terça-feira, 17 de setembro de 2019

Discurso imaginário do Bolsonaro na ONU...

Ilustres senhores, é com um esforço imenso e com um prazer igualmente imenso que estou aqui para abrir esta Assembléia...
Quero iniciar minha fala com uma epígrafe que ilustra um dos livros mais lidos em nosso século e que com certeza os senhores logo identificarão:


"Nenhum homem é uma ilha, um ser inteiro em si mesmo; todo homem é uma partícula do Continente, uma parte da terra.
Se um Pequeno Torrão carregado pelo mar deixa menor a Europa, como se um Promontório fosse, ou a Herdade de um amigo seu, ou até mesmo a sua própria, também a morte de um único homem me diminui, porque eu pertenço à Humanidade. Portanto, nunca procureis saber por quem os sinos dobram. Eles dobram por ti."

Como os senhores sabem, este pensamento pertence a John Donne, e foi inserido por Ernest Hemingway no princípio de sua obra Por quem os sinos dobram.

John Donne, os senhores também sabem, foi um poeta e padre anglicano britânico (1572-1631). Com 26 anos e como Secretário Particular de Sir Thomas Egerton, passou a encontrar-se clandestinamente com uma moça de 17 anos com quem acabou casando em sigilo. Descoberto, perdeu o cargo e foi preso. Ao sair da prisão passou a advogar, a escrever poesia e a produzir panfletos contra a igreja Católica...

Nunca procureis saber por quem os sinos dobram. Eles dobram por ti! 
Gosto desta frase. Ela poderia até ter sido o grito de luta de todos os proletários do mundo! Dos proletários e do lupemproletariado...

Sei que muitos dos senhores estão curiosos para ouvir-me: como deve ser um sujeito misógino, homofóbico, racista, ultradireitista, capacho do imperialismo, um homem que odeia o meio ambiente, que quer destruir as Universidades e por fim que é descrito como um pobre fascista... que acaba de recuperar-se de uma facada...? E que governa um país tropical, com o subsolo ainda repleto de esmeraldas, diamantes, ouro e água...

Os que os induziram a esse conceito sobre mim o fizeram de má fé. Seria educativo e revolucionário que ao voltar para vossos países lhes proporcionassem umas boas chicotadas... Lhes sugiro isto, mas o faço apenas por fazer, pois sei que como escrevia Orwell, os burocratas e outros homens 'práticos' costumam votar aos poetas um desprezo tão profundo que lhes é indiferente o que estes escrevem...

Misógino? segundo os psicólogos e psiquiatras, é aquele que tem aversão nojo e até fobia pelos genitais femininos. Não é o meu caso, estou a mil anos luz disso, senhores!

Homofóbico? Outra inverdade. Cada um que faça com seu corpo o quem bem quiser! O que não consigo é simpatizar com um partido, uma seita ou com uma república gay. Lá nos trópicos, os senhores sabem, desde sempre as pessoas tiveram a liberdade de expressar seu desejo e sua sexualidade da forma que bem entenderem, mas, sem tirania. Tanto a tirania heterossexual como a tirania homossexual são abomináveis... Aliás, a tirania dos brochas é a pior de todas...

Racista? É até uma ironia que muitos jornais, inclusive de vossos países, me tenham rotulado de racista. Basta voltar sete ou oito páginas da história para ter uma lembrança dolorosa sobre esse assunto e ver onde é que realmente esta ancorado esse sentimento nefasto. Mas, uma coisa é verdade: diferentemente de muitos demagogos, acreditamos que os negros, eles sim é que têm que buscar a soberania, por si mesmos. Não será um Estado ou um governo, por Decreto, quem os tornará soberanos...

Contra indígenas? Nosso projeto é deixar de tratar nossos índios como se tivessem algum retardo, facilitar-lhes a soberania e a passagem dos guetos e dos subterrâneos da civilidade para a própria civilidade. E de maneira afetiva e respeitosa... 
Os senhores sabem (ou não sabem?) que, na situação em que vivem, um simples  carcará infectado por um vírus de sarampo ou de gripe que pouse sobre uma de suas malocas, pode significar, em um curto espaço de tempo, o extermínio de uma etnia... E há ainda um romantismo rousseauniano e doentio a respeito desse assunto que deve ser tratado com mais ciência e com menos poesia... É chegado o momento de separar a criação literária da honestidade intelectual.
Muitos dos senhores devem ter ouvido lá em vossas escolas primárias que inúmeros nativos e autóctones lá dos trópicos eram levados das selvas e das aldeias para a Europa para serem exibidos em jaulas aos vossos tataravós. E que quando muitos de vossos ancestrais chegavam lá em seus habitats, os índios tinham a terra e vossos parentes a Bíblia. Hoje, ao redor do planeta, os pobres índios estão apenas com a Bíblia e as terras estão praticamente todas escrituradas em nome dos senhores, das vossas amantes, de vossos herdeiros... Será que vossos jornalistas não sabem disso? Não lhes parece bizarro? Mas os tempos agora são outros! 
A propósito: não vejo nenhum autóctone entre nós. E nem na platéia. E nem ali entre os jornalistas... O que foi feito com essa brava gente?

Ultradireitista? Ora, todo mundo fala por aí que foi a má administração dos governos de esquerda que endireitou o mundo... Nunca tive a fantasia de vir a ser Presidente de meu país. E mais, ouvindo os discursos das diversas facções que se dizem de esquerda lá na América Latina, eu posso lhes garantir que tenho um DNA bem mais esquerdista do que eles... Fascista? Sobre o fascismo e sobre Mussolini a única coisa que sei é que sua última amante tinha uns trinta anos a menos que ele e que proibiu as businas em Roma... Por fim, que os dois foram fuzilados e pendurados nas ruas de Milão, como porcos...

Capacho do imperialismo? Ora, isso só os meus 4 anos de governo poderão responder.


Um homem que odeia o meio ambiente? Que tocou fogo na Amazônia? Ora, não sejamos sectários. É evidente que a Amazônia pertence a todos nós. Por casualidade, parte dela esta em nosso território. Em função de sua extensão continental o esforço para protegê-la e para preservá-la é quase sobre-humano. Não somos idiotas e nem pirômanos! Temos dificuldade para tocar fogo até nas samambaias que crescem nos fundos de nossas casas... É melancólico ouvir alguns dos senhores ou de vossos jornalistas opinar sobre ela sem nunca terem ido, sequer, ao Central Park que fica ali na esquina ou aos Jardins de Luxemburgo... (E, por delicadeza, não vou falar du Bois de Boulogne...). Sem saberem diferenciar uma castanheira de quinhentos anos de um abacateiro... Já ouvi muitos dos senhores falando das selvas tropicais e da região equatorial da terra como se estivessem falando dos Quatro Rios do Éden! Acordem! Quero convidá-los a passar uma noite na selva! Ou mesmo na beira dela. Um ou dois dias nas pequenas embarcações que descem ou que sobem pelo Rio Amazonas. Convidá-los a tentar apagar uma labareda que foi engendrada pelo sol escaldante dos trópicos (e estamos quase entrando no equinócio de primavera!) ou pelo isqueiro de um desvairado que, na noite anterior, saltou os muros de um hospício.
Somos um país fascinante. Temos por lá muito daquilo que em vossas terras está ficando minguado e escasso. Estamos aqui para isso. Não é verdade? Para negociar. Mas sem plusvalia, sem exploração, sem agiotismo. Sem cartas por debaixo da mesa. Sem subserviência. Sem a distribuição de dinheiro para comprar reputação. E sem a malícia dos séculos de colonialismo. Aprendemos com Hemingway e com o poeta John Donne, que é para nós que os sinos dobram... E já que estamos falando de árvores, quero participar-lhes o conselho que uma senhora me deu ao ver-me embarcando para vá: Não cresça demais. Se cresceres muito farás sombra aos outros e eles tentarão envenenar tuas raízes!

Um homem que quer destruir as universidades? Bobagem! Quero apenas que elas voltem a fomentar o talento, a genialidade e o espírito libertário de seus alunos ao invés de travá-lo, de reprimi-lo e de doméstica-lo. Quero que os professores e os reitores substituam a baboseira do TCC por uma volta ao mundo... Para graduar-se ao invés de apresentar o TCC o aluno apresentará ao professor o seu passaporte... me entendem? Paraguai? Nota 3. Sudão? Nota 7. Picos do Himalaia? Nota 9,9!
 Sempre antes de tratar de algum assunto relativo às universidades costumo ler e reler o último discurso de Unamuno quando este ainda era reitor da Universidade de Salamanca... Leiam! Sou milico mas não sou burro!

Por finalizar, quero responder uma pergunta que me foi feita ali nos bastidores. 
Qual é meu projeto principal para o país? 
Resposta: construir uma ferrovia de ponta a ponta. Se possível que chegue até à Terra do fogo, na Argentina e a Chichén Itzá, no México. Com trens comerciais e de luxo, para passageiros. 
Uma ferrovia altera para melhor e para sempre a educação, a saúde, a auto-estima  a sexualidade, o espírito revolucionário e até a felicidade de um povo. Na Russia, construíram a Transsiberiana, que vai de Moscou a Vladivostok, praticamente só com mão de obra de prisioneiros... e no Brasil, 

Vous connaissez, hypocrites messieurs, mes égaux et mes frères...

nossas penitenciárias estão praticamente lotadas... e todo mundo coçando o saco...
Muito obrigado!
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https://mundodapolitica.com/corajoso-discurso-de-miguel-de-unamuno/



2 comentários:

  1. PAGANINI - Der Schwarzer Geiger (o violinista sombrio), por Ernst Oppler (1867-1929). Sem data. :

    https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/f/f0/Oppler-paganini-schwarzer-geiger.jpg

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  2. Que imagem excelente! Foi uma pena não tê-la conhecido antes de publicar o livro.
    Abraços/Ezio

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