Yo te comprendo desde mi desesperación
y te curo desde mi Esperanza.
(Alfredo Moffatt)
Nesta quarta-feira ensolarada, na padaria da esquina, o mendigo K e mais cinco colegas comentavam o fechamento do hospício Nise da Silveira, no Rio de Janeiro. Os 6 vestiam camisetas com uma frase em espanhol atribuída a Alfredo Moffat: Yo te comprendo desde mi desesperación y te curo desde mi Esperanza.
Segundo eles, que conheciam muito bem a "fábrica de loucura" que são os manicômios e que no meio da discussão consultavam o livro Psicoterapia do oprimido, Moffat é quase santificado e idolatrado nas comunidades de mendigos, loucos, fodidos e de marginalizados de todo o país. Uma espécie de mendigo bem sucedido...
Um deles, esquelético, e trêmulo, quando percebeu meu interesse, abriu o livro desse psicoterapeuta argentino e leu:
"Para o problema da loucura temos uma proposta clara: a redistribuição das ansiedades irracionais, uma elaboração dos conteúdos terroríficos, depressivos, fantásticos, de nossa gente, e que cada um de nós assuma seus temores e fantasmas sem depositá-los em bodes expiatórios, fabricando com isso "profissionais da loucura', para em seguida segregá-los, internando-os em manicômios..."
(...) Uma psicoterapia descolonizada que elabore seus modelos teóricos na resolução da problemática real e concreta do país e não importe com respeito submisso os modelos de pensamento criados para a solução de longínquos problemas sociais europeus... (...) Esse povo precisa de uma sociologia, uma psiquiatria, uma psicologia, uma história, uma antropologia que o ajude a enfrentar o sistema ideológico dos opressores. E esse mesmo povo nos está indagando, do fundo das favelas, das fábricas, das fazendas, dos cárceres e dos manicômios: De que lado estão vocês... A quem servem?... Aos exploradores ou a nós?... Por isso é que dizemos: à merda com tantas palavras elegantes e castradas! À merda com essa ciência super-abstrata que não nos permite compreender e instrumentar a realidade em que estamos metidos... Em nossos hospícios as condições de degradação são tantas que se pode falar de loucura, mas não do paciente e sim da instituição...(...) Naturalmente, nem todo internado em hospício é um criador de mundos possíveis; há também muitos que, frente à grande angústia da existência humana, frente ao enorme paredão da morte onde tudo se estilhaça, até os últimos e mais íntimos pedacinhos do Eu, optam pelo mecanismo de defesa mais cômodo e seguro que é o estereótipo, o ficar preso a quatro ou cinco regras e resistir a qualquer mudança. Ou seja, há também delírios 'normais', 'sensatos', 'estúpidos' que castram toda criação e é assim que, para evitar a angústia da morte, alguns pacientes declaram-se mortos desde logo, bloqueando a vida e a imaginação. São os 'loucos aborrecidos' do hospício..."
Concluiu a leitura e ficou em silêncio, dando espaço para a fala de um colega que, com um cobertor sobre os ombros, foi falando:
"E o principal local do interno, é sua cama. Esta é a única porção de espaço reconhecida como sua. O espaço interior da cama, debaixo das cobertas, é o lugar onde ele encontra uma forma de privacidade. Às vezes, para poder sentir-se só, o paciente cobre-se totalmente, inclusive a cabeça. Ficar na cama durante o dia, quando isso é permitido, assemelha-se a ir-se do manicômio, por algumas horas. Em resumo, o leito é como uma companheira, uma amiga no manicômio, ou melhor, uma espécie de mãe, sempre cúmplice e solícita e que está sempre no mesmo lugar..."
Recomendo psiquiatria e antipsiquiatria...David Cooper. Na verdade nao recomendo nada! Sugiro que você aí pare de ser ignorante e vá ler esse livro e todos os mais que puder. Pirada mesmo é essa sociedade...
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