domingo, 12 de dezembro de 2021

O Mendigo K e o passaporte da vacina...

- "O que é um boi, titio?

- Um touro que passou a pertencer à academia...'

Paul Valery


A mais recente discussão e polêmica entre palhaços tem sido a questão da obrigatoriedade (ou não) do tal PassaporteVacinal. Até pessoas aparentemente ilustradas, como se tivessem saído do Paraíso de Alice estão injuriadas e sentindo-se prejudicadas em sua liberdade com a obrigatoriedade do tal passaporte. Ora, será que esses Apóstolos da Liberdade esqueceram que desde que se nasce, se tem que apresentar "passaportes" para tudo? Que sem a Carteira de Identidade, sem o CPF e sem o Titulo de eleitor não conseguem usar nem uma privada pública. E que nunca reclamaram?... Por que, agora, todo esse drama infantil com uma picada e uma papeleta (ou um papelote) a mais?

Esse era o tema da discussão entre o Mendigo K e a velhinha da Armênia, enquanto esperavam que a padaria abrisse as portas. No momento em que os vi, escutei que ela, apontando para seu capote em farrapos, o ironizava chamando-o de Akaki Akakiévitch, como o personagem de Gogol. Os dois, apesar de conscientes de que o mundo é uma imensa penitenciária, pareciam favoráveis à obrigatoriedade do tal comprovante de vacina, já que o vírus (apesar do teatro das farmacêuticas e dos imunologistas) parece estar cada dia mais saudável e que, um sujeito de 9 ou de noventa anos querer colocar alguém em risco, seja uma pessoa, um cachorro, uma cabrita, outra tribo ou um país, com o argumento de que está preservando sua liberdade, é uma canalhice e uma doença infantil (como diria Lênin). Liberdade? Que porra é essa? Quem é que disse que existe liberdade para alguma coisa? Preste atenção, como todo mundo, desde que nasce até o dia que morre, só faz seguir protocolos e arrastar correntes... Uma corrente a mais ou a menos, que diferença fará? E depois, todo mundo  sabe que já há uns 500 anos antes da novela de Cristo havia a neurose do passaporte! - Dizia ela! - E ninguém sentia que sua liberdade estava sendo tolhida por isso... Tente entrar numa igreja ortodoxa da Armênia com as tetas de fora como essa moça aí - aponta para uma mulher que está na fila, um passo a frente deles, vestindo uma blusa minúscula dessas de algodão transparente que custam 11 reais em todas as biroscas... -, para ver se consegue! Ou tente entrar na Mesquita Azul de Istambul sem tirar as botas ou os tênis, para ver o que te acontece! Ou mesmo empregar-te como cozinheira por aí, na casa de uma família de Novos Ricos, sem apresentar um atestado de que não estás com os pulmões furados pela tuberculose ou com sífilis nos ossos... E isso é normal, saudável... Minha tia, por exemplo - segue falando - que era cafetina num dos tantos prostíbulos que havia aqui na cidade, durante sua construção, só aceitava em seu estabelecimento, mulheres que apresentassem exames trimestrais. Porquê sabia que uma gonorréia mal curada e transmitida a um cliente colocaria todo seu negócio a perder e disporia contra ela - para lembrar Henri Miller - toda a trouxa de roupa suja da humanidade...    

Ora.., e aquilo já não era o que hoje estão chamando de passaporte, apenas com outro nome? E nenhuma delas, inclusive as hebefrênicas e as mais epicuristas, achava que, por isso, sua liberdade estava sendo comprometida. Pelo contrário! Madame,  - sempre me diziam - não se preocupe, o que é uma folha de papel a mais para uma puta?

A propósito, por falar em gonorréia, quem é que não se lembra que em recente pesquisa feita no Canadá, ficou demonstrado que o matrimônio monogâmico ainda vigente no mundo, tem suas origens não no "amor", como se crê, mas num truque sanitário da ANVISA da época, para tentar frear a pandemia causada pela bactéria do gonococos que se alastrava na população até com mais rapidez que a do Coronavírus de hoje? 

Liberdade! Ah! Esse fantasma ilusório, como dizia Ruskin, que os homens chamam liberdade! De onde nos veio essa ilusão? O próprio ministro da saúde, que ontem garganteava que prefere morrer a perder a liberdade, não sabe o que está dizendo! Ele próprio, recentemente, foi obrigado a ficar trancafiado em quarentena nos Estados Unidos. E ficou lá, enfiado num hotel, quietinho e submisso, vigiado por câmeras e por alcaguetes, sem dar um pio e sem poder sequer colocar a cabeça para fora da gaiola. Se realmente preferisse morrer a perder a liberdade, - como diz - teria saído correndo e gritando pelas ruas daquela Babilônia até deparar-se com um brutamonte, ex combatente e paranóico do Vietnã ou do Iraque que, sem pestanejar, lhe descarregaria uma pistola nas costas... Ou no peito, dependendo da hora e das condições topográficas...

O Mendigo K a ouvia com um certo prazer. E quando ela fez um silêncio para recuperar o fôlego, ele agregou: E tente entrar na Bibliothèque l'Alcazar, de Marseille para folhear uma obra rara de Rimbaud, para ver se consegue, sem deixar na entrada o passaporte como caução... Ou viajar para o Nepal sem a vacina da Febre Amarela... Ou fazer fotos no interior do metrô de Beijing... Ou apedrejar um Ibis no Cairo... Ou tocar, sem luvas, no chapéu de um Dandy tupiniquim...

Sinceramente, não entendo por quê tanto escândalo e tantos despachos sobre essa bobagem se, até hoje, para qualquer coisa que se pretendeu fazer sempre tivemos que exibir algo equivalente... Tente, por exemplo, fotografar um evento no Congresso Nacional. Duvido que consigas entrar lá sem antes ter que apresentar o crachá a um guarda,  ou, pelo menos, a coleira que identifique a máfia para quem trabalhas! Etc... etc..., etc. Porque então, tanta resistência se, nos dias de hoje, não se consegue mais nem construir um galinheiro sem apresentar o 'passaporte' de arquiteto e o comprovante de ter sido aluno do Niemayer... Nem mais receitar umas gotinhas de Elixir Paregórico, sem antes apresentar comprovantes de ter feito 8 anos de residência no Johns Hopkins Hospital... E ninguém reclama!

Sem muita frescura, colocaram um ponto final na discussão, no momento em que o português, com cara de pouca paciência e de quem passou a noite inteira contabilizando moedas, acionou o mecanismo eletrônico das portas... O cheiro do pão recém saído do forno tornou momentaneamente o mundo numa maravilha! Antes de entrarem, ela cochichou em seu ouvido, referindo-se ao velho proprietário: esse idiota parece acreditar que em suas artérias ainda correm alguns glóbulos vermelhos do sangue do Marquez de Pombal...


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