sábado, 31 de outubro de 2020

Um livro estupendo! O livro que eu gostaria de ter escrito...


"O fato de que o corpo-a-corpo consigo próprio é a grande batalha cósmica... (página 56) 


"Depois de tempestades, epidemias, cólera, piratas, naufrágios, todo o som e a fúria da literatura, o "furor furor, contra a morte da Luz" de Dylan Thomas - Joseph Conrad está hoje enterrado em um tranquilo cemitério da gótica Canterbury, Kent, Sul da Inglaterra. Na lápide branca de forma irregular, uma inscrição: "Sono depois do Trabalho, Porto depois de Mares Tempestuosos, Tranquilidade depois da Guerra, Morte depois da Vida, muito nos agrada". (página 57)

sexta-feira, 30 de outubro de 2020

A máquina de lavar e a pílula contraceptiva...



"As mulheres de Balzac traem os maridos, mas morrem de amor, o que, de resto, as redime..."
(IN: Esplendores e misérias das cortesãs - Balzac)


 Tenho dedicado uma espécie de veneração à máquina de lavar. E enquanto os lençóis estão se movimentando lá dentro, naquela espuma psicodélica, com cheiro de jardins japoneses, costumo acender uma vela ao seu idealizador.

Fico impressionado como ela passa uma ou duas décadas ali, se tremendo toda, sugando e vomitando, sem reclamar. Nenhum defeito. Nenhum parafuso se solta. As hélices não se quebram... Impressionante! E fico imaginando o que as mulheres devem ter sentido quando  receberam esse pequeno monstro em casa e se viram livres do tanque e das esfregadeiras... Uma Brastemp! E  isto foi lá pelos anos 50. E nem imaginavam que 10 anos depois, a indústria lhes surpreenderia com outro presente e este, ainda bem mais transcendente: a  pílula contraceptiva. Ufa! Finalmente poderiam "cumprir com suas obrigações matrimonias" sem ter que correr para o banheiro se não quisessem ter que enfrentar outros nove meses de tortura e depois, o resto da vida. Ufa! Agora poderiam até ler a Dama das camélias... e trair!

A igreja esperneou, porque percebeu que a manada estaria sendo controlada e restringida, e que a partir de então até as mulheres poderiam fornicar sem, necessariamente, terem que "dar à luz" e trazer outro acólito, eleitor e escravo para o mundo... mas foi se acalmando. Um bobalhão chamado Odair José chegou até a cacarejar a "música": Pare de tomar a pílula...

Enfim, as mulheres, que tanto reclamam, em menos de duas décadas, se livraram de dois incômodos e de duas escravidões domésticas: uma na cama e outra na área de serviço...



 

quinta-feira, 29 de outubro de 2020

Enquanto isso...

Memento mori ou memento vivere?

No Rio de Janeiro, outro hospital em curto-circuito. As labaredas lambendo os cortiços ao redor e a cena dos pacientes sendo arrastados no meio daquela gritaria e daquela fumaceira toda para uma loja de pneus, com seus olhinhos de espanto e de adeus, mas também de fascínio, ficarão para sempre nos Anais do SUS e do hospício em que vivemos.
Aqui em Brasília, a cidade inteira continua queimando incenso ao artigo do general Rêgo Barros publicado no jornal local com um titulo quase esotérico: Memento mori que, segundo os coroinhas e professores de latim, quer dizer: Lembras-te que és mortal. Quase uma encíclica. Quem não lembrou do Eclesiastes? Quase o Intróito de uma missa. Duvido que os evangélicos tenham ficado indiferentes... Quem já desceu às catacumbas, em Paris, encontrou lá, logo na entrada, esta inscrição, também escatológica: Arrête: C'est ici l'empire de la mort!" 
O clima de juízo final que levita nas entrelinhas do texto me incomoda e em especial a palavra Rubicão, que a mim, lembra rabecão... Teria sido oportuno se seus assessores lhe tivessem sugerido: General, o texto está ótimo, mas, neste momento de desgraceira generalizada, por quê, ao invés de MEMENTO MORI, não optar por MEMENTO VIVERE? Por quê, ao invés de lembrar que vamos morrer, não lembrar que esta é nossa última cartada e que portanto, devemos viver intensamente?

 

terça-feira, 27 de outubro de 2020

Viagem ao fundo dos galinheiros, uma hermenêutica dos claustros..


 O moço que está editando meu livro: Viagem ao fundo dos galinheiros, uma hermenêutica dos claustros,  mandou-me uma mensagem, ontem de madrugada, dizendo que seu pai, um sujeito de uns 60 anos, que trabalha num Ministério, que está se preparando para a aposentadoria, e que já navegou pelo Rio Negro, teve acesso ao livro e ficou indignado e confuso com esta parte que está lá pela página 360, sobre aposentadoria e com outra, sobre uma viagem pelo rio Amazonas. As reproduzo abaixo, por puro deleite e por pura curiosidade.

1. Cinco ou seis aposentados se reúnem todas as manhãs numa espécie de parada de taxi para bater papo e jogar dominó ou damas. Um deles parece dono de um riso irrefreável. Já não têm paciência para aventurarem-se no xadrez. E ficam competindo miseravelmente entre eles: quem tem menos cabelos brancos, quem ainda consegue mijar com jatos mais fortes, quem está com as taxas de colesterol em dia. 

Se no passado competiam em termos de ereções, agora só querem demonstrar que uns estão menos próximos do cemitérios que os outros. A miséria da espécie é indescritível e a aposentadoria é um exílio! Um degredo!  

Ouvi um homem bem mais jovem que eles que lhes dizia até com certa agressividade: mesmo que dobrem teu soldo, aposentar-se é uma fria! Um arranjo maléfico!  Uma invenção e um truque descarado dos jovens para livrar-se dos velhos... Claro que a gerontocracia é uma infâmia, mas fazer o quê? A aposentadoria é vitória da inexperiência e da ignorância sobre a experiência e o saber! Os taxistas e os moradores que passavam por lá, uns até com menos de 50 anos e todos loucos para se aposentarem o olhavam com suspeita e como se fosse inimigo. E ele continuava, como se quisesse provoca-los: Que os sujeitos resistam e morram trabalhando! É ridículo exigir que o sujeito passe 35 ou 40 anos acorrentado numa escravidão qualquer e, de repente, quando o cara já está fodido, mandá-lo 'passear'. Vá para casa! Vá viajar! Descanse! Você já deu sua cota! Desfrute da vida! 

Desfrutar da vida, um caralho! 


É um horror deparar-se cotidianamente com um exército de velhotes troteando por aí com suas sacolas de remédios e o contracheque de aposentado, jogando damas com os taxistas ou enchendo o saco das balconistas dos mercados ou dos porteiros dos prédios. Os vejo aqui do alto e não escondem a marcha depressiva de quem esta sufocado pela solidão e pelo ócio e de quem não está indo para lugar nenhum. Fodidos e soterrados por um saber acumulado que agora os intoxica! Vão falando sozinhos, com os postes, com os cachorros e com os pedregulhos onde tropeçam. Com suas camisas brancas e mal passadas param diante dos prédios, colocam as duas mãos sobre os rins e com dificuldade olham longamente para o último andar como se tivessem visto lá no alto um disco voador ou uma aparição da virgem. Outros vão com seus passinhos curtos e perigosos até a lotérica da esquina pagar a conta da luz ou comprar um remédio para suas velhas que os olham temerosas das janelas. Aposentar-se um caralho! Não seja otário!  Obrigue o Estado a suportá-lo. E não adianta enganar-se e ir perfumada (o) e sorridente fazer bordados por aí com outras velhinhas ou com outros velhinhos gagás! Vender empadinhas nos semáforos, filiar-se a uma congregação de voluntários, ir lavar as cuecas dos padres e pentear os longos cabelos das freiras nos conventos, ir cuidar crianças dos outros quando não soubeste cuidar nem das tuas, ou sair por aí implorando outra maneira de penitenciar-se. Ridículo! Não! Não capitule!

Continue indo a teu trabalho, lá onde esta sepultada toda tua saúde, toda tua rebeldia e toda tua indignação... (mesmo que seja só para enxugar gelo) mesmo que seja só com uma perna, de muletas, de cadeira de rodas, em uma maca..., da maneira que for, mas permaneça lá em tua antiga e conhecida servidão, em tua mesa de trabalho, com tuas algemas lubrificadas, com as chaves de tuas gavetas, teus fetiches, tuas neuroses e tuas senhas nos bolsos do uniforme... E que os novos escravos tenham a paciência de suportar-te até o juízo final... Mesmo que seja só por um último e senil capricho, para não dizer: ato de vingança...


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2. Belém-Manaus, naquelas barcaças quase suicidas carregadas de bujões de gás, de sacos de sal, de pneus, de bicicletas, de sacos de castanhas, de gente adoentada e amontoada nos porões, de galos e de galinhas amarrados uns aos outros pelas patas, uns querendo cantar antes dos outros… Breves, Gurupá, Óbidos, Parintins, Itacoatiara... E em cada porto se vê um enxame de crianças remando em direção às balsas ou aos navios pedindo comida ou oferecendo porcarias mal feitas, artesanatos vagabundos com cheiro de fumaça e de miséria.  (...) Mas o espetáculo mais transcendente vinha com a noite. A banzeira e a solidão ribeirinha. Um ou outro incêndio na selva iluminava as margens e os barrancos mergulhados nas sombras. O fogo ainda haveria de destruir aquele Inferno Verde com seus tigres e suas jiboias! Os mosquitos da malária haveriam de perecer e as tribos fugir em disparada com suas porcarias e bagatelas nas costas… Aqui ou ali os dois olhos acesos de um tigre ou de um jacaré, e nos céus, os "astros distraídos!”. Foi na beirada de um desses rios (imaginários?) que Mario de Andrade fez nascer o seu Macunaíma. O herói sem nenhum valor. Um homem sem atributos, diria Musil. Uraricuera. Existe? Uma fogueira ao lado de um casebre. O canto amargurado e religioso de um índio ou de uma índia pedindo aos deuses uma cesta básica, um meio quilo de açúcar ou um barril de cachaça. Uma lata de leite em pó e até umas latas de sardinhas portuguesas. Mas sardinhas? Vivendo ao lado do maior rio do mundo! E os deuses ficam indiferentes, riem dessa merda toda, criada por eles por engano ou como vingança. Envergonham-se desse bando  ajoelhado, submisso, justificando a própria miséria. Querem mesmo é que eles se fodam! Que desocupem o território, que limpem e desintoxiquem de uma vez a terra. O barulho das hélices e do motor. A luz tênue de 40 watts no convés do barco. E outras luzes, também de 40 watts em movimento pelo rio. Vagalumes. Um exército de insetos voando em círculos ao redor da luz das barcaças, esses animaizinhos estúpidos que nascem e morrem no mesmo dia, para onde iriam?  (...) O barco dá uma guinada. Deve ter batido num tronco, numa árvore que a correnteza arrasta para o mar ou perdido algum parafuso. Tenho quase menos de 20 anos! Nos agarramos num amontoado de cordas. Se alguém cair para fora do barco será rapidamente devorado pela escuridão, por um cardume de peixes ainda nem catalogado e pelo próprio abismo que deve haver abaixo das águas. Quantas ossadas, não só de pessoas, mas de culturas, de fantasmas e até mesmo de estrelas… Uma noite o taifeiro do barco descobriu que um galo havia morrido. Quando o barco passou na desembocadura de um igarapé ouviu-se o grito de uma senhora curandeira vindo lá das margens e pedindo algum tipo de comida. Ele jogou o galo morto em sua direção. Os motores abafaram seus agradecimentos. Havia uma população desnorteada de netos e bisnetos de antigos garimpeiros e seringueiros por lá… gente enganada que se embrenhou na floresta nos tempos áureos da borracha (uma Malásia tropical).Viviam miseravelmente do látex. Do leite extraído dos seringais que seria transformado em pneus, em sapatos, em camisas de vênus… O látex acabou e eles foram morrendo abandonados pelo meio da selva. Quem sobrou fica às margens a espreita de um barco qualquer que lhes jogue um galo morto, nem que seja de peste... (...) A selva imensa! A escuridão, os besouros que se colam nos cabelos, as histórias que vai se ouvindo daqueles seres que nascem e morrem em suas palafitas certos e seguros de que a vida por aqui é apenas uma passagem, que ricos e pobres irão para um lugar mais digno. Pobres miseráveis! Eles não têm consciência que quando os missionários chegaram por aqui traziam apenas a bíblia e as batinas, enquanto que eles possuíam as redes de pescar e os segredos do imenso laboratório que é a selva. Mas que com o tempo, as coisas se inverteram e que agora, lhes resta apenas a bíblia. As redes de pescar e o imenso laboratório que é a selva, mais as minas e os animais estão agora patenteados em nome de missionários de outras tribos. E nós, que nem sequer sabemos ler? Agora que as ONGS nos trazem mensalmente papel higiênico, o que vamos fazer com a bíblia? Que negócio furado! Que Cavalo-de-Tróia! Que presente de grego! Teria sido tudo em nome de Deus? Mesmo que tivesse sido, seria uma canalhice divina! Mas agora é tarde! E por mencionar novamente a Bíblia, uma freira, transpirando milenarismo e regurgitando fé, que estava a caminho de Iquitos, no Peru, me recomendou ver Marcos 13:35,37 onde se pode ler: Portanto, vigiem, porque vocês não sabem quando o dono da casa voltará: se à tarde, à meia-noite, ao cantar do galo ou ao amanhecer.Se ele vier de repente, que não os encontre dormindo! Um livro repleto de chantagens e de ameaças. Catequizar! Lei divina. Lei da selva. (...) Havia um casal jovem de judeus numa das redes. Soube no outro dia que realizavam um estudo sobre botânica. Sobre as raízes, as folhas, os brotos, a seiva, as formigas que se alimentam só do néctar das plantas… De um tipo de aranha que quando nascem seus filhotinhos, se transforma numa espécie de gelatina para que eles a banqueteiem. A primeira ceia das pequenas aranhas é o corpo da mãe! Poético? Freudiano. Isso que é amor materno! O resto é demagogia de burguesas e queixumes infames. A alquimia da floresta. Dormem. Os ouço ressoar. Os mistérios no fundo da noite. As tribos, as serpentes ainda não catalogadas, as aranhas caranguejeiras, as Amazonas, as Flores do Mal, o canto melancólico das tribos traídas… E os diamantes enterrados nos húmus e na terra fértil e frágil! As minas! O subsolo! Os filões do metal maldito! O Pau Brasil! O látex da borracha… Um livro do Euclides da Cunha sobre este rio traidor e apátrida... A água que corre por debaixo das aldeias que se extinguem… O saber e a memória dos velhos pajés… A matéria prima para os medicamentos que nunca curaram e que nunca curarão coisa alguma… Curar-se? Curar-se de quê, hermana mia? A parte do Antigo Testamento que não foi escrita. 


sábado, 24 de outubro de 2020

As vacinas e a ciência. Essas desconhecidas...

"Tout ce qui est intéressant se passe dans l'ombre... On ne sait rien de la véritable histoire des hommes..."
Céline



Está quase comica a discussão metafísica sobre a vacina. Vacina que ainda não existe, mas que um belo dia, se ainda houver tempo, uma estagiária ou uma auxiliar de enfermagem qualquer acabará enfiando em nossos braços. Por enquanto, é como discutir a sexualidade das ninfas...

Será a da China? A de Oxford? A dos USA? A russa? A cubana?  E se aparecer alguma do Paraguai? Alguma outra que está sendo desenvolvida em segredo nos fundos de alguma rodoviária?

Se já está acontecendo toda essa encrenca sectária pela nacionalidade da futura vacina, imaginem - já que a neurose da fé é bem mais grave do que a neurose da Pátria -  como seria se a briga estivesse sendo por religiosidade. Pelo tipo de fé do fabricante... Foi baseada em que marco teórico? - Se perguntam os energúmenos - Elaborada com qual método? Qual é a religião do químico? do cientista? do sujeito que fragmenta o vírus? E nas paredes do laboratório, está pendurado um crucifixo? Uma estrela de David? Uma foice e um martelo? Um fuzil ou uma galinha preta? Já pensaram como seria se entre as candidatas, estivesse uma produzida pelo Estado Islâmico; outra pelo Vaticano; outra por Israel; outra pelas religiões africanas; outra pela OPUS DEI; uma pelos feiticeiros do Haiti; uma pelos discípulos de Lutero; uma pelos antigos militantes do OSHO e mais uma  pelos hindus?  Como seria a escolha? Na espada? Ou no dízimo?

Por sorte, até agora, as discussões estão apenas no campo binário, fictício e ridículo da ideologia política. Comunista? Ou Capitalista? Ora, deixe de ser idiota! Viva uns tempos em Nova Iorque, em Londres e uns tempos em Beijing... a merda política, mercantilista, policialesca e imperialista é a mesma! Frequente uma religião ou outra, o lero-lero e o engodo é idêntico!

 Vacina chinesa? Mas e se no meio do "imunizante" vier alguma coisa que nos fará comunistas? O preconceito com a China é antigo. A Gripe espanhola - por exemplo -, que não tinha nada a ver com a Espanha, era conhecida naquele país como Gripe Russa. Já, na Russia, como Gripe Siberiana, e na Sibéria, como gripe chinesa...

Vacina Inglesa? Mas e se com o tempo  ela nos transmutará em monarquistas?

Vacina Russa? Mas não poderia estar maculada pelas cinzas de  Stalin? Ou por um pentelho de Lênin? Não estaríamos inoculando em nossos corações o germe do ateísmo?

E a dos EEUU? Bem, aí é só pensar nas entrelinhas e na coreografia do debate entre o Trump e o Biden...

E se for a cubana? E se em cada um dos vacinados começar a surgir obsessivamente, uma entidade do além que os obrigue a endurecer-se, pero.., sin perder la ternura jamás?...

Enfim, essa odiosa pandemia nos está mostrando, entre outras barbaridades, as razões de nosso atraso e que se a espécie sobreviveu até aqui foi por pura vingança de algum demiurgo. E mais: que entre nós, apesar dos frequentes surtos de pós modernidade e de grandeza, ainda é difícil visualizar a fronteira entre ciência, astrologia e animismo. O que, convenhamos, é mais, bem mais, do que um singelo atestado de burrice...





 

quinta-feira, 22 de outubro de 2020

O Papa, os cartórios e os gays...


"Após celebrar missas em igrejas do Vaticano e pendurar as batinas, "milhares" de padres saem para curtir a noite gay de Roma".

Fredéric Martel

(IN: No armário do Vaticano)


Talvez não tenha sido apenas coincidência que o papa argentino tenha "autorizado" publicamente o casamento civil entre pessoas do mesmo sexo, (homens com homens, mulheres com mulheres), nestes dias de solidão pandêmica e em que ainda se está discutindo o caso do estupro coletivo ocorrido numa boate milanesa, no coração da República italiana... Por aqui, já ontem à noite, a cidade estava eufórica, os bares fervilhavam, os cartórios discutiam casamentos coletivos e os preços. Por pouco o Cristo Redentor, lá no Rio de Janeiro não amanheceu enrolado num arco-íris. Se o Crívela não fosse da outra confraria...

Enfim, todo mundo está feliz. O Papa argentino, escolado aqui nos trópicos e nos arredores de Buenos Aires, acostumado a ouvir Carlos Gardel, e a ler Manuel Puig (boquitas pintadas), sabe como amansar a turba... 

Os botecos fervilhavam... As mães, mais do que ninguém, estavam visivelmente realizadas, pois a partir de agora, finalmente, seus filhos e filhas até então condenados à marginalidade, aos michês clandestinos, aos guetos, à mancebia e à malignidade dos vizinhos, agora poderão, como elas, constituir legalmente uma família. A Sagrada Família! O  STF já havia autorizado, é verdade, mas o que é o STF sem o aval papal?

Champanhes, vinhos, cerveja, baseados...  Surgiu alguém exibindo uma edição francesa do livro do jornalista francês Fréderic Martel (No armário do vaticano), e até alguém exibindo o famoso jornal Chanacomchana, publicado em SP nos anos 80... O mundo é uma festa! Garçom!, me veja mais oito quibes recheados com catupiri, uma porção de coalhada e meia garrafa de cachaça...

Mas os membros mais escaldados da confraria, os mais tarimbados, com uma ficha corrida mais extensa, ainda estão com um pé atrás. Não esquecem que a Inquisição queimou aqui no Brasil e em outros países por onde se instalou, centenas e centenas de mulheres acusadas de homossexualismo e de transarem carnalmente com suas negras escravas...

 Desconfiam do Papa argentino, (com razão) como desconfiam dos vendedores de casacos de couro e dos dançadores de tango lá na Calle Florida... Suspeitam que pode ser uma nova estratégia para cataloga-los (como estão fazendo no Uruguai com os maconheiros e como fizeram com os hippies) para, no momento oportuno, enviá-los novamente para as fogueiras. Sabem que o diabo é capaz de citar as Escrituras quando lhe convém... e que o conflito da igreja com o corpo é secular, que está nos genes e que não se resolverá com uma simples bravata canônica...  Sabem que a igreja, para seguir existindo, precisa garantir a manutenção do casal e da Sagrada Família. Que ela seja oficializada entre homens e mulheres; entre mulheres e mulheres; entre homens e homens; homens e cabras; mulheres e pets, isto é secundário, não tem a menor importância.... O que importa é a manutenção do sonho da Grande Família Universal, de joelhos e de mãos dadas ao redor da mesa ou da cama... e quanto mais diversificada, melhor. São mais ou menos uns mil, os deuses dos terráqueos, não é verdade?, qual é o problema que as famílias também se diversifiquem um pouco? O que importa é que não desapareçam e que sigam pagando o dízimo, se torturando e se anulando mutuamente. Eis aí a fórmula perfeita para um Reino de masoquistas, de subalternos e de submissos...

E que ninguém se assuste se, a partir de agora, nas manifestações gays, começarem a surgir faixas reivindicando: Pontífice! Vigário de Cristo! Principe dos apóstolos! O casamento civil não nos basta! Queremos também o casamento religioso!

E se, uns meses depois, como os cartórios, as igrejas também começarem a organizar casamentos coletivos... Bah!

Povera gente!

 Que Karma de manada... que aprisco melancólico e que miséria...






 


quarta-feira, 21 de outubro de 2020

Elegia ao Bombril...






"Não é escutando detrás das portas que vamos ouvir 
alguém falando bem de nós", não é verdade? 

Depois desses 6 meses que parecem seis séculos, estou quase transformado numa Master dona de casa. Já sei a marca dos detergentes mais caros e menos nocivos; os que se usa para o piso, para as vidraças, para os banheiros, para a lâmina do liquidificador, para as colheres de bambu e para o fogão. No fogão, a propósito, descobri algo que nunca havia me dado conta: uma das "bocas", é maior e mais potente que as outras. Passei a usá-la com mais frequência, principalmente para acelerar a fervura da sopa de abóbora japonesa com gengibre. Por falar em japoneses, escutei, nesta manhã, - de um lixeiro, enquanto recolhia as porcarias ali nos conteiners -, que dizia para o outro este pensamento que, segundo ele, é popular  no Japão e que o ouviu lá num porto de hokkaido:  mais vale viajar cheio de esperanças do que chegar ao destino... (filosofia da miséria!)

Tenho, aqui em meu esconderijo e refugio doméstico, uma prateleira lotada de produtos químicos para a assepsia da casa. E basta ligar a TV para ver que outra centena deles esta sendo colocada no mercado diariamente. Um arsenal biológico quase tão mortífero como aquele que os gringos lançaram sobre as selvas vietnamitas... Chego até a ter pena das bactérias, dos fungos, dos filhinhos de aranhas e da procissão de formigas que costumam, de madrugada, vir, amorosamente, passear sobre meus mármores e roubar-me um grão de açúcar mascavo...  A limpeza! É necessário limpar... Deixar tudo impecável. Brilhando. Cheirando a ervas silvestres... O sabão foi mais importante para a humanidade do que todas as revoluções sociais e as teológicas... E nem precisa ter passado meio século estudando as angústias da espécie para saber que há, nessa obsessão, uma tentativa de limpar-se e de purificar-se a si mesmo. Tarefa, obviamente, impossível...

E no meio de todos esses tubos, latas, sacos, caixas, sprays e pastilhas de DETERGENTES tenho sempre dois pacotes de algo que deve ter sido fundamental para a passagem da espécie da caverna para os arranha-céus e do nomadismo para o sedentarismo: o BOMBRIL. Sim, parece evidente que sem ele o Iluminismo teria sido impossível...  E é a ele e às suas Mil e uma utilidades que quero fazer uma elegia. Sem ele, minhas leiteiras e frigideiras já estariam imprestáveis. Depois de esquecer uma panela no fogo com três ou quatro cenouras, se não fosse o Bombril...

E ele também serve para dar brilho às torneiras, às duas mil e setecentas e trinta e quatro peças do faqueiro, às dobradiças de uma tesoura e à lâmina de uma velha espada que herdei de um tataravô que jurava ter sido corsário...  Conheci até uma velha cigana que, depois de esvaziar os bolsos de algum otário, costumava dar brilho a seus dentes de ouro com essa esponja maravilhosa...

Enfim: Viva o Bombril!!! Essa invenção feita especialmente para as donas de casa mais fofoqueiras e mais exigentes...


 


terça-feira, 20 de outubro de 2020

O Mendigo K, o fantasma do estupro e Hermann Hesse...

“Résiste-moi, Jolie femme, boutonne bien ta robe! Enchante-moi, tourmente-moi – mais ne m’accorde pas tes faveurs..."
Citado por P. Watzlawick


Nesta terça-feira o Mendigo K apareceu com outra temática fervilhante da pós modernidade: O estupro. Cafajestice que, aliás, era praticamente oficializada por aqui nos séculos coloniais e no princípio da república. Nossas tataravós, bisavós e avós, as índias e as negras que o digam...  

Diz que com todas as discussões e maldições em curso, até a mendigada está paranóica com esse assunto e que só estão aceitando "comer" suas mulheres depois que elas assinam um documento dizendo que, gostam de sexo com homens, que por livre e espontânea vontade desejam ardentemente serem "possuídas" e que estão liberando, não só o corpo, mas também a alma para seus companheiros. 

Parece mentira, mas ele confirmou com veemência essa história quase cartorial e até filosofou: doutor, eu não sou um estrupador (ele, como 80% das pessoas têm dificuldade para falar estuprador), mas vou lhe dizer uma coisa: sem questionar as razões das mulheres, (lembrar que até os anos 1980, o artigo 219 de nosso Código Civil obrigava as mulheres solteiras a conservarem o hímem) essa neurose toda, essa história de trepar com procuração, será a morte da sexualidade, do ritual amoroso, do encanto da sedução e da brincadeira quase infantil que é a sexualidade. Ninguém, jamais, teria se atrevido a atravessar os mares, dar a volta ao mundo ou a escalar o Himalaia se não fosse movido pela fantasia e pelo desejo... E, veja que desgraça e que miséria: atualmente, até a mendigada, quando passa por uma mulher, ou quando uma mulher vai em seu barraco para flertar, exibir-se e queimar um baseado, já se reprimem, se enchem de medo e começam a fazer aquela reza tirada do poema de um tal Hermann Hesse, conhece? Como não respondi, ele a recitou, e num francês que diz ter aprendido no tempo em que ficou preso em Marselha: “Résiste-moi, Jolie femme, boutonne bien ta robe! Enchante-moi, tourmente-moi – mais ne m’accorde pas tes faveurs...

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Em tempo: Já havia atravessado a rua quando voltou para perguntar-me: Lembra da Maria Lenk, a primeira mulher sul americana a participar das Olimpíadas? Já, naquele tempo, foi excomungada pelo bispo de Amparo (SP) sob a alegação que dar aulas de natação não fazia parte da natureza feminina... Que tal?



domingo, 18 de outubro de 2020

O Mendigo K e os ciganos...


"Como queres ser aceito deitado, se aceitas a bofetada de pé?

(Alusão às relações tensas entre marido e mulher) 

ver: Pierre Derlon 

IN: Tradições ocultas dos ciganos

Neste segundo domingo de outubro todo mundo ainda está esperando pelas chuvas que há uns vinte dias o Instituto de Metereologia (ou seria de astrologia?) está anunciando. Já por duas vezes chegaram a lançar um alerta à população para a possibilidade de vendavais, redemoinhos, raios, chuva de pedras, quase como aquela dos tempos de Noé.

As velhinhas correram lacrar as janelas, encostaram a geladeira nas portas, puxaram as cortinas, acenderam velas, tomaram 8 gotas de rivotril e esperaram. Até agora, nada. As folhas de uma trepadeira que cultivo aqui no trigésimo quarto andar, estão imóveis. Nenhum milímetro fora do lugar e me olham com ironia quando vou oferecer-lhes um ou dois copos de água...

O Mendigo K apareceu lá no mesmo boteco de sempre. Estava acompanhado por um colega de profissão, levava um livro de Pierre Derlon e falava num tom acima do normal como aquelas pessoas que já estão ficando surdas.

Nos tempos em que vivi em Paris - dizia -, todos os anos, no mês de maio, ia a pé e descalço, em peregrinação, da Praça da República até Chartres, até Saintes Maries-de-la Mer, a Meca dos ciganos... Já ouviu falar? Íamos até lá, até a Catedral de Chartres, para beijar nossa Santa: Sara. Sara a egípcia. Sara a Kali. Sara a Negra, cuja imagem está na cripta daquela catedral...

Ao perceber um sinal de ironia no colega, abriu o livro e leu: "a oração é uma coisa por vezes necessária, reconforta os homens fracos..."

E prosseguiu:

A padroeira dos nômades, em comparação com as outras santas só  existe naquela igreja, em nenhuma outra do mundo.

Mentiras! resmungou inquieto o outro mendigo.

Ao que ele abriu novamente o livro e leu: "Muitas vezes a mentira  protege o segredo. Nunca se leva a sério o homem que mente. E aí está sua força..."

Um dos momentos mais tensos foi quando ele passou a relatar o costume, em algumas tribos ciganas, de uma mulher mais velha,  enrolando um pano nos dedos, deflorar uma jovem e, em seguida, examinar e interpretar as manchas que ficavam nesse pano, mais ou menos como alguns psicólogos fazem ainda hoje com o Teste de Rorschach...

Como acontece com frequência nos botecos daqui, uma pomba pousou sobre a mesa ao lado, onde alguém havia deixado uns pedaços de pão. Ele a olhou com o certo desprezo e aproveitou para dizer: "Veja aí, a pomba para os católicos é o emblema do Espírito Santo e da Paz, mas para os ciganos ela é a imagem do crime, do sangue e da loucura. Entre os pássaros, ela é o mais violento e o mais cruel, mesmo tendo o bico mais frágil de todos os outros...

Tentou seguir falando do mesmo tema, mas o outro levantou-se bruscamente e desapareceu...


sábado, 17 de outubro de 2020

Diálogo imaginário com um jogador de futebol acusado de estupro...



 P. E então, comeu ou não comeu?

R. Essa aí não! Mas costumo comer uma a cada partida, Às vezes até uma antes e uma depois. Mas sempre na moral, por livre e espontânea vontade minha e delas...

P. Já estuprou alguém?

R. Nunca! Jamais! Não seria covarde para tanto...

P. Mas então, por que a denuncia que há contra você?

R. Não sei. Tenho pouca escolaridade. Como todos os meus colegas e até os treinadores, sei jogar mas sou analfabeto. Nunca li nada, nem mesmo o Pica Pau Amarelo do Monteiro Lobato. A indústria do futebol, de uma ponta a outra, é uma Ilíada de ignorantes. O material para gerar músculos é retirado do cérebro. Me entende?

P. Tudo bem, mas por que te acusam de estupro.

R. Ora! Dinheiro. Transtorno de personalidade. Mau caráter.

P. Já estuprou alguém. 

R. Já disse que não! Nunca. Jamais faria isso, e não por moralismo, mas por ética. Apesar de várias vezes, ter sido desafiado para tal... Sou analfabeto e rico, mas não sou burro... Entretanto, pelo conceito atual sobre estupro, todas as relações amorosas e felizes que tivemos no passado, poderiam ser consideradas como tal. Basta uma denúncia... Depois que fiquei rico, milionário, duas questões passaram a fazer-me muito mal: o dinheiro e a sexualidade. Diariamente sou assediado por gerentes de bancos e por mulheres, sem falar daqueles homens que la na Grécia antiga eram chamados de pederastas, mas que atualmente são conhecidos por bichas-velhas... Tenho dificuldade em lidar com esses dois assuntos. Por um lado, preciso investir meu dinheiro e zelar para que não me roubem, por outro, o futebol produz muita testosterona e meu desejo sexual fica alto. Adoro ver as mulheres gritando o meu nome nos estádios e querendo saber o hotel onde estou hospedado... Mas, sempre fui muito pobre! Como poderia ter aprendido a lidar com sexo e com dinheiro?

Além disso, tem muitas mães que mandam suas filhas virem me seduzir:

- Vai lá sua boba! Só não deixe seu pai saber. Vai lá e deixe ele enfiar aquele negócio em você. É rápido. Diga que o ama e ele gozará rápido. Três minutos. Induza-o a morder tuas costas e a deixar restos de sêmem (na linguagem deles é porra) sobre tua roupa. O resto, deixe comigo. Esses idiotas têm milhões de euros, dólares, libras, apartamentos, fazendas, barras de ouro... São treinados, adestrados, alimentados, comprados e vendidos como animais... dois ou três milhões não lhes farão falta alguma...

Tive até uma que me contava que quando voltava para casa sua mãe queria saber em detalhes como havia sido a relação. Como foi minha filha? Deu certo? Foi bom? Conseguiu as provas? E ela respondia: Bom sempre é, né mãe, mas a gente não diz para não pensarem que a gente é puta!

E as provas? Ah, esqueci das provas, mamãe...

Ah, você é burra mesmo! Desse jeito acabará num puteiro ou casada com um proletário de merda e cheia de filhos...



sexta-feira, 16 de outubro de 2020

As misérias do processo Penal... e os Condenados da Terra...


"Se siete compassionevoli con i crudeli terminerete essendo crudeli con i compassionevoli"
Talmud




 Desde que tomei conhecimento do processo que lá  nos EEUU condenou Sacco e Vanzetti à morte (anos 20), passei a ter preconceito com juízes, e minhas poucas experiências com o judiciário foram sempre abomináveis.

Mesmo assim, por pura curiosidade, assisti às sessões  de ontem no STF onde se discutiu a confusão causada com a soltura de um preso, ao qual se atribui o tráfico de toneladas de cocaína para a Europa. Aliás, por que os europeus estariam cheirando tanto?

Não posso negar: tenho uma dificuldade imensa para ouvir o blábláblá desses senhores. Aquele discurso rococó que mistura latim com tupiniquim e aquela capacidade de decorar parágrafos da Constituição e do Código Penal que faz qualquer um lembrar de seus melancólicos anos do ginásio, me parece abominável. Sem falar daquelas capas de frades e aquela performance de professores que criam um abismo entre eles e os condenados. Entre a Suprema Corte e o Supremo Cárcere... Entre o tribalismo disfarçado e o escancarado. Entre a moral e o crime. Entre o castigador e o castigado.

Enquanto eles citavam capítulos, parágrafos únicos, itens metafísicos, liminares, e falavam dos condenados como "pacientes", eu pensava nos Condenados da Terra, (Franz Fanon); numa frase que está lá no Talmud: se você é complacente com os lobos você acaba sendo desonesto com as ovelhas... e nos gritos dos anarquistas lá no Canadá: Abaixo todas as prisões!

E os juízes se alfinetavam entre si, cada um, mais delicado do que o outro, querendo demonstrar que  era a voz de um oráculo e que dispunha de uma "hermenêutica" mais adequada do que o confrade. Hermenêutica? A arte de interpretar. Por falar nisso, enquanto os ouvia, ia  tendo mais certeza ainda de que a própria linguagem é um transtorno. A anedota da Torre de Babel já pretendeu nos dar uma pista...

E, curiosamente, além de identificarem o julgado como "paciente", também usam outras expressões da clinica, como autofagia, teratologia. Sem falar da teologia embutida em cada um dos tais Artigos e dos tais Parágrafos únicos... Memória dos processos da inquisição. O preso como um judeu novo ou como um herege. A  Corte Suprema! A Penitenciária, como lugar de pagar penitência, livrar-se do "pecado venial"; de buscar a conversão, a redenção e a salvação. Tudo em nome da urbanidade e da sociedade celeste, do paraíso perdido... e da presunção (de inocência, para uns e de culpa, para outros) Inocentes? Culpados? Pura moral de catacumbas... 

Prisão preventiva! Tivemos uma presidente da republica que especulou sobre a possibilidade de aprisionar o vento. Os  magistrados pretendem aprisionar o mal. A parte de si mesmos visível e manifesta nos condenados, numa tentativa de não serem descobertos. Duas ficções.

Medidas cautelares. Garantias fundamentais. Frases em latim e até uma ou outra em alemão. Ou seria javanês? E nada sobre o Código Penal dos Astecas... Somos europeizados! Temos ainda os libretos de Savonarola sob nossos travesseiros. Temos nostalgia pelo chicote dos invasores. Ainda trabalhamos para eles, para construir o mundo ideal DELES. Peleguismo! E as penitenciárias lotadas... Mas tudo foi decidido nos colegiados. O colegiado é tudo, é até mais do que a voz do povo, é a voz de deus. Aliás, o Deus dos juízes é o mesmo Deus dos condenados. Paradoxos! Suspensão de liminar. Vossa excelência está pisoteando um colega! Data venia! Somos irmãos. Nossas famílias festejam juntas o dia de Cosme e Damião. Data venia...

Alguém diz amorosamente que o outro é como o algodão entre cristais. Nem os amantes de Lucrécia Borgia chegaram a tanto. Só a fraternidade nos une. A mesma fraternidade que une os 700 mil presos, 200 mil sem condenação. 200 mil sem condenação! E que esperam por Godot... Apodrecerão lá. Duvido que algum dos presos possa ter praticado um crime maior do que este... E a sociedade, cheia de moral de crendices e de honra, não parou de tomar sorvete e nem de ir comungar-se aos domingos, por isso. Observem: a prisão é um sintoma místico, como o claustro das freiras e dos fanáticos. O resultado de uma crença  primitiva em Pasárgada e numa vida após a morte. Nenhuma espécie se atreveria a enfiar alguém em uma prisão se tivesse consciência de que este tempo é o único tempo. Que não há outro tempo. Que é aqui e agora, ou nunca mais! Data venia! Autofagia! Encarcerai-vos e comei-vos uns aos outros!

Suspensão de liminar. Regimento interno da Procuradoria da República. As últimas encíclicas enfiadas nos artigos da Constituição. Habeas corpus: uma expressão de crematório! Penso nas fogueiras ao lado do Ganges... 

Decisão extravagante... Venia, muitíssimas venias... Atenção com os espíritos do mal!, ouviram de suas patroas antes de saírem de casa. Se lhes damos um único fio de cabelo, logo querem levar-nos a cabeça inteira... E temos que garantir a credibilidade do populacho no Supremo. A propósito, onde estaria neste momento o chefão da cocaína? A tv exibiu sua filha. Uma mulher linda que logo logo estará apresentando a meteorologia de algum jornal... E a Europa, os milionários da Champs Élisee, como estão se virando sem o pó? Pelo menos não seremos mais rotulados de ser uma colônia que só exporta  travestis, soja e carne de porco.  Data venia...

Os ministros vão discutindo, emparedando uma frase com outra, uma vírgula com uma exclamação enquanto ajeitam as batinas que insistem em cair-lhes pelos ombros... Enquanto os ouço vou relendo   o libreto de Carnelutti: As Misérias do Processo Penal, que não é grande coisa, mas que vale pelo título. Sinto a falta de meu cachorro. Se estivesse aqui trocaríamos afetos e opiniões sempre lúcidas e humanas, demasiadamente humanas.



quarta-feira, 14 de outubro de 2020

520 ANOS DE SURREALISMO... No Rio de Janeiro estão vendendo vacinas (COVID) falsas... e em Alagoas, retiram titulo de honoris causa, do Lula... (E as arquibancadas do circo estão sempre lotadas...)






 

Alfred Nobel... E suas possíveis intenções secretas ao inventar a dinamite...



"Quase todo mundo" se lembra da professorinha, sessenta anos atrás, com sotaque de imigrante, falando de Getulio Vargas, do Sputnik 1, de Santo Antonio e de Alfred Nobel em suas prédicas. Não é verdade?

Algumas, dependendo do dia, até se emocionavam ao falar do PRÊMIO NOBEL e ao relatar que, de fabricante de explosivos, de dinamite e de armas, aquele sujeito havia se tornado um homem quase santo, muito rico, e que, antes de morrer, destinou sua imensa fortuna àqueles que continuassem, pelos séculos a fora, queimando incenso em sua memória. E quando ouvirem qualquer tipo de explosão, mesmo que seja de um bujão de gás, lembrai-vos de mim!

Crianças.., ignorantes... e em pleno processo de adestramento, ficávamos boquiabertos com as palavras da "tia" e achando que a vida iria ser uma maravilha...

O culto a Nobel e às suas Coroas Suecas! Tudo bem. É a vaidade, essa doença infantil que não acaba nem mesmo depois do ato final. Mas o que deve ter pensado esse inesquecível defunto, na semana passada, ao ver que parte de sua fortuna, (o tal prémio Nobel de economia) será dada a dois senhores pela humanitária bravata de apresentar ao mundo uma nova TEORIA dos leilões?

Leilões? Caralho! Quem é que não tem asco por leilões? Sejam eles dos pentelhos de Ava Gardner; da última caixa de charutos de Freud; dos Manuscritos de Sade; de carros confiscados de traficantes ou das obras de Picasso?

E quê benefícios essa nova TEORIA SOBRE OS LEILÕES poderão trazer para a humanidade? Principalmente agora?, para uma humanidade que está há sete oito meses se debatendo entre hospitais, estatísticas fajutas e cemitérios, em guerra com um vírus e atirando para todos os lados, sem ter conseguido sequer  produzir algum novo tipo de 'aspirina' ou de 'elixir paregórico' para interromper sua marcha?

E o NOBEL de literatura, à poetisa americana?

Sinceramente, não consigo ver nenhum nexo entre aquele fabricante de explosivos (quase o precursor do terrorismo do século XIX) e a beatice dessa poetisa! 

E o que esse milionário defunto pensaria do Nobel da Paz, que este ano foi concedido à  FAO, àquela organização fundada em 1945 com a finalidade de saciar a fome e consolar os pobres e os fodidos do planeta?, quando, todo mundo vê, que a miséria e a fome, de lá para cá, só vêm aumentando?

O Mendigo K, depois de comentar esses igNOBEIS assuntos e dar uma longa gargalhada, me perguntou: Bazzo, será que o velho Nobel, já naqueles tempos, secretamente, não cultivava algumas "segundas intenções" com seus inventos?...


 


segunda-feira, 12 de outubro de 2020

A ilusão de um Estado ser laico...

 Depois dos programas de televisão de ontem à noite, praticamente três horas só de misticismo, metafísica, mistérios, milagres, fé, devoção, promessas, masoquismo, show de obscurantismo, pedagogia do absurdo e etc, também na cidade de Guadalupe, no México, nas paredes de um estacionamento, apareceu a imagem de la Virgen de la Anunciación.  Acreditem. E os mexicanos,  - diz meu correspondente - de todas as etnias e classes sociais, estão alucinados e acodem para o local em prantos e loucos para saber notícias do paraíso e se a santa teria chegado de carro?... Inacreditável! 

Onde acabaremos desse jeito e com essa loucura? 

E o estado laico? É isso que nos espera depois da pandemia?

E esse desvario serve para ilustrar que é ridículo e ingenuo seguir lutando por um Estado e por uma educação laica, se os meios de comunicação, - as verdadeiras escolas na América Latina e nos continentes subdesenvolvidos - continuarem livres para domesticar e catequizar suas plateias.

Duvido que mesmo as divindades tenham algum dia imaginado que as coisas chegariam a tanto...  E claro, devem estar apavoradas com toda essa bovinização...

Enfim: leio aqui em meus alfarrábios: "a gente pode se insurgir contra as injustiças, mas não contra a fadiga e a usura do mundo..."


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 Um de meus correspondentes me lembra deste pensamento de Milorad Pavitch::

 "Só se pode ser um grande cientista ou um grande violinista quando se é apoiado por uma das grandes internacionais do nosso mundo: Internacional judaica, Islâmica ou Católica. Eu, como não pertenço a nenhuma, não estou em lugar nenhum. Entre meus dedos, todos os peixes escorregaram há muito tempo"




Enquanto isso... Light in Babylon...

Observação: 
Se você está precisando aumentar seus níveis de serotonina e de testosterona, ouça esta música três vezes por dia...