"Desalmado carroceiro, diz o burro. Vê que tu és meu irmão! Mas... aleijado, que nasceste só com dois pés!..."
Roberto Correia
De tantas vezes que fui e vim por essa calçada, já conheço em detalhes todos os seus perigos e também os outros caminhantes que, como eu, para evitarem a morte súbita num sofá, saem se arrastando por aí, lado a lado com outros condenados da terra. Praticamente só gente que está ou que se aproxima da "faixa de gaza". Nos olhamos com uma certa cumplicidade e nos cumprimentamos. Hoje, um velhinho que diz ser lá de Bom Jesus da Lapa, ao ver-me, lançou a pergunta clássica que se faz lá pelas margens do Rio São Francisco:
- Ei Bazzo! E então? Ainda estás vivo?
Caralho! Que pergunta!
Mas não me incomodei, porquê percebi logo que se tratava de um dos tais - como diria Tahar Ben Jelloun - traficantes de palavras e biógrafos de enganos...
Na beira da calçada um casal de carcarás já meio obeso, ia se bicando miseravelmente e garimpando migalhas. O que teria acontecido com aqueles esbeltos, ariscos e ameaçadores parentes de águias que, em outros tempos vi lá no idílico e quase sagrado Rio São Francisco, ferozmente edificando um ninho sobre a carranca de uma caravela abandonada?
A resposta estava no bico e no porte: a urbe os havia domado e mediocrizado...
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