sexta-feira, 15 de abril de 2022

A Ministra Damaris, os capetas... e as pulgas do inferno...


"Mandai minhas lembranças às galinhas..."
(IN: Maquiavel no inferno, p32)

"O inferno são os outros"
(Entre 4 paredes, J.P.Sartre)


Como já disse outras vezes, tenho uma simpatia especial pela Ministra Damaris. Suas declarações, sobre qualquer assunto, são sempre Transcendentes, fascinantes e de outro mundo. Cada vez que ela se manifesta, me obriga a passar o dia inteiro vasculhando minha biblioteca atrás da temática que ela colocou em pauta. Nesta semana, como todo mundo pode ver no video abaixo, foi sobre os capetas. Tema, sobre o qual, por ter escrito recentemente um livro sobre Paganini e seu 'pacto' com o demônio, tenho um acervo respeitável. Neste caso, sobre os capetas, curiosa e paradoxalmente, mesmo os que estão ironizando sua fala, não saem de casa sem dois ou três rosários e patuás enrolados no pescoço, nas calcinhas ou nas cuecas. A ministra começa sua fala declarando que o inferno está se levantando. Que seus portões foram abertos e que uma legião de capetas se espalharam pelo mundo, principalmente pelo ensolarado Brasil, para prejudicar o governo atual e, o mais curioso: que alguns desses capetas são carecas. 
Amontoei sobre a mesa meus 19 livros que tratam do tema, e até agora não encontrei nada sobre esse particular, nem mesmo na Divina Comédia (do pároco italiano) e nem no de Sebastian de Grazia: Maquiavel no inferno. De onde a Ministra teria arrancado essa informação?
Continuo a pesquisa. Georges Minois, em seu LE DIABLE, não me acrescenta grande coisa. Traça os caminhos seculares dessa crença religiosa, literária e psicótica até chegar no Diabo Superstar de agora. 
Na HISTÓRIA DO DIABO, de Vilén Flusser, vejo logo uma frase sublinhada: "A ciência termina, onde começa a magia". Umas duas páginas mais adiante, leio: "embora o Deus ocidental desempenhe o papel do diabo oriental e o contrário também ocorra, o paraíso é igualmente inatingível para ambos os fiéis e o diabo lhes seduz pela mesma força irresistível". No livro de Miguel Ángel Prieto, LA MUSICA DEL DIABLO, encontro esta referência ao músico Franz List: "considerado a veces demoníaco, nos dejó quatro piezas para piano tituladas 'El vals de Mefisto', asi como su Sinfonía "Fausto'. Um pouco mais adiante: "em 1966, Anton LaVey fundou a Igreja de Satã em São Francisco (USA), atraindo várias estrelas do cinema e da música que estavam entediadas e famintas por novas sensações". No livro de Jairo Enrique Soto Hernández: EL DIABLO EN LA CULTURA POPULAR DEL CARIBE COLOMBIANO, está escrito: "Con historias de demônios se atemorizava a indígenas y afrodescendientes, como estratégia para obligarlos a obedecer los princípios del cristianismo". No livro de Michel Pastoureau, O PANO DO DIABO, pode-se ver esta maravilha: "No Ocidente medieval são numerosos os indivíduos, reais ou imaginários, a quem a sociedade, a literatura ou a iconografia impõem vestes listradas. Todos esses são, por um ou outro motivo, excluídos ou rejeitados, desde o judeu e o herético até o bufão ou saltimbanco, passando não só pelo leproso, o carrasco ou a prostituta, mas também pelo cavaleiro traidor dos romances da Távola Redonda, pelo insensato  do livro dos Salmos ou pelo personagem de judas. Todos perturbam ou pervertem a ordem estabelecida; todos têm em maior ou menor grau algo a ver com o Diabo".
Tomo um chá de mandrágora, coloco na radiola a Sonata número 10 em A  menor, de Paganini e em seguida o Rock do Diabo bom, do Renato Matos e continuo minha pesquisa, com RELATOS DE BELZEBU A SEU NETO, de Gurdjieff.
Na BIOGRAFIA DEL DIABLO, de Alberto Cousté, leio logo na introdução um pensamento de Baudelaire: "La mayor astucia del Diablo es la de convencer-nos que no existe...". No LIVRO DOS DANADOS, de Charles Fort, me chama atenção a história dos super-lobos que foram vistos atravessando o sol durante um terremoto em Palermo. E uivavam... p. 232.
Na ALTERNATIVA DO DIABO, de Frederick Forsyth, também não há nada sobre capetas carecas. Passo para LE DÉMON DU BIEN, de Montherlant, mas o titulo é apenas uma trapaça editorial. Abro A DANÇA DO DIABO, de Ollivier Pourriol, que já na primeira página cita uma bobagem de Jó, 23: "Deus enervou o meu coração, o Omnipotente encheu-me de terror. Não pereci, certamente, no meio das trevas, nem a obscuridade envolveu o meu rosto." Esse nem tenho saco de folhear. Passo para LE DIABLE À PARIS, de Pierre Gasgar, publicado pela Gallimard, onde acabo me distraindo com o capítulo da página 53, titulado: Rue de la Femme-sans Tête.
Hoje é sexta-feira! Já estou de saco cheio com esse assunto. Dou uma olhada no penúltimo, que é o de Georges Minois: HISTOIRE DE L'ENFER, que é uma maravilha e que faria os crentes sentirem vergonha; passo para o de Giovanni Papini (que também é uma maravilha); dou uma olhadinha na ERVA DO DIABO, do Carlos Castañeda, percebo que não mencionei DEMONS (Visions of Evil in Art), de Laura Ward & Will Steeds; e, por fim, leio em voz alta esta parte do DIABO COXO, de um tal Luis Vélez de Guevara:
- És demônio plebeu, ou dos de bom nome?
De grande nome - respondeu o vidro endemoniado - e o mais celebrado dos dois mundos.
És Lúcifer - repetiu dom Cleofas.
Esse é demônio de beatas e escudeiros - respondeu a voz.
És Satanás? Prosseguiu o estudante.
Esse é demônio de alfaiates e açougueiros - repetiu a voz.
És Belzebu? - tornou a perguntar dom Cleofas. e a voz respondeu: Esse é demônio de jogadores, amancebados e carroceiros.
És barrabas, Belial, Astarot? - Disse finalmente o estudante.
Esses são demônios de maiores ocupações - respondeu a voz. Sou demônio mais miúdo, apesar de me meter em tudo; sou as pulgas do inferno, a fofoca, a confusão, a usura, a fraude, eu trouxe para o mundo a algazarra, a chacota; eu inventei as pandorgas, os comas, as marionetes, os saltimbancos, enfim, me chamo Diabo Coxo..."


 









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