terça-feira, 15 de fevereiro de 2022

Uma curiosidade sobre a SEMANA DA ARTE de 1922/ Ou: A arte de excluir aqueles que não se tolera.../ Ou: A origem animal de Deus...

"A sensação de religião é gerada na sensação de fome. A satisfação religiosa é a satisfação da fome. Adorar deuses, animais e vegetais era um problema de alimentação do homem primitivo. É pela fome que o homem entra em contato com o mundo animal e vegetal que ele devora e o ato de devorar é a primeira religião do homem..."

Flavio de Carvalho

(IN: A origem animal de Deus)

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Por mais distraído que o sujeito seja, deve ter percebido que nesta última semana a mídia, em geral, dedicou um grande espaço para falar do Centenário da Semana da Arte Moderna (1922)

Convocaram especialistas, professores, entendidos, colecionadores, mercadores, místicos, netos e bisnetos daquela turma que engendrou a famosa semana e até listaram os nomes mais proeminentes. Este fez isto! Aquele fez aquilo! Este era genial! Aquele, apesar de ser um papagaio burguês, transbordava sapiência! Faziam longas viagens para se reunirem nos cafés de Montmartre! Este tinha um pai bilionário! Aquele havia herdado tudo de seu avô. Todos falavam o idioma de Voltaire e uns até arriscavam cacarejar alguns dos versos de Goethe. 

E os próprios entrevistadores suspiram ao ouvir as lendas e as histórias de amor e de desafeto, advindos daqueles inesquecíveis avatares nacionais! Ah, a arte! Ah, o Macunaíma! Ah! o FAROL da Anitta Malfatti! A arte como um Sacramento! Como um subproduto do tédio burguês! Quase como a Cruzada das crianças, de Marcel Schwob, na tentativa de resgatar o  Santo sepulcro. Lembram? Os Santos dos Últimos dias! O que teria sido desta pátria e de nossos canibais se não fossem aquelas genialidades antropofágicas?

Entretanto, há uma curiosidade:

Até agora, (... a não ser que estejam deixando para uma 'surpresa'  final), omitiram o nome de um sujeito que até mesmo para o pavão Osvald de Andrade, era uma das maiores forças do movimento. Me refiro a FLAVIO DE CARVALHO. Arquiteto, escultor, cenógrafo e escritor. Por quê o teriam silenciado?

São dele os livros A ORIGEM ANIMAL DE DEUS, e O BAILADO DO DEUS MORTO.

 Teriam esquecido seu nome? esquecido de mencioná-lo? Ou o teriam excluído por problemas 'de pauta' e de moralidade?

Não acredito! Seria muita miséria, não é verdade?

Pisoteado quando vivo! Renegado um século depois! Bobagens! 

Seu livro O bailado do Deus morto refere-se à experiência feita por ele, durante uma procissão de Corpus Christi, e foi o livro que motivou, na época, o escândalo e o fechamento do Teatro da Experiência (1933) localizado na rua Pedro Lessa, n. 2.

Enfim, já que estão espargindo água benta e queimando incenso para aquela trupe, é importante repetir que FLAVIO DE CARVALHO (o não mencionado) foi um dos principais pilares daquela Semana. E que é quase brochante ver que um século depois, esse tipo de 'amnésia' ou de 'distração' ainda continuem se repetindo...


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https://www.encontro2020.rj.anpuh.org/resources/anais/18/anpuh-rj-erh2020/1600190832_ARQUIVO_019c9e06ba688a9ad333a0ec3338e15c.pdf







Um comentário:

  1. Peça completa "O bailado do deus morto"
    https://www.youtube.com/watch?v=9U34Faz4kcY

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