"Vendo as estátuas eqüestres de certos heróis de nossa América, me pergunto: quê se quis imortalizar ali, o herói ou o cavalo? Qual dos dois vale mais? Talvez a besta foi menos funesta a seus semelhantes. Mentalmente falando, onde acaba o homem e onde começa o bruto nestes monumentos? De tão semelhantes que estes dois gêmeos foram em suas entranhas, nem mesmo a selva que os pariu, saberia responder..."
Vargas Vila
(IN: De los viñedos de la eternidad, vol. 25, pp. 190,191)
Quem é de minha geração e ainda está por aí escandalizado com os desvarios do mundo, deve lembrar-se que nos anos 70, pelas estradas tortuosas da América Latina - apesar das ditaduras idiotas que floresciam por todo o Continente - era comum deparar-se com jovens andarilhos de todo o mundo, ricos, classe média, pobres, fodidos e cheios de ilusões que, decepcionados com suas famílias alopradas e com uma sociedade cretina, iam, na maior alienação e sem rumo na direção dos Andes, Puno, Machu-pichu; La puerta Del sol de Tiahuanaco; Lago de Titicaca; Ruínas de Tikal; Tierra Del Fuego; la Patagonia rebelde...... Já haviam dado voltas pelo Tibet e dormido aos pés do Himalaia... Uns (daquele tipo de gente que você não ousa marcar um encontro sem um revólver no bolso) voltaram de lá tão delicados e místicos que acreditavam que comer os excrementos do Grande Lama do Tibet, em pó, ou mesmo cheirá-los, como se fosse rapé, era uma forma de veneração...
Mesmo na alienação e no nomadismo pueril daqueles tempos, o que mais nos chamava atenção (depois do voo do condor) eram os monumentos erguidos nas praças das cidades, cidades que eram - e que ainda são - verdadeiros simulacros miseráveis dos vilarejos do Vale de Katmandu). Em todas as praças ou em frente a pequenos prédios públicos havia monumentos homenageando supostos heróis, sempre sobre cavalos. Um pobre e acabado hippie alemão, que havia lido Vargas Vila, gostava de ironizar: afinal de contas, estão homenageando o cavaleiro ou o cavalo? Por todos os lados havia gente sorridente, fingindo felicidade e vestígios, muitos vestígios, da fusão entre a selvageria religiosa Inca e o fanatismo, a tristeza e a ganância da alma espanhola... Nas paredes de uma escola prestes a ruir, este pensamento de Vargas Vila, rabiscado numa língua ancestral. Seria em Quechua?:
"A história não registra o nome de nenhum povo que não tenha merecido a canga que levou..."
Pelo ontem e pela situação atual da América Latina, parece que os homenageados, realmente eram sempre os cavalos...
Vai um rapé aí?
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