lobistas... E o que mais me intriga, é que até  lá no Evangelho de Lucas (VI,35), está bem claro: emprestai sem nada esperar. E  que um outro Cânone, sobre o assunto, afirma: Há usura onde se reclama mais do que se dá.... Sem falar de Santo Anselmo, que acusava: A usura é, em primeiro lugar, um roubo!...

Chamou o elevador e continuou: Sem falar daquele jogador gaúcho que foi preso por falsificar um passaporte paraguayo! Me diga: o que é que leva um sujeito a querer ter nacionalidade paraguaya? Seria resquícios de nostalgia jesuítica pela anedótica Republica Comunista Guarani (1610-1768)? Ou uma paixão desmedida pela harpa e pelas Guarânias?

E já que falamos em jogador de futebol, e o Messi? O populacho inteiro está perturbado com os trilhões com que aquele sujeito está sendo negociado entre as confrarias circenses e dos esportes. Enquanto isso, o governo, com sua Casa Verde-Amarela, quer tirar migalhas dos pobres para dá-las aos indigentes... (nada mais que uma teologia e uma filosofia da miséria!)...

E o policial, lá nos EEUU, que deu 7 tiros nas costas de um moço desarmado? O século XXI ficará conhecido, principalmente por imagens como essa...

Aos curiosos que queriam saber com que ela havia sido tratada, a velhinha de 107 anos que se recuperou da COVID, respondeu: com uma laranja por dia!

Que uma civilização como esta ainda não tenha sido extinta e dizimada, é uma irresponsabilidade e um mistério... 

Foi sua última frase ao colocar o bujão vazio às costas e antes de entrar no elevador

Voltei para uma das janelas de minha prisão e resmunguei esta frase, de Rétif de la Betonne:  este brilhante bazar de vaidades e de misérias humanas me atrai, sobretudo, pelo preciosos divertimentos que proporcionou à minha carne e a meu espírito...


 


segunda-feira, 24 de agosto de 2020

Trotsky, o homem da Revolução permanente e que papou Frida Kahlo...

  


 Esta semana foi rica em memórias, em discursos e em textos elogiosos ao Kamarad Trotsky. Quem é que não se lembra dele? E são ainda muitos os trotskistas pelo mundo a fora... E ninguém duvida de sua genialidade. Mas... cresceu demais e despertou a fúria maligna de seus camaradas, o principal deles, Stalin, el sepultero, como o chamou o jornal mexicano quando noticiou o assassinato, em Coyoacan, na casa de Frida Kahlo (agosto de 1940).

Obcecado pela Revolução Permanente, a trajetória de Trotsky foi cheia de obstáculos políticos e familiares. Confinado na Sibéria, abandonou sua mulher e suas duas filhas, em nome da revolução. Viveu exílios na Turquia, na Alemanha, Paris e, finalmente, um exílio definitivo, na Cidade do México. Seu filho morreu numa prisão de Stálin e uma de suas filhas suicidou-se em Berlim. 

Nos tempos em que vivi na cidade do México, era quase uma rotina, nos finais de semana, ser empurrado pela turistada à tumba de Trotsky, em Coyoacan, no interior da antiga casa de Frida Kahlo, a pintora surrealista e mulher de Rivera, quem, Trotsky teria papado, (a Frida) sob as barbas do grande e bonachão muralista, de origem judaica, como Trotsky, e que tinha um nome de batismo, pra lá de longo e bizarro: Diego Maria de la Concepción Juán Nepomuceno Estanislao de la Rivera y Barrentos Acosta y Rodrigues... 

O matador de Trotsky, segundo opinião universal, o fez a mando do velho Stalin, quem o acusava, entre outras coisas, de ser fascista e, claro, por problemas psicopatológicos oriundos ainda dos tempos de Cain.

Para alguns exegetas, o tal matador, que o fez com uma espécie de picareta (quebra gelo), foi um sujeito disfarçado de jornalista e conhecido (nome falso) por Ramon Mercader (esse nome, por si só, deveria ter chamado atenção de um homem tão antenado como Trotsky), o fez a mando de sua mãe, uma senhora belga que havia sido espia e militante comunista. Como se vê, a culpa é sempre da mãe! Mas isto, agora, não tem a menor importância!, o que é de lamentar, é que Trotsky, que acusava seus opositores de, em breve, irem para um monte de cinzas da história, acabou transformando-se, ele próprio, precoce e prematuramente, num deles. E que está lá, nos fundos do atelier da Frida, anunciado por uma lápide vertical onde há, em baixo relevo, uma foice imensa, símbolo de sua ilusão, quase rabinica.

Sim, também esteve em exílio em Viena, onde Freud, um pouco antes, havia publicado o seu texto: O porvir de uma ilusão.

Enfim, 80 anos depois daquele horror estúpido, os trotskistas, por um lado, seguem alimentando e fomentando uma mitologia; os stalinistas, outra; os leninistas outra; os anarquistas, outra e os verdadeiros fascistas, outra... a respeito desse homem. y asi se van los dias...

O que verdadeiramente importa, nestes dias, quase um século depois do assassinato de Trotsky, é que continuamos mais ou menos na mesma merda... E que, na semana passada, um opositor político de alguém, lá na mesma e velha Russia, foi envenenado. Picaretas e peçonhas! Y asi se van los dias... 

Comprovando que, como Trotsky gostava de dizer, quase num ato de fé: A vida é uma semente difícil de abrir!

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EM TEMPO: Um assunto que sempre me chama atenção é a troca de nomes, como o fez Trotski. Como se sabe, seu nome de batismo era: Lev Davidovich Bronstein. Depois de uma temporada na cadeia, resolveu adotar para si o nome de um de seus carcereiros: Trotsky. Freud explica! Também o revolucionário vietnamita Nguyen Sinh Cung, resolveu adotar o nome de um mendigo que conhecia: Ho Chi-Min. Também o Derrida, que originalmente se chamava Jackie Élie Derrida e que passou a chamar-se Jacques Derrida. O Machado de Assis, que tinha no batismo o nome de Joaquim Maria Machado de Assis e o Sarney, ex presidente da república cujo nome completo era: José Ribamar Ferreira de araujo Costa.  (O caso do Diego Rivera, não preciso repetir)

sexta-feira, 21 de agosto de 2020

O afiador de facas cantarolando Et Si Tu N'existais Pas...

Lembram do afiador de facas, de tesouras, de canivetes, cortadores-de-unhas e etc, que costuma passar lá em baixo, nos jardins, empurrando um carrinho de madeira feito domesticamente, e que passa gritando: 
- Olha o afiador de facas! 
- Também conserto panelas, frigideiras, canecos... 
e que no meio de seus gritos, costuma ligar um aparelho de som? Não o via desde que começou 
o confinamento.
 Hoje apareceu, lá pelas  19:00 horas, já escurecendo. 
Deu seus gritos anunciando 
seus serviços e, meio impaciente, 
ligou o som e continuou sua marcha, solfejando a música. 
Muitas moradoras, umas jovens e outras, nem tanto, sairam emocionadas às varandas para ouví-lo e para, de alguma maneira, agradecer àquele sujeito, praticamente anonimo.   
A apoteose do dia, foi uma verdadeira "viagem"... Como diriam os preguiçosos do haikai: esta tarde jamais voltará!

O cio das pombas, os beija-flores e o Egoísmo dos genes...

"Guia teu cavalo pelo fio da espada

Esconde-te no meio das chamas"

(Sentença Zen) 


Com um extremo do país salpicado de gelo e o outro com o mesmo sol do Saara, o dia por aqui amanheceu com ar esquisito. Não apenas a temperatura, mas a luz e o movimento dos astros e das nuvens... Também no comportamento das pombas, dos sabiás, dos chupins, até dos gaviões e de outros pássaros que frequentam esta quadra, sinto que algo está alterado.  Se perseguem, se debatem entre as folhagens, se olham meio de lado, dão rasantes quase suicidas na beirada dos paredões dos prédios, uns para fugir dos outros. Que porra é essa?

Segundo uma moradora aqui dos arredores, enquanto apertava fortemente um rosário entre os dedos minúsculos da mão direita, é pura safadeza, estão em cio. Preste atenção, me dizia: são as pobres fêmeas em fuga, com os machos tarados e abusadores atrás delas querendo a parte que lhes cabe neste latifúndio... 

Acreditei, mas não convencido, liguei para um sujeito que conheço, um tal ornitólogo, que está há treze anos para concluir uma tese doutoral sobre a sexualidade de uma determinada espécie de beija-flor. Um tipo que não é o colibri comum, mas um outro das 320 espécies que, segundo ele, vem do Alasca passar a primavera por aqui e que tem uma mancha vermelha na nuca, dois olhinhos menores do que uma semente de papoula e três penas de uma cor de vinho infernal no rabo. 

Ele estava em reunião com seus sete orientadores, dois vindos da Alemanha, um de Vancouver e um de Puskar, cada um falando no seu idioma, mas mesmo assim, pediu licença a esses sábios, foi a um canto do auditório e falando baixinho, foi me explicando: Bazzo, a senhora do rosário, que falou em fornicação aviária, tem razão! Quando há uma mudança de estação, principalmente esta, isso mexe com os hormônios das aves em geral, mas principalmente dos hummingbird. E basta um raio de sol nas pupilas para transtorná-los. São mais ou menos como nós! E não só as pombas, há beija-flor que sai do Canadá para ir à la Tierra del Fuego ou para vir dar uma trepada aqui em Sobradinho. Muitos, apesar de terem um coração quase maior que o corpo, morrem pelo caminho, ao atravessar o Golfo do México ou o Triângulo das Bermudas, e os que chegam, frequentemente descobrem que sua pretendida ingressou num convento de carmelitas... outros, quando entram aqui nos trópicos, são logo papados por um carcará Zen ou por uma outra ave de rapina... 

Quer sacanagem e escravidão mais fdp do que esta? O que é que impede esses idiotas de treparem por lá mesmo? A propósito, Bazzo, você já leu o Egoísmo dos genes? Ou: o Gene egoísta?



quinta-feira, 20 de agosto de 2020

De cachorros, de proletários & de burgueses...

 


Os jornais ocidentais estão reproduzindo uma matéria, juntamente com esta foto de um jornal da Coréia do Norte, a respeito de uma nova lei daquele governo: O camarada Kim Jong-un está proibindo cachorros de estimação no país, com o argumento de que esse é um luxo, uma frescura da ideologia burguesa e, por fim, uma veleidade doentia e decadente do capitalismo. Deve ter lido alguma coisa de Cioran, para quem, nada é mais burguês do que um sentimento...

Quem não quer se desfazer voluntariamente deles, o Estado vai lá e os confisca. Uns são mortos, outros enviados a zoológicos e outros, vendidos a restaurantes. Que tal?

 

Enquanto isso... No coração e no imaginário do populacho...




quarta-feira, 19 de agosto de 2020

Aventuras e desventuras de uma espécie transtornada e pervertida...

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Nos últimos três dias tenho recebido diversas mensagens, uma mais indignada do que a outra, tratando do caso da menina de dez anos que foi abusada e engravidada por um sujeito adulto. 
Que se poderia dizer? 
Por mais que tenha tentado, não consegui deixar de ver semelhanças  significativas entre a loucura e o crime do estuprador e a loucura e o crime do bando fanático que cercou o hospital lá em Recife, tentando culpabilizar a vítima e impedir que o aborto fosse realizado... 
O transtorno e a base dos crimes é o mesmo!
O que foi feito com a sexualidade e com o cérebro dessa gente? 
E que estejam soltos, por aí, é quase inacreditável...

O mendigo K, que estava ouvindo pela centésima vez essa mesma história escabrosa, agora, de uma outra mendiga, lhe colocou a seguinte questão: Colega, além de um escândalo e de um crime moral, ético, social e civilizatório, existe aí também um crime de base que deve ser considerado e que até pode ser visto como tão ou mais grave ainda: me refiro a um crime evolutivo, a duas anomalias  biológicas.  
Primeira anomalia:  Como é que um adulto pode interessar-se sexualmente por uma criança?  
Segunda anomalia:  Como é possível  que uma criança já possa estar com o organismo apto para engendrar outra criança?
Isso é ridículo e nos compromete diante das outras espécies! Duvido que isso aconteça lá entre os macacos, os javalis e as hienas...

Que merda de espécie é essa? Em que momento de nossa trajetória  ocorreram esses absurdos evolutivos? Ou eles têm algum propósito ainda mais cretino e ainda mais cínico que ainda não percebemos?

A mendiga, que parecia estar muito perturbada com o assunto, e que estava visivelmente maníaca,  - que caminhava de um lado para outro arrumando e desarrumando os cabelos, não querendo saber de especulações filosóficas -, só insistia que o estuprador deveria ser fuzilado ou submetido àquilo que está proposto lá em Mateus 18, 5-7: "melhor seria que lhe pendurassem ao pescoço uma pesada pedra e que fosse precipitado nas profundezas do mar".
O Mendigo, também já quase fora de si, argumentou: colega, não me venha com esses impulsos criminais e idiotas! Lembre-se que até pouco tempo atrás o mundo não passava de um vasto território de dementes...  e que essa doença e essa perversão é crônica e vem de longe... E que esse mesmo livro que você está mencionando está repleto de barbaridades relacionadas aos instintos... A propósito,  sabia que até Maomé, casou com uma menina de nove anos?

segunda-feira, 17 de agosto de 2020

Esquerda e Direita: Apesar dos Paraísos Artificiais de cada bando divergirem, fumam o mesmo cachimbo...






 Enquanto os "virologistas" não conseguem cumprir com suas obrigações básicas e elementares (depois da pandemia a confiança depositada neles deverá ser revista...), incluí na minha Rotina do Cárcere, pelo menos uma hora/diária para assistir, via internet, programas, videos, entrevistas, sermões, delações, injurias, discussões, panegíricos, calunias, delírios e manifestações de fé, dos dois grupos que lutam entre si para lotear o país: a tal esquerda e a tal direita. Qual seria a intenção real dessa gente? Le Goff, se perguntado, possivelmente nos lembraria: "No final do século, XI ao inicio do século XIII, a concepção de pecado e de penitência muda profundamente, se espiritualiza, se interioriza. De agora em diante, a gravidade do pecado é medida pela intenção do pecador..."  
E se o curioso insistisse, é bem provável que ele complementasse sua fala com a tese de um outro sujeito do século XII: "as autoridades têm um nariz de cera, maleável ao gosto dos exegetas e dos utilizadores."

Impressionante! Vale a pena fazer esse exercício. 

A lógica, o discurso e o credo dos dois lados é literalmente o mesmo, só  mudando o perfil dos heróis e dos bandidos. Curiosamente, discursam e contam suas aventuras heróicas, suas últimas odisseias contra o Mal do mundo, orgulhosos e entusiasmados, com ares de sumos sacerdotes diante do altar do Estado, como se não tivesse havido ontem... E como se as ruínas não estivessem visíveis por todos os lados, envenenando e obstruindo os caminhos. Nas entrelinhas, um show de melancolia!

Uma novidade: Deixaram de lado (ou pelo menos minimizaram) aquele recurso linguistico estúpido de explicar problemas sociais usando o futebol como metáfora: "em time que está ganhando não se mexe"; etc, etc. Agora passaram a usar a metáfora religiosa, que é até mais ridícula: tudo virou luta do diabo contra deus; do bem contra o mal; da humildade contra a arrogância; do egoísmo contra o filantropismo; do amor à Natureza contra os incêndios da Natureza; da ajuda aos pobres contra o aniquilamento dos pobres; do paraíso verde/amarelo contra o paraíso vermelho; do socialismo contra o fascismo e etc.

Impressionante.  E se algum militante, por impertinência ou por despreparo  lhes interrompe o frenesi da palestra para uma pergunta fora do script, a resposta é sempre idêntica a que dariam seus opositores.  Os "socialistas" dão uma resposta que cheira a fascismo e os "fascistas" dão uma resposta que cheira a socialismo. Incrível! Difícil, quase impossível traçar a fronteira entre o tal socialismo e o tal fascismo! E, por mais escolados que sejam, não vão além das crendices do último século em nada, em absolutamente nada... Estão, de um lado e de outro, imobilizados numa choradeira sem fim e sem conseguirem funcionar dentro de um, digamos, razoamento adulto e laico, a altura destes dias de miséria e de caos. Pura fé! Puro sectarismo! Misticismo barato e politico. Por mais esforço que se faça para encontrar uma diferença (adulta) entre eles, se acaba sempre chegando à triste conclusão de André Glucksmann: Os ideólogos oficiais dos partidos de esquerda e de direita fumam o mesmo cachimbo, mesmo quando seus Paraísos Artificiais divergem.






domingo, 16 de agosto de 2020

Domingo: dia do Senhor! Dia da faxina...


"...Quem compreender o macaco, fará mais 

pela metafísica do que Locke"

Darwin

Se em cada grão de poeira estivesse albergado um vírus, não só minha casa, mas o prédio inteiro estaria condenado. Leio as orientações na parede: Pegue o rodo, pano vermelho pendurado atrás da porta, um tubo de detergente multi-uso, um chinelo anti-derrapante, esquecer essa montanha de livros, rezar um Pai Nosso, lembrar que tudo poderia ser muito pior, jogar fora o abacaxi que apodreceu, e mãos a obra...

Depois de meia hora, estava louco para desistir... isso é um inferno! Como é que as mulheres do mundo inteiro, em troca de um matrimônio meia-boca, se submeteram a isso durante séculos? Volto a pensar no salário de minha faxineira. Quando ela puder voltar, lhe farei uma surpresa: triplicarei o valor de sua diária.

Mas não é só isso: também lhe apresentarei a conta pelos copos quebrados. 

Encontrei cacos até em baixo da cama. E não eram copinhos comprados no 1,99. Não! Minha tataravó os trouxe, sabe-se lá de onde! Nem ela sabia direito de onde era... Em uns destes pedaços que recolhi por aí, ainda dava para ler: made in Tchecoslovaquia.

Mas na base de um outro, vi que foi fabricado em Murano. Sabem o que é isso? Coloco os cacos na cristaleira, em respeito à meus antepassados...

Descanso uns minutos e volto a ler as orientações na parede. Espargir aquele detergente que tem um bico de pato, nas paredes do vaso sanitário. Deixar agindo por uns dez minutos e esfregar muito bem, mas não usar a mesma esponja que usa para lavar a louça na pia.

No box, muita dedicação! Ali podem se armazenar fungos que, de um dia para outro, podem aniquilar o mundo. Quase como uma bomba atômica. Pense no Dr. Bactéria... Esfregar! Misturar tipos diferentes de detergentes! Cuidado para não aproximar muito o nariz dos detergentes, cuidado com as alergias e para não cair e quebrar a coluna ou deslocar a cervical. Cuidado com os cotovelos e com os joelhos. Reze outro Pai Nosso. Pense que tudo poderia ser muito pior. Se faltasse água, por exemplo. Lembre de Katamandú, onde pela manhã, as donas de casa jogavam o conteúdo dos penicos pelas janelas... Imagine amanhã, que é segunda, se você precisasse levantar às cinco da manhã para ir  "ganhar a vida!" Esfregue. Para diminuir o desconforto da coluna, fique de joelhos, mas sobre um pano dobrado. Essa posição te ajudará, inclusive, a ganhar o paraíso! Vai rezando... vai esfregando e rezando ou até mesmo blasfemando, é a mesma coisa, o efeito é o mesmo.

Uffa! Vou verificar novamente a lista. Agora passar álcool 70% sobre as mesas, sobre qualquer superfície. Se possível, até sobre a superfície da terra. E não beber desse álcool, espere até a hora de lavar a louça para então tomar um trago de Vermouth...

Caralho!

Um idiota do governo aparece na televisão falando sobre a importância de não ir além do Teto de Gastos.

Lembro das estradas de ferro. Quem irá construí-las?  Quando vi o governo contratando milhares de militares, pensei que, finalmente, iriam, a exemplo da Transsiberiana, dar início à Trasbrasiliana. Mas não. O que estão fazendo todos esses soldados nos corredores da burocracia? Quem conhece os labirintos do Estado, sabe que três (03) funcionários em cada Ministério (a moça do café, o moço das relações públicas e o do financeiro) são mais do que suficientes... dariam conta de tudo. 

Mas, e a ferrovia? Pergunto a meia dúzia de generais. E eles se desculpam dizendo que não há dinheiro. 

Como não? E a Casa da Moeda? Que se fabrique! Ou que se falsifique, dá no mesmo...

Dizem que não há dinheiro, mas no fundo é porque eles têm pânico, um pânico moralista, de serem vistos como inadimplentes... 

Pensam como nossos tataravós: Pobres e fodidos, mas não devendo nada para ninguém!  

Haverá pensamento mais reacionário, indigente, cristão e mais pobre do que este? Tudo bem, vamos seguir com nossas velhas e românticas carroças, mas como querer que alguém acredite num país do tamanho deste, que não tem ferrovias?

Ora! Que se fodam os credores! Melhor viver endividado num paraíso do que sem dívida nenhuma nos infernos...

Quando estou pensando em jogar-me no piso para descansar, eis que o porteiro me chama pelo interfone para dizer que o moço do mercado esta subindo com as compras. Caralho! Vou às recomendações na parede: não dirigir, em hipótese nenhuma, a palavra ao entregador e lavar tudo imediatamente, de preferência com Limpol: banana por banana; maracujá por maracujá, ovo por ovo; grão por grão no caso do grão-de-bico; a garrafa de vinho; as castanhas de caju...

Caralho!!! 

Os sinos de uma igreja vizinha badalam. Lembro que hoje é domingo. Dia do Senhor. E do descanso. O entregador bate à porta. Caralho...

Abro a porta para que ele amontoe as compras no piso. Ele olha espantado para as montanhas de livros espalhados até na cozinha. Pergunta: o que está lendo?

Pensei: será que esse merda, além de entregador, é também repórter? E lhe retruco com a mesma agressividade e com a mesma resposta que J. Prévert deu, certo dia, a alguém, mas sem tirar a máscara:

"Li As Bucólicas, As Provinciais, Os Miseráveis, Os iluminados, As Diabólicas, Os Desencantados, Os Desenraizados, Os Conquistadores, Os Indiferentes...

Ele fingiu entender tudo, arrastou seu carrinho barulhento para dentro do elevador e desapareceu.





sábado, 15 de agosto de 2020

Dulle Griet... Ou: Margarida a louca, de Bruegel...

Hoje, sábado, o mendigo K. apresentou-me sua nova mulher. Não apenas o seu tipo: um pano amarrado na cabeça, cheia de trapos e de bolsas, mas principalmente seu nome, Dulle, remetia quem a visse a um personagem famoso. Dulle? Repeti. Sim, como a Dulle Griet, ou Margarida a louca, de Bruegel.  - respondeu, cheio de orgulho.  Mas quando ela se afastou para ir em busca de um banheiro, ele me confidenciou: Bazzo, mais um Cavalo-de-Tróia na minha vida!
Caralho! Pensei. 
Voltei para casa e fui vasculhar a obra de Bruegel. Estava lá, no detalhe de uma obra de Bruegel (o velho), a tal Dulle Griet. Uma bruxa do folclore flamengo que Bruegel resgatou e incluiu em um de seus quadros. E dizem que essa bruxa (que até chegou a ser idealizada pelas gorduchinhas feministas de Montparnase) era conhecida por ter ido até os portões dos infernos para desafiar os demonios. 
Incrível, sua nova mulher era a cara dela, inclusive nos trapos que vestia, nas meias pretas que usava, no olhar de encrenqueira e no bastão que levava na mão direita, segundo ela, para proteger-se dos outros loucos e dos estupradores noturnos...



 

sexta-feira, 14 de agosto de 2020

Godot ou Cristo?

 Preocupado com minha visão niilista a respeito do cinema, meu correspondente na Irlanda, enviou-me um conselho: assista imediatamente o filme: ESPERANDO GODOT. (está disponível no Youtube)

Eu, que vivi minha adolescência tardia em Londrina, onde os teatros, apesar de sucateados, estavam sempre repetindo essa maravilha de Samuel Becket, e que em meu livro sobre os cemitérios de Paris (1992), dediquei uma das mais importantes páginas à tumba desse dramaturgo irlandês, não tive dúvidas: voltei a ver o filme. Uma maravilha! E, por incrível que pareça, parece até que o texto foi escrito para os dias de confinamento em que estamos. 

Duvido que você, homem, mulher, criança, ou outro bicho qualquer, não se identificará de cara com os 4 ou 5 personagens do filme.

E ele concluiu: Bazzo, há pelo menos dois mil anos, está  todo mundo, idiotamente, esperando por Godot, sem saber! 

Que, pelo menos, esperem sentados, ou deitados...!

E explodiu num desses KKKKKKKKK... do whatsapp.


quinta-feira, 13 de agosto de 2020

Os 50 tons de uma mentira...


 "I cretini sono una saggia istituzione della natura che permette agli stupidi di ritenersi intelligenti..."

Orson Welles

1:00 da madrugada. Acabo de assistir ao filme 50 tons de cinza, exibido por uma televisão. A fraude, que foi total, já começou no anuncio do filme, com a apresentadora prometendo que seria um show de sexualidade, de sensualismo, de erotismo e uma Odisseia de fornicação, etc.. Quase insinuando que seria recomendável levar um rolo de papel higiênico para o sofá. Tudo falso. Histericamente falso! Nada de erotismo! Se comparado aos filminhos pornográficos disponíveis a qualquer bobalhão, no Youtube,  - e que causam tanto fascínio às maiorias silenciosas -, parece até uma novela ingenua e carola. O que apareceu de mais excitante no filme, foi o fusca da menina e o momento em que se ouve as Bachianas brasileiras n. 5, de Villa Lobos. Um filme xarope, mais parecido com aqueles que se analisava lá nos anfiteatros e nas aulas de psicopatologia, isto é: a relação entre um aprendiz de psicopata e uma aprendiz de histérica. Com as referidas mães, neuróticas e perversas, na retaguarda. Tudo temperado com o fetiche da literatura, do dinheiro, da burocracia, dos truques do Marques de Sade e, o mais interessante: pela ausência total de gozo. O desejo de "ir para a Georgia" onde há umidade, foi considerado uma transgressão. Não há no filme, nenhum vestígio de ereção e nem de orgasmo. Os personagens só aparecem de bunda. Seria um espetáculo apenas para pederastas, dos dois gêneros? Só lambidas e gelo. E o gelo, estaria presente para lembrar a lógica da homeopatia? Curar o envenenamento usando o próprio veneno?  

Mas, é verdade, há, nessa baboseira toda, muitas tentativas de buscar aquele Sentimento Oceânico, Lembram? Resquício de uma época vitoriana, infanto-juvenil e religiosa. Despertar o tesão pela vertigem.  Lembram das lições de Sade, elaboradas durante sua permanência na prisão da Bastille? Ressuscitar o desejo e, por fim, o gozo, pelas acrobacias aéreas, pelo susto! E a maçã do Mac, sempre presente. Uma fraude! Um filme, digamos, útil para a clínica, para quem está se iniciando nas elucubrações da psychopathologie de K. Jaspers, mas completamente inócuo para turbinar qualquer tipo de transação libidinosa. Só tortura, transtorno mutuo de personalidade, algumas lambidas (poucas e incompletas), alguns eflúvios epidérmicos e doentios. Um filme para o populacho ignorante.  Ridículo! Impressionante!

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EM TEMPO: Mas não levem muito a sério esta minha impressão do filme, pois eu considero o cinema, em si, a maior de todas as fraudes, só perdendo para as fraudes religiosas... A Sétima arte? O Sétimo ardil?

quarta-feira, 12 de agosto de 2020

A viúva de Steve Jobs, os mares ensolarados da Croácia, a Penúltima Ceia e você...


François Mauriac 

Você que está esperando que a pandemia passe para ir à feira dos Importados comprar um Notebook retificado da Apple, e que está há uns 4 meses em casa, se empanturrando, entupindo e se anestesiando com tortellini, cenouras, brócolis, peito de frango, cervejinha vagabunda e vinhos argentinos de segunda, e se cagando de medo de que o vírus te pegue e te mande para um de nossos hospitais sucateados, você, sim, você mesmo, precisa dar uma olhada no estilo de vida e na maneira singela, Zen e delicada que a viúva do tal Steves Jobs, escolheu para fugir do tédio, das complicações sanitárias, das manifestações anti-racistas e funerárias dos EEUU.  (A propósito dos tortellini: existe aberração maior do que ter que comer 3 vezes por dia? É evidente que houve um erro no transcurso evolutivo ou que o criador da espécie estava bêbado durante sua façanha. Isto, sem falar que os nutricionistas estão induzindo os pobres velhos a comerem até 5 vezes ou mais, por jornada... Me digam: tem sentido uma idiotice dessas?)

Mas voltando à viúva do Jobs, segundo noticias de meu correspondente em Madagascar, a viram passeando, simpática e sorridente, pela Riviera Francesa em direção aos mares croatas, num iate milionário, conhecido por Vênus e feito sob medida pelo falecido e defunto Jobs. Um iate umas dez vezes o tamanho de nossas casas e que teria custado uns cem milhões de dólares.  E, segundo ele, vinte ou trinta fotógrafos, correm atrás dela, miseravelmente, no meio da fúria das ondas, com a ilusão de fotografá-la numa pose de sereia do mar e com uns pentelhozinhos oxigenados aparecendo um palmo (menos, meio palmo) abaixo do umbigo... Os jornais estão todos ansiosos para estampar na primeira capa essa musa do capitalismo porque  sabem o quanto as massas, o populacho, la muchedumbre, e as maiorias silenciosas, são apaixonadas pelos milionários...

E ele, fazia mais esta observação: Mas Bazzo, não pense que te digo tudo isto para ver tua inveja pipocar como uma crise de sarampo. Não. O faço apenas para que saibas que o Notebook da Apple que você pretende comprar ali na feira do Paraguai, quando o vírus o permitir, mesmo que seja um clandestino e retificado, possibilitará a ela e a seus marinheiros, lá nos paradisíacos e suaves balanços dos mares ensolarados da Croácia, pelo menos a compra de mais umas gotas de Domaine de la Romané, ou a rolha de uma Dom Perignom... Em síntese: que você, como um poço de compaixão, está colaborando com a felicidade dessa pobre viúva!  E, atenção: quando estiveres voltando da Feira do Paraguai com teu Note Book da Apple  apertado em baixo do braço e apressado para não ser assaltado, pense na frase do Mauriac:  "Que Deus tenha preferência pelos imbecis, é uma balela que os imbecis vem fazendo circular há uns dezenove séculos..."

O telefone ficou mudo por uns instantes, mas logo em seguida ouvi que ele dizia: Bazzo, cada vez estou mais convicto de que nossa miséria é infinita. Que vinte ou trinta famílias continuam em uma espécie de SANTA CEIA pelo planeta e que o resto, é o resto. Que ficamos ao redor da mesa e do festim como cães e mendigos, nos lambendo e nos contentando com as migalhas que caem. Me entende? E por falar em Santa Ceia, o que devem ter sentido e pensado os pescadores, os andarilhos, os paus-d'água, os fumadores de haxixe, os adivinhos, as cartomantes, os barqueiros, os tratadores de camelos, os pastores arameos, os exegetas de beira-de-rio, os loucos-varridos e a mendigada faminta e ignorante lá daqueles cafundós, da época de Jesus, ao saber daquele banquete? É provável que a luta de classes (apesar de Marx ter achado melhor calar a boca a respeito) tenha sido iniciada naquele dia. E a tal CEIA não foi a última! Continua a todo vapor! E com vinhos bem mais elaborados...

Por falar em CEIA, lembra do pintor italiano, Veronese (1578), que quase foi queimado pela inquisição por ter, na sua pintura da Última Ceia, incluído músicos, cachorros, bêbados e garrafões (barricas) de vinho?

Enfim, Madagascar, é uma maravilha! E a vida, Bazzo, é ou não é uma comédia?

terça-feira, 11 de agosto de 2020

O Mendigo K. e o sêmen como anti-depressivo...

"Mio generale, morte ai cretini."
"Caro amico, il suo programma è tropo ambizioso"
Charles De Gaulle

Nesta manhã de terça-feira, apesar da paranóia geral, com o vírus invadindo a república por todos os lados, arrisquei uma saída até a padaria da esquina. Uma padaria meia-boca, onde da porta de entrada já se sente o cheiro do bromato de potássio com o qual, padeiros analfabetos envenenam os pães. Uma padaria que, apesar de existir há uns cinco anos, parece ser ainda provisória e para onde acodem, principalmente pela manhã, hordas do lupemproletariado. 
Só a frequento pela proximidade com minha casa e por curiosidade antropológica. 
Lá pelas 9 da manhã, as mulheres que moram nos andares superiores, três ou quatro em cada cômodo de uns 28 metros quadrados, descem famintas para o café com leite num copo de vidro e para o pão com manteiga, aquela manteiga amarelada como graxa de locomotiva que os comerciantes compram em tonéis, mas que servem em potes como se fosse butter made in Germany. 
Ao chegar lá, deparei-me logo de cara com o Mendigo K. A merda de viver nessas cidades provincianas é que a cada passo que você dá encontra um conhecido; um parente; um inimigo; um credor; uma freira que quer converter-te; um policia; um mendigo; um burocrata; um exilado ou um poeta disfarçado; um sujeito qualquer que te deve cinco reais e que vem sem justificar e fazer um discurso interminável sobre a inflação e a falência econômica do mundo; uma malandrinha que você nunca viu na vida, mas que jura que já te conhece de algum lugar e etc,. 
Estava ocupando uma mesa externa, com uma mulher uns 20 anos mais jovem do que ele. Foi logo, meio servilmente, puxando uma cadeira para que eu me sentasse e apresentando-me a moça: Muito prazer..., Gisele! Gisele? (Pensei logo num dos primeiros livros que li na vida: Gisele, a espiã nua que abalou Paris.
Caralho, a vida é mesmo uma comédia!
Antes mesmo do garçom ter trazido meu café com leite e pão com butter alemã, disse que precisava contar-me uma descoberta científica vinda dos psicólogos evolucionários norte-americanos: o sêmen como anti-depressivo. Claro que para dizer sêmen, ele usou uma palavra mais comum entre o lupemproletariado.
Achei que estava querendo ironizar-me, mas fiquei ouvindo. A Gisele, com uma expressão típica do oficio e de quem fareja a distância uma nota de $100 no bolso dos otários, parecia reforçar cada uma de suas palavras. Recentes pesquisas - foi dizendo - demonstram que no sêmen humano há altas doses de elementos químicos, como o cortisol e a serotonina que, todo mundo sabe, funcionam como anti-depressivos. Como o canal vaginal (para dizer vagina, ele usou novamente uma expressão comum no mundo do lupemproletariado) é repleto de veias, vasos e paredes absorventes, o sêmen que é lançado ali é rapidamente absorvido, garantindo à mulher, a cada phoda, os efeitos de um anti-depressivo...
Eu que quase nunca levo a sério seus delírios, nem os dele e nem os de ninguém, principalmente num boteco, por incrível que pareça, entendi que havia alguma coisa de razoável e de possível naquela "descoberta". E ele, depois de fazer várias citações, de usar como  exemplos suas próprias relações, agregou - passando delicadamente a mão pelo rosto da suposta Gisele - não vês como ela e suas colegas estão sempre felizes e quase eufóricas?
Dirigi-me a ela com um olhar indagativo, e ela confirmou de imediato aquela teoria pra lá de revolucionária, que nem os KAMA SUTRA, Sade, Freud e Reich se atreveram a divulgar. 
E foi "confessando": doutor, se fico uma semana sem clientes, tudo bem, mas se fico quinze dias no seco, começo a sentir-me triste e deprimida. E não pense que é por causa do dinheiro ou por competição com minhas colegas, não. É como se me faltasse alguma coisa química, me entende? Um novo cliente.., e pronto! Eis-me feliz e quase maníaca, novamente... 
Portanto, é incorreta aquela ideia de que somos apenas como  robots/enfermeiras que retiramos sêmen de nossos clientes! É exatamente o contrário: nossos clientes é que são como robots/enfermeiros que vêm, de vez em quando, nos aplicar uma dose de anti-depressivos... e que ainda por cima, nos pagam para isso. O tal orgasmo que eles dizem sentir (que aliás, não temos a mínima ideia do que seja), é a gratificação com que o processo evolutivo lhes garante, para que voltem sempre e para que não se rebelem contra essa servidão voluntária... Se isso é uma sacanagem da natureza, - disse rindo e com uma expressão cheia de lasciva - não temos nada com isso! Observe, - falou com inflexão na voz- : observe que até as lésbicas sempre têm por perto um "amiguinho" para, de vez em quando, lhes dar uma turbinada... (escrevi turbinada, mas ela falou bombada!)
O Mendigo deu um soco na mesa e esbravejou: Teoria confirmada!
Tomei um gole de café e aproveitei para  pensar nas recentes noticias de que em alguma região da África, mulheres estariam sequestrando homens para roubar-lhes o sémen. E  também na culinária bíblica onde as mulheres quase obrigavam seus maridos a comer grão-de-bico diariamente...
Ele tomou a palavra em seguida para, cinicamente, fazer uma dedução cartesiana: Então, doutor, está aí a explicação para o nervosismo, a irritação permanente, a ansiedade e a depressão das donas de casa! Como não suportam mais nem olhar para seus maridos e ao mesmo tempo não se atrevem a arranjar um amante potente, ficam com carência desses dois produtos...
E, já que é assim, concluiu - voltando-se novamente para a Gisele - quem deveria pagar não é o CLIENTE, mas a PUTA. 
Explodiu numa gargalhada.
Senti que aquele papo me havia sido mais interessante do que meus vinte e tantos anos de universidades... Antes de retirar-me, pedi que me indicasse a bibliografia de onde havia retirado tais hipóteses ou tal teoria, mas ele, como a maioria dos intelectuais e dos professores, com seus resquícios paranóides, sentiu-se ameaçado, quis "proteger seu saber", desconversou, dissimulou e deu um jeito de esconder suas fontes...

segunda-feira, 10 de agosto de 2020

LIBANO: Ao invés do Temer, o Mendigo K...




"O leite de minhas cabras é veneno para os tolos e não quero que nenhuma delas seja culpada da morte de alguém, nem mesmo de um tolo..."
Mikhail Naimy, p. 13

Um sol amarelado e estupendo se espalha por sobre a cobertura dos prédios. Hoje é segunda-Feira! Mas as ruas estão vazias! Não se vê ninguém nas janelas ou nas varandas. Ninguém passeando com seus cachorros... Nenhuma velhinha falando sozinha enquanto umedece os vasos lá à sombra de uma ou outra árvore nativa do cerrado. Um ou outro casal desorientado, brigando e se agredindo como idiotas e por bagatelas... Os estacionamentos estão cheios (o teto dos carros empoeirados, os pneus murchos e o virabrequim enferrujado). Os burocratas, os aposentados e outros tipos (cada um em seu cárcere particular) aproveitam o confinamento para dormir. 
Mas, dormir? 
O dia inteiro? 
Será que esqueceram que um dia, com vírus ou sem vírus, se dormirá para sempre!? 
Sei, que não necessariamente estão deprimidos, mas não querer sair da cama, mesmo sem poder ir para a rua, com um sol amarelo desses, pode ser sim um sinal de que a serotonina e a testosterona estão em baixa. Penso na música Plegaria a un labrador, dos anos 70: (Victor Jarra) Levántate!
O Mendigo K apareceu solitário lá em baixo. Estava com um casacão de inverno que lhe foi presenteado, segundo ele, por uma beata da confraria Rosicrucianum, no princípio de  agosto. Estava com o LIVRO DE MIRDAD, nas mãos, e me lembrou: Bazzo, com a desgraça lá no Líbano, voltei a ler o Livro de Mirdad. Sabia que este livro é tão importante que até o  Rajnesh (o maior e mais fantástico charlatão de todos os tempos) declarava abertamente que gostaria de ter sido ele seu autor???... (Pensei: pronto! O confinamento e o isolamento, como era de se esperar, já o transformaram num pobre místico e num pobre esotérico!).
O mais surpreendente, foi ver que o livro estava escrito em árabe. Foi então que revelou-me, por alto, que seu avô era do mesmo país do autor do  livro: Mikhail Naimy.
Seguiu falando, com visível  pena, da tragédia acontecida no Líbano e, antes de seguir seu caminho fez este lamento: Pior ou tão grave quanto a explosão no porto, é saber que lá, como aqui, vinte ou trinta famílias devoram tudo o que lhes cai nas mãos! Que tudo está dominado! E que nossos países, com suas multidões silenciosas e dorminhocas, vão se torturando e debatendo por séculos, numa desgraça atrás da outra... E sempre, como se dizia na época de meu avô: prometendo aterrar o poço depois que a vaca já caiu nele... Pensei: ao invés de mandarem o Temer para lá, (na tal Missão Humanitária) deveriam mandar a Ele... (o Mendigo)



domingo, 9 de agosto de 2020

KANT, o Moisés alemão...


Neste domingo de inverno, daqui de trás  das cortinas de minha prisão voluntária, ouvi o Mendigo K, lá na parada de taxi, discutindo com sete ou oito outros mendigos, sobre Kant. Sobre o Imperativo Categórico de Kant!
Sabe o que é isto?
Me parecia inacreditável! 
Pensei, antes de tudo, que o chá de cidreira que estava tomando pudesse estar me causado algum tipo de alucinação, mas apurei os tímpanos, passei as mãos pelos olhos e confirmei que se tratava da mais pura realidade. 
Imperativo categórico de Kant!?
Me recordo de ter ouvido esse papo de apenas um ou dois professores em minhas incursões academicas, que não foram poucas, e nada mais.
Um mendigo do grupo, inquieto e agressivo, com os pés apoiados nas rodas de um taxi, não se conteve e resmungou: Imperativo Categórico de Kante? Que porra é essa?
Ninguém lhe deu importância e o Mendigo K continuou suas explicações, agora até com um ar sacerdotal. Dizia, numa linguagem que parecia ser de outro mundo: trata-se de uma série de regras morais, de maneiras educadas de agir para com os outros, nossos irmãos, e para conosco mesmo. Truques para que sejamos bonzinhos, pacientes, tolerantes e tolerados!  Protocolos, obrigações que envenenaram o mundo para sempre! Categorias de ameaças que imperam no mundo contra quem tente deixar-se levar pelos instintos. Quase como uma ética primitiva para subalternos; um TCC sobre a subserviência necessária para que o mundo superior nos deixe seguir existindo, satisfeitos com um ou outro cobertor no inverno e com um ou outro litro de leite, na primavera, e, para que assim, eles possam seguir cumprindo com o Imperativo Categórico deles por lá e nos cumprindo o nosso Imperativo Categórico por aqui! Sei lá, digamos que trata-se de um chamado para que cada um cumpra com os desígnios e propósitos de seu destino, de sua bondade inata! Me entendem?? 
Tanto a mendigada como os taxistas estavam visivelmente furiosos com aquele papo surrealista e sem sentido. O mesmo mendigo que estava com os pés apoiados nas rodas de um taxi, deu uma cusparada para o lado e vociferou: Em síntese, esse cara, esse tal de Kant, seria então mais ou menos como uma espécie de Moisés alemão!
Todos gargalharam sem saber exatamente a razão e o "seminário" foi encerrado.