quinta-feira, 23 de janeiro de 2020

Vargas Lhosa; Livros e privadas...



"O objeto que melhor representa 
a civilização não é o livro, o telefone, 
a internet ou a 
bomba atômica: é a privada".
Vargas Lhosa


Nesta quinta-feira quase chuvosa encontrei o mendigo K. ali nas margens do lago Paranoá. Sem dizer uma palavra apontou para uma boca-de-lobo através da qual chegavam às águas quase azuis, borbulhões e torrentes de esgotos vindos de diversas regiões da cidade. 
Que tal? Indagou-me.
 E isto, esta aí, desde os tempos do Juscelino Kubitschek e do Jânio Quadros. Sobreviveu às décadas da ditadura, ao Tancredo, ao Sarney, ao Collor, ao Itamar, ao Fernando Henrique, ao Lula, à Dilma e agora ao Bolsonaro. Qual é, afinal, o problema dessa gente com relação aos dejetos? Aos esgotos? E à merda? Tudo bem, sabemos que como escreveu Milan Kundera "a merda é um problema teológico mais penoso que o mal. Que Deus dá liberdade ao homem e que podemos até admitir que ele não seja responsável pelos crimes da humanidade, mas uma coisa é certa: a responsabilidade pela merda cabe inteiramente àquele que criou o homem, somente a ele..."
Mas trinta ou quarenta anos só discutindo protocolos, interpretações, moralismos, putarias e intrigas, idealismos... Fazendo propaganda enganosa. Atiçando artificialmente uns jornalistas contra outros para angariar audiência e para manter os rebanhos esperançosos e na torcida. E só falando em Saúde, em Educação, em Moradia, em desemprego, em Segurança e na tal Carta Magna! Meio século cacarejando sobre esses temas, como se a vida e a civilização se reduzissem a isso... e com a merda escorrendo pela beirada das casas... Isso é demais! 
O que falam, o que pensam e o que sentem na intimidade essas gentes? 
Não é possível que não consigam perceber o cheiro e nem o vínculo direto que há entre a educação, a cultura, a saúde e a segurança pública, com a merda! 
É evidente que um país que não tem sistema de esgotos e nem privadas não terá educação, nem engendrará grandes obras culturais, nem será um povo saudável e nem se livrará das chacinas diárias. Sem água potável (veja-se o que esta acontecendo no Rio de Janeiro e a culpa não é das algas) e sem privadas, um povo não tem como conquistar algum tipo de 'amor próprio', de 'auto-estima', de lucidez e muito menos de soberania. E não adianta pagar um ecologista ou um radialista babaca para ficar gritando que o Rio Amazonas e o Rio São Francisco são nossos. Ou colocar um ou outro professor demagogo no Ministério da Educação, no Ministério da Saúde, na Secretaria de Cultura e no Judiciário. E não adianta ficar comprando tomógrafos computadorizados, nem mandar médicos aspones se especializarem na Índia, em Cambridge ou Berkeley. Não adianta ficar fazendo demagogia com  crentes, padres, PDs e malandros estrangeiros, com universidades, com livros e com bibliotecas. Não adianta aparelhar as policias com armas automáticas. Ampliar os acessos à Internet, (G5!) doar dois ou três telefones celulares para cada bobalhão, e investir no urânio suficiente para uma futura bomba atômica, quando 80% da população não tem nem onde cagar com dignidade, se é que esse ato abominável pode ser realizado com alguma dignidade. Tudo isso é uma idiotice perversa, quase esotérica e sem porvir. É fundamental lembrar daquilo que afirmou recentemente o escritor peruano: "O objeto que melhor representa a civilização não é o livro, nem o telefone, nem a internet ou a bomba atômica, mas sim a PRIVADA."
Em outras palavras, pode ser que com esta fraseVargas Lhosa (nobel de literatura em 2010) esteja querendo nos lembrar daquilo que dizia Leo Campion: "a superioridade do homem sobre os outros mamíferos é que ele se limpa o cu..."
Repito: um governo que tivesse culhões e sabedoria dedicaria seus 4 anos absoluta e objetivamente apenas na construção de saneamento básico e na sacralização de seus rios. Mas, e a Saúde?, E a educação?, E a moradia?, E a segurança?... Ora, cada um que as faça por si mesmo. E a arte? Bem, que a arte seja normalizada ou higienizada pelo estado, seja por um estado nazi, stalinista, ou democrático, ou teocrático, ateu ou tirano, liberal, bonachão ou perverso, (não muda em nada) isso já é em si uma anomalia. Toda arte institucionalizada, autorizada e financiada pelo Estado ou que advenha dele, leva sempre em si, mesmo que seja quase invisível, o carimbo da picaretagem.



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