E começam a "vazar" os conteúdos do vídeo da famosa reunião presidencial. Lembram? Dizem que nele, o ministro da educação, o sr. Weintraub, desce o pau na cidade de Brasília. Teria dito que isto aqui é "uma porcaria" e "um cancro", que tem que acabar.
Muita gente chauvinista e enraizada por aqui, já está apreensiva, esperando a confirmação ou não dessa ignomínia, para lançar seus mísseis sobre ele. Já, os canalhas ilustrados lembram que lá pelos anos 60, quando a Simone de Beauvoir esteve por aqui, olhando para a poeira, para a "peonzada" e para a "solidão do planalto", vaticinou:
Muita gente chauvinista e enraizada por aqui, já está apreensiva, esperando a confirmação ou não dessa ignomínia, para lançar seus mísseis sobre ele. Já, os canalhas ilustrados lembram que lá pelos anos 60, quando a Simone de Beauvoir esteve por aqui, olhando para a poeira, para a "peonzada" e para a "solidão do planalto", vaticinou:
esta cidade jamais terá alma, coração, carne ou sangue. E seu amante, estrabico, e o Jorge Amado, que a acompanhavam, ficaram em silêncio, cada um mergulhado em seus próprios onanismos literários.
Um pouco mais tarde, veio a Clarisse Linspector que, desde a lucidez de sua depressão, decretou: "Nunca vi nada igual no mundo, uma prisão ao ar livre. Aqui é um lugar onde os meus crimes não seriam de amor". E no mesmo artigo, publicado no extinto Jornal do Brasil, ela prossegue: "A alma aqui não faz sombra (...) o acaso aqui é abrupto (...) Paisagem da insônia (...) Brasília é assexuada (...) A erosão vai desnudar Brasília até o osso (...) Há alguma coisa aqui que me assusta (...) A beleza de Brasília são suas estátuas invisíveis.
Depois veio um outro Ministro que a chamou de "Autódromo Stalinista!"
Portanto, qual é o problema que o sr. Ministro queira se confundir com essa trupe parnasiana, já que estamos há mais de quinhentos anos só fazendo literatura e poesia...
Um pouco mais tarde, veio a Clarisse Linspector que, desde a lucidez de sua depressão, decretou: "Nunca vi nada igual no mundo, uma prisão ao ar livre. Aqui é um lugar onde os meus crimes não seriam de amor". E no mesmo artigo, publicado no extinto Jornal do Brasil, ela prossegue: "A alma aqui não faz sombra (...) o acaso aqui é abrupto (...) Paisagem da insônia (...) Brasília é assexuada (...) A erosão vai desnudar Brasília até o osso (...) Há alguma coisa aqui que me assusta (...) A beleza de Brasília são suas estátuas invisíveis.
Depois veio um outro Ministro que a chamou de "Autódromo Stalinista!"
Portanto, qual é o problema que o sr. Ministro queira se confundir com essa trupe parnasiana, já que estamos há mais de quinhentos anos só fazendo literatura e poesia...
A nós, que há muito tempo abdicamos de toda e qualquer pátria, o que nos importa é apenas saber desde quê ótica, de que ângulo ou de quê janela esse senhor a está olhando?
Quais são suas referencias de urbes?
O que lhe teria acontecido por aqui?
Apesar de saber que esse tipo de conceito sobre Brasília, com mais ou menos ênfase, é unanimidade nacional, quem vive aqui não consegue admitir que um ministro forasteiro e de plantão se atreva a querer pisoteá-la. E depois, há diferenças visíveis entre suas declarações e as da Linspector. Por exemplo: ele diz: "é um cancro que tem que acabar". Linspector, a ucraniana, arremata: "Foi descoberta por um bando de foragidos que em nenhum outro lugar seriam recebidos... Mas, a beleza de Brasília são suas estátuas invisíveis!"
Os aqui enraizados estremecem quando descobrem essas análises sórdidas e escatológicas sobre sua cidadela e sobre si mesmos... E com razão! É sua cidade! Quase a Cidade do Sol, de Campanella... Aqui estão todas suas aventuras, por mais transgressoras e hebefrênicas que sejam. Viver aqui é quase como viver num deserto. Apesar de ninguém ter-se alertado para isto, o brasiliense é, no fundo, um beduíno. Pela tarde o sol fervilha nas calçadas e de madrugada despencam pedaços de gelo do orbe por sobre a frágil arquitetura dos palácios e também dos cortiços. E cada Super-Quadra tem seus botecos, seus alcoólatras, seus mendigos, seus andarilhos grã-finos, seus poetas, suas casas de chá, seus michês camuflados, suas Messalinas, seus sebos, seus oratórios e, claro, seus pequenos ladrões e seus bandidos. Sim, como qualquer outra, mas o que a diferencia é o bioma e a lua que aqui, quando não aparece como uma baixela de cobre se apresenta como uma foice de prata, a dos Sem Terra. E depois da meia noite há vendedores de livros sobre as mesas encharcadas de cerveja vagabunda. Um ou outro homeless que revira as lixeiras, não em busca de restos de almôndegas, mas de algum papelote lambuzado de cocaína ou de alguma bituca de maconha. Vendedores de cigarro e de pó (de gengibre!). Uma mulher que se veste como uma princesa dos Balcãs, passa de mesa em mesa vendendo seus torrones espanhóis; os músicos e os anarquistas chegam com seus instrumentos nos estojos e passam a noite falando de Paganini, de Bakunin, de Led Zepelin. São como os pescadores, os fotógrafos, os dramaturgos e como os jornalistas, para quem o assunto: "sigilo da fonte" é interminável e para quem a escravidão é voluntária e full time. Alguém recita Cora Coralina, até que outra senhorita, de uma mesa ao lado, as pernas enfiadas entra as de uma matrona estrangeira e bem mais velha, faz uma réplica com uma ode de Florbela Espanca. A lua lança mais luz do que o normal sobre os loucos que perderam o bonde da história. Da história? Mas alguém lembra que não há mais história. A idéia foi de Hegel ou de Fukuyama? A periferia fervilha de baladas, de tiros e de pandemia. A policia desce a rua com seus cassetetes e cachorros em busca de alguém que não está usando máscaras ou de dois ou três tijolos de cannabis. Sabe que o mês de maio é o dia da colheita da erva lá por Juan Caballero. Por eles, e pela cannabis, decretariam outra guerra contra o Paraguay! Mas é inútil! A fumaceira vai ziguezagueando até as janelas do SR. Ministro e ele, com aquele nome estranho e já com as malas prontas, resmunga: Porcaria! Cancro! Tem que acabar...
Os aqui enraizados estremecem quando descobrem essas análises sórdidas e escatológicas sobre sua cidadela e sobre si mesmos... E com razão! É sua cidade! Quase a Cidade do Sol, de Campanella... Aqui estão todas suas aventuras, por mais transgressoras e hebefrênicas que sejam. Viver aqui é quase como viver num deserto. Apesar de ninguém ter-se alertado para isto, o brasiliense é, no fundo, um beduíno. Pela tarde o sol fervilha nas calçadas e de madrugada despencam pedaços de gelo do orbe por sobre a frágil arquitetura dos palácios e também dos cortiços. E cada Super-Quadra tem seus botecos, seus alcoólatras, seus mendigos, seus andarilhos grã-finos, seus poetas, suas casas de chá, seus michês camuflados, suas Messalinas, seus sebos, seus oratórios e, claro, seus pequenos ladrões e seus bandidos. Sim, como qualquer outra, mas o que a diferencia é o bioma e a lua que aqui, quando não aparece como uma baixela de cobre se apresenta como uma foice de prata, a dos Sem Terra. E depois da meia noite há vendedores de livros sobre as mesas encharcadas de cerveja vagabunda. Um ou outro homeless que revira as lixeiras, não em busca de restos de almôndegas, mas de algum papelote lambuzado de cocaína ou de alguma bituca de maconha. Vendedores de cigarro e de pó (de gengibre!). Uma mulher que se veste como uma princesa dos Balcãs, passa de mesa em mesa vendendo seus torrones espanhóis; os músicos e os anarquistas chegam com seus instrumentos nos estojos e passam a noite falando de Paganini, de Bakunin, de Led Zepelin. São como os pescadores, os fotógrafos, os dramaturgos e como os jornalistas, para quem o assunto: "sigilo da fonte" é interminável e para quem a escravidão é voluntária e full time. Alguém recita Cora Coralina, até que outra senhorita, de uma mesa ao lado, as pernas enfiadas entra as de uma matrona estrangeira e bem mais velha, faz uma réplica com uma ode de Florbela Espanca. A lua lança mais luz do que o normal sobre os loucos que perderam o bonde da história. Da história? Mas alguém lembra que não há mais história. A idéia foi de Hegel ou de Fukuyama? A periferia fervilha de baladas, de tiros e de pandemia. A policia desce a rua com seus cassetetes e cachorros em busca de alguém que não está usando máscaras ou de dois ou três tijolos de cannabis. Sabe que o mês de maio é o dia da colheita da erva lá por Juan Caballero. Por eles, e pela cannabis, decretariam outra guerra contra o Paraguay! Mas é inútil! A fumaceira vai ziguezagueando até as janelas do SR. Ministro e ele, com aquele nome estranho e já com as malas prontas, resmunga: Porcaria! Cancro! Tem que acabar...
Ver Brasília por seus olhos é mergulhar numa boa página de literatura!
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