A prisão, o inferno e os eletrodomésticos!

Não estou muito seguro, mas acredito que devemos estar no trigésimo dia de confinamento. O pior de tudo, acredite (você que esta solto), nem é a prisão, mas ter que ouvir o ruído dos eletrodomésticos, os da própria cela e os das celas anexas... 

A máquina de lavar roupas, ligada o dia inteiro, é o maior dos horrores. Quando esta centrifugando então, é quase insuportável. O aspirador é um departamento especial do inferno. O liquidificador tira o fôlego de qualquer um. O batedor de ovos tira qualquer um do sério! E o rádio, mesmo com um designer pós-moderno, sempre com um chiado incurável e reprisando as musicas metafísicas e movidas a cannabis dos anos 60, é o fim da picada. A televisão (essa escolinha de idiotas para idiotas) é de causar ansia de vômito. A chaleira italiana que apita quando a agua ferve lembra de imediato a sirene das penitenciárias (ou das escolas). E a panela de pressão que parece uma turbina/caldeira de maria-fumaça e que ameaça lançar o grão-de-bico no teto se você não correr para tirá-la do fogo? E o interfone, com alguém sempre chamando para dar noticias suburbanas da morte? E nas varandas da frente, as mulheres, (adolescentes, balzaquianas ou da terceira idade), com suas vassouras, seus panos na cabeça e seus transtornos obsessivos compulsivos que lembram as bruxas e as bobagens infantilóides do Harry Potter? E isto, sem falar dos cachorros latindo por uns buracos das janelas e da choradeira de crianças mimadas e desesperadas que se misturam a todas as outras sonoridades. Que loucura! E como é que a OMS, a psicologia, a psiquiatria, a neurologia, o anarquismo e até mesmo o marxismo nunca se preocuparam com o dia-a-dia e com o porvir dessas mulheres? Dessas mães,  filhas,  amantes,  proletárias,? Que negligência imperdoável para com essas penitentes! Quê Karma fdp! Quê crimes as mulheres teriam cometido em outras existências?  

Por isso, é fundamental fazer apologia e dar vivas à vida tranquila, silenciosa e serena dos quartos de hotéis e dos

 apart-hotéis, onde não há nada, além de uma tostadeira, uma mini geladeira e uma TV que quase nunca funciona. E onde, quando se ouve algum ruído vindo dos quartos vizinhos, é de alguém trepando. E onde a camareira só aparece duas vezes por semana, às vezes, depois de tomar uns bons tragos e só por uns quinze minutos!