"Este é o destino lógico para a pessoa totalmente desamparada; quanto mais temor sente pela morte e mais vazio sente em seu interior, mais enche seu mundo com figuras de pais onipotentes e de ajudantes mágicos... (Ernest Becker, in: El eclipse de la muerte, p. 222)
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Ninguém em sã consciência poderia negar as façanhas do Pelé, e não apenas nos palcos infanto-juvenis e nas piruetas mambembes dos estadios, mas na vida real. Sua capacidade emocional para sair do Nada e ir soberbamente até o Tudo, foi admirável. E digo isso não pensando só em sua efêmera intimidade com aquele pedaço redondo de couro; com grandes políticos, com grandes milionários e grandes estafadores ao redor do mundo, mas por ter tido até a Xuxa nos braços... Mas o cognome e o título de rei, isso me incomoda. Parece um resquício patético de vira-latas e uma nostalgia da plebe pelos trapaceiros monarquistas, elogio que o coloca virtualmente ao lado de tantos outros sujeitos coroados e abomináveis que, na história, só fizeram fundar seitas, roubar e cuspir sobre o rebanho... (portanto, sempre que ouvir alguém se referir ao Pelé como rei, saiba que estás diante de um palhaço e de um bobalhão...)
Homenageá-lo, tudo bem. Mas, convenhamos: a mídia já está enchendo o saco com esse assunto, aproveitando sua morte, o alvoroço e a comoção da periferia para (além de tentar apaziguar uma angústia pessoal diante do destino miserável da espécie), cumprir pautas necrológicas e moralistas do jornal, exibir seus arquivos, manipular a turma e captar anunciantes. Sim, é compreensível. A morte é, realmente um horror, o único problema antropológico sério. E não importa quantos gols o sujeito tenha feito. Se chutava com os dois pés ou só com o direito... Se havia nascido num palácio ou numa mansarda. Se era estrábico, branco, amarelo, preto ou albino... Se usava a camisa 10 ou Zero. Isso tudo são ficções e bobagens de gente limítrofe, para tentar driblar o tédio do dia-a-dia e a angústia da traição inexorável de morrer. Qual o sentido, afinal, de toda essa merda? E quando é que os mortos ilustres, enrolados em bandeiras ou em sudários, no meio de toda a pantomima, poderão levantar-se do caixão e dar uma banana, não apenas a essa cambada sedentária de oportunistas, mas mesmo para quem ainda terá que permanecer por aqui, protegido por paletós e por óculos escuros, com o destino inexoravelmente marcado e com a boca cheia de dentes, esperando seu dia chegar?
Para garantir a dignidade e a tragédia do morto, tanto de gente sem atributos, como de homens ilustres, como ele, o dia do Juízo Final de cada um deveria acontecer sempre em segredo e em sigilo. E que o rebanho só fosse tomar conhecimento dele, no Censo Demográfico dos anos seguintes... Aqui entre nós: quem é que neste aprisco de 8 bilhões, realmente, faz alguma falta?
Volto à leitura de Ernest Becker: "Necessitamos un objeto concreto para nuestro control, y lo obtenemos como podemos. A falta de personas para tener un diálogo de dominio, podemos usar aun nuestro cuerpo como objeto de transferencia, como lo mostró Szasz. Los dolores que sentimos, las enfermedades reales o imaginarias nos ofrecen algo para relacionarnos, y nos impiden huir de este mundo, hundirnos en la desesperación de la soledad y el vacío totales..."(p.217)
Pelé ?
ResponderExcluirPele de porco ?!
A filha não reconhecida dele que o diga
https://revistaforum.com.br/esporte/2022/12/30/sonho-de-sandra-filha-rejeitada-pelo-rei-do-futebol-realizado-por-pele-um-dia-antes-de-morrer-129476.html