"Ao defrontarmos o Amazonas real, vemo-lo inferior à imagem subjetiva há longo tempo prefigurada. Além disto, sob o conceito estreitamente artístico, isto é, como um trecho da terra desabrochando em imagens capazes de se fundirem harmoniosamente na síntese de uma impressão empolgante, é de todo em todo inferior a um sem-número de outros lugares do nosso país. Toda a Amazonia, sob este aspecto, não vale o segmento do litoral que vai de Cabo Frio à ponta do munduba..."
Euclides da Cunha
"Depois de uma única enchente se desmancham os trabalhos de um hidrógrafo..."
Idem
"Não sou poeta. Falo a prosa da minha ciência. Revenons!
Frederico Hartt
(Citado por E da C.)
Se você quer ler algo fascinante sobre a Amazônia e sobre o Rio Amazonas, leia no livro acima, pelo menos o primeiro capítulo: TERRA SEM HISTÓRIA. O mendigo K que também o esta lendo indagou-me: Como é que Euclides da Cunha não passou a ser leitura e estudo obrigatório ainda nas nossas pré-escolas, desde 1910?
Sem nenhum romantismo, telurismo ou nacionalismo babaca, o livro é Impressionante! Esclarecedor! Universal! E, para os mais frágeis, até poético.
Vejam estes trechos sobre o Rio Amazonas:
"Neste ponto, o rio Amazonas, que sobre todos desafia o nosso lirismo patriótico, é o menos brasileiro dos rios. É um estranho adversário, entregue dia e noite à faina de solapar a sua própria terra. Herbert Smith, iludido ante a poderosa massa de águas barrentas, que o viajante vê em pleno oceano antes de ver o Brasil, imaginou-lhe uma tarefa portentosa: a construção de um continente. Explicou: depondo-se aqueles sedimentos no fundo tranquilo do atlântico , novas terras aflorariam nas vagas e ao cabo de um esforço milenário. (...) É o efeito maravilhoso de uma espécie de imigração telúrica. A terra abandona o homem. Vai em busca de outras latitudes. E o Amazonas, nesse construir o seu verdadeiro delta em zonas tão remotas do outro hemisfério, traduz, de fato, a viagem incógnita de um território em marcha, mudando-se pelos tempos adiante, sem parar um segundo, e tornando cada vez menores, num desmatamento ininterrupto, as largas superfícies que atravessa... (...) Se sobre uma linha férrea corresse dia e noite, sem parar, um trem contínuo carregado de tijuco e areias, esta enorme quantidade de materiais seria ainda menor do que a de fato é transportada pelas águas... (...) Sempre desordenado, e revolto, e vacilante, destruindo e construindo, reconstruindo e devastando, apagando numa hora o que erigiu em decênios - com a ânsia, com a tortura, com o exaspero de monstruoso artista incontestável a retocar, a refazer e a recomeçar perpetuamente um quadro indefinido... (...) Assim se erigiu recentemente a ilha de Caruru, com dois quilômetros quadrados de área; e se reconstroem todas as que se observam acima dos canais de Breves. Mas formam-se para se destruírem, ou deslocarem-se incessantemente. As ilhas trabalhadas pelas mesmas correntes que as geraram, desbarrancam-se a montante e restauram-se a jusante, e vão lento a lento derivando rio abaixo, ao modo de monstruosos pontões desmastreados, de longas proas abatidas e popas altas, a navegarem dia e noite com velocidade insensível. Por fim, desgastam-se e acabam. A de Urucurituba durou dez anos (1840-1850), mercê da superfície vastíssima; e apagou-se numa enchente..."
E a terra abandona o homem!
E la nave va...
E la nave va...
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