quarta-feira, 13 de abril de 2022

BRASÍLIA 62 anos! E eis que Brasília, finalmente, entra na era da pós modernidade... Estão inaugurando um crematório...


"El conocimiento previo de la muerte es una enfermedad que requiere un pharmakon".

(Ver Esquilo, em Prometeu acorrentado).


Bye bye cemitérios! Esses latifúndios lúgubres que infectam as cidades e que ficam ali com seus buquês murchos; com suas lápides de granito brilhantes, com seus coveiros terceirizados palitando os dentes sem consciência de porra nenhuma, e com seus fantasmas mantendo a turba de cócoras... 

Brasília 62 anos! 

Como presente de aniversário à população de fodidos e de nômades que vieram para cá em caravanas lá pelos nos anos 60/70, de todos os cafundós, acreditando que isto aqui seria um Shangri-lá paradisíaco, os burocratas resolveram, finalmente, instalar um crematório elétrico... O Mendigo K, que estava lá no meio dos burocratas que benziam o monumento, deu um jeito de cochichar-me: Sabia que os animais também lamentam os mortos? Que os elefantes depositam ramos de árvores sobre um amigo defunto? E que os ursos enterram os animais mortos, do grupo, preparando-os para comê-los mais tarde? E que os golfinhos, como as vacas, têm rituais de luto quando morre alguém do cardume ou do rebanho?

Fez um silêncio, colocou-se ao lado e um alto funcionário do cemitério e recitou (mesmo sabendo que lá ninguém conhecia esse idioma de bárbaros), um poema de Tennyson, em inglês:

O me, why have not buried me deep enough?

Is it kind to have made me a grave so rough,

Me, that was newer a quiet sleeper?

Maybe still I am but half-dead;

Then I cannot br wholly dumb..." 

Exibem o forno. Não consigo ver o nome do fabricante. 

Já viram um forno crematório? Mil graus centígrados! Que "viagem" para os masoquistas! Mas e a alma? Malandramente, já teria debandado? 

A mim, lembram de imediato os de minha infância onde eram enfiadas as cucas cobertas de farofa açucarada, ou as frictilias de dezembro, que na Roma Antiga eram dedicadas ao Deus Saturno (aquele que devorava os próprios filhos). Ah, e as tortas de banana! De vez em quando também um leitão recheado de abacaxi... Que guinada! Agora somos nós as tortas, os grostolis e os leitões... E, falando em Saturno, por mais que me esforce, não consigo deixar de associar aos fornos também aquele mito terrível lá da argentina, El mito del nino asado, que os psicanalistas daquele país não se cansavam de mencionar.

Enfim, alteramos o projeto original, trocamos o pó pela fumaça! Mas a desgraça é a mesma! Se o demiurgo tivesse sido mais lúcido e tivesse tido uma visão mais a longo prazo, teria modificado sua maldição: lembrem-se, seus merdas, que são pó e que virarão fumaça!

No fundo da maioria das casas daqueles tempos se podia ver, principalmente na hora do almoço, duas ou três mulheres vestidas rigorosamente dos pés à cabeça e quase sempre de preto, meio copo de vinho sobre um caibro, com um rosário - daqueles com uma cruz de ferro trazidos ainda do Vêneto, esparramando-se por sobre as tetas carcamanas - enfiando delicadamente uma pá imensa, de madeira, no fundo daqueles buracos feitos de barro e de pedras.

Devem ter sido aqueles fornos domésticos que, para mim, pareciam estar sempre exalando um aroma de canela, que inspiraram estes, que agora, são o símbolo maior de todo nosso fracasso... 

Um comentário:

  1. Pois é...aí quando quero trepar diariamente me chamam de tarado kkkkkk

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