segunda-feira, 2 de novembro de 2020

De 007 ao Papagaio da Ana Maria Braga...

"Devia ser humilde, e foi humilde até à anulação. Devia ser justo, e foi justo até ao desespero. E nessa sucessão de devia, tornou-se plasma informe nas mãos do mestre.  E sobrava-lhe ainda a lição do orgulho, quando descobriu o charlatanismo da humildade..."
Samuel Rawet
(IN: Ahasverus)

Como se não tivesse bastado o espetáculo de horror assistido nos cemitérios nos últimos meses, a mídia ontem, passou o dia inteiro tratando da morte do 007 e do papagaio da Ana Maria Braga. O fato de, por trás do 007 existir um sujeito e por trás do papagaio também, não parece  ter muita importância para os cinéfilos e nem para o populacho em geral. Velhos, velhas e crianças parecem só lamentar a perda dos atores. Como vamos viver sem o 007? Como vamos viver sem o Papagaio? Um, que turbinava nossas madrugadas... o outro, que tornava felizes nossas manhãs... Eles, que nos excitavam e que nos alegravam tanto! Curiosamente, - segundo os necrológios - ambos morreram dormindo! Atenção... prestem atenção: quando alguém lhe diz boa noite!, pode ser apenas um detalhe da cerimonia de adeus!... 

E, nesta manhã nublada de 02 de novembro, os vivos lotam os cemitérios. Cada um chega com seus amontoados de flores, velas, bilhetinhos, secretas mandingas pessoais para, de uma maneira ou outra, acertar contas com o parente que se foi. Data venia, mas duvido que gostariam que o morto voltasse e duvido, mais ainda, que o morto se dispusesse a voltar... 

O Mendigo K que ganhava uns trocados lá no umbral de entrada vendendo flores vermelhas de hibisco, me olhou de soslaio e resmungou esta frase que diz ter lido lá no diário do pescador palestino, Lucas: Deixe que os mortos enterrem os seus mortos!

Curiosamente, Samuel Rawet, que antes de ser removido para o cemitério judaico do Rio de Janeiro, já esteve enterrado aqui, escreveu um livro com esse título: Que os mortos enterrem os seus mortos.

 Dei uma caminhada lá por entre as covas enquanto ia pensando no meu futuro e na inscrição que vi na lápide de algum cemitério do mundo: "desculpem o pó!"


 

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