No interior de uma destas entre-quadras, um cão cinza e gigante se joga contra o gradeado da cerca a cada pessoa que vê atravessando o jardim ou os quintais vizinhos. Rosna, mostra os dentes, resmunga, ameaça e só se acalma quando o passeante já desapareceu nos confins do quarteirão. Observei uma velhinha, seca, magra, com um lenço de seda italiana amarrado na cabeça e com um guarda-chuva amarelo que, ao ser ameaçada por ele, levou um susto para, em seguida, estacionar e olhando-o quase carinhosamente, recitar-lhe um texto do livro de Heitor Humberto de Andrade, contido no livro: O CÃO SELVAGEM.
"Antes temia o tédio / a solidão, a pobreza, o desamor / Agora tenho o tédio, a solidão, a pobreza, o desamor / como insumos da minha fábrica de ideias e sentimentos..."
O sol dominical e morno de inverno descia indiferente sobre o canil.
O Cão ouviu em silêncio, se acomodou sobre as patas traseiras, foi se acalmando e se deixando tomar por uma espécie de hipoglicemia metafísica...
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