"...Não, não há fortaleza inexpugnável,
se pode entrar nela um burro ou uma vaca carregados de ouro..."
(Alexandre Magno)
O dia amanheceu extremamente silencioso. Há uma certa plenitude na matilha que passa lá em baixo, conduzida por um velhinho aposentado... Das Arniqueiras e dos Ipês exala um aroma quase esotérico... É dia 25. Parece que até os carcarás estão piando diferente! O que teria sentido o homenageado? E quando é que ele e Godot, chegarão, afinal? Sim, a festa e a Santa Ceia foram ontem à noite, mas muita gente já está na fila dos mercados para trocar um salame com data vencida, uma garrafa de cachaça com pêlos de ratos ou mesmo para comprar um Sal de frutas ENO... Segundo a velhinha armênia, com seu lenço italiano amarelo enrolado no pescoço, foi tudo magico & lindo! Veio gente até de outros países... Ah, a famíglia reunida!... Haverá algo mais humano do que a famíglia reunida, com os joelhos se tocando sutilmente sob a mesa e ao redor do mesmo menu de cem anos? No meio da mesa sempre o peru, naquela posição pornográfica do Kama Sutra. E quando chegava o leitão assado, era impossível não lembrar do Mito del niño asado, sobre o qual, os psicanalistas argentinos não se cansavam de cacarejar...
A farofa; as frutas e, claro, as imaculadas rabanadas! Aquelas fatias de pão passadas em ovos, manteiga e açúcar... Ah! e a sagrada maionese, que nossas avós juravam que muitos dos que estão nos cemitérios foram vítimas dela... e com todos os membros atuando a mesma pantomima, com os ressentimentos sufocados para não correr o risco de repetir o fiasco que ocorreu lá, entre os ribeirinhos, no Horto das Oliveiras... De todos os prédios vizinhos o lero lero do Jingle bell... jingle Bell (mas, curiosamente, não se ouvia sino nenhum...)
Um horror! Sem falar do Panetone Bauducco e das estatuetas do Papai Noel (feitas de chocolate vagabundo e em série, para intoxicar a plebe)... Ou daqueles superfaturados (também feitos com chocolate vagabundo) mas envoltos em um papel especial, para turbinar o festim da ex-plebe, das castas superiores e das máfias estabelecidas...
E calma... calma que daqui a uma semana, tem mais...
O Mendigo K estava introspectivo, na padaria, fingindo ler o livro: Confesiones del estafador Felix Krull, do Thomas Mann.
Quando me viu, colocou-se de pé e resmungou: Bazzo, Feliz Natal e um Próspero Ano Novo! Repetiu: UM PRÓSPERO ANO NOVO! E gargalhou...
Havia um comentário, antes deste, que desapareceu. Dizia que o sujeito que foi preso, por instalar uma bomba aqui na cidade, justificou-se à polícia dizendo que sua intenção era dar início ao Caos. Fato que nos leva a pensar que o cara deve ter pretensões filosóficas. Mas é provável que a policia ou a imprensa tenha ouvido mal. Que ao invés de "dar início", deve ter dito: "dar continuidade ao CAOS". E sempre que se fala em terrorismo é bom lembrar daquele pensador romeno que decretava: "o verdadeiro terrorista é aquele que detona uma bomba em sua própria alma..."
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