quarta-feira, 24 de julho de 2019

O Mendigo K., os ladrões de intimidades presos e Pedro Nava...

"Estamos efetivamente nos destruindo por meio da violência mascarada de amor..."
R.D.Laing
(IN: A política da experiência e a ave do paraíso, p.45)

Acabo de encontrar o Mendigo K. nos arredores do aeroporto. Como esta se especializando em espionagem cibernética, me disse  que pretendia ver por lá a cara dos três ou quatro sujeitos que foram enjaulados pela polícia, acusados de bisbilhotar a intimidade de diversas pessoas país a fora. 
Independente de terem cometido crime, ou não, - foi me explicando - é importante que se considere o fato de que bisbilhotar a intimidade dos outros, mesmo quando os outros estejam apenas mergulhados em atividades burocráticas, é sempre um ato de  perversão sexual. Independente da intenção aparente e até manifesta, há sempre uma intencionalidade e um gozo perverso, ligado à sexualidade. Algo mais ou menos como a cleptomania. Lembra da cleptomania? Enquanto caminhávamos  pelo estacionamento do aeroporto ele, com um livro de Pedro Nava nas mãos deu uma guinada em sua fala.
E por falar em cleptomania, estive pensando - foi dizendo - que para entender não apenas aberrações como estas, mas todas as que estão diariamente em pauta e, inclusive, os 200 anos de condenação do ex governador do RJ, é importante ler este livro de memórias de Pedro Nava, sobre aquela cidade. Século passado. Fez um silêncio enquanto um avião decolava e concluiu solenemente: A matriz perversa desses genes pode estar lá. Veja este trecho. Foi lendo em voz alta:
[... Essa zona alegre continuava um tanto diluída, por Mem de Sá e Riachuelo, escondia-se um pouco e reaparecia apoteótica  nos quarteirões prodigiosos do Mangue - que puseram Blaise Cendrars bestificado e dizendo que não vira ainda nada igual nos bairros prostibulares das partes do mundo que conhecera...]. 
Eu e meus colegas da Assistência Pública (Nava era Médico) veteranos do seu Serviço Externo somos, com as donas de bordel, os souteneurs, os cafetões, os malandros, os gigis, os carachués e as próprias putas, os grandes conhecedores desse ambiente. Lavagens de estômago de envenenadas com fenol, permagnato, oxicianureto, sublimado, creolina - praticamo-las nos randevus de luxo e valhacoutos mais canalhas; caras trabalhadas a navalha, lombadas abertas em belas incisões esguichando sangue, contusões de porrete, ferimentos penetrantes, tripas ao léu, comas alcoólicos, êxtases de éter sulfúrico, estupores de cocaína - transportamos às centenas para entregar ao Serviço Interno do nosso antigo e desaparecido H.P.S. E éramos bem-tratados, respeitados, em ambientes que nunca teríamos a ousadia de entrar sem as imunidades do avental branco e da malinha de madeira do socorro-urgente. (...)  O quarteirão seguinte, até Conde Laje, era cheio de sobrados  de que nenhum mais alto que a Escola Deodoro. Suas calçadas eram sede, até uma ou duas da manhã, dum trottoir de mulheres de gabarito bem acima das atuais. O de hoje ganhou em variedade. Em vez de existir só o de mulheres pegando homens há mais os de 'garotos de programa'catando fanhosos, os de compadres que fazem prostituição masculina para velhotas que pagam bem e finalmente o das fressureiras se adivinhando e abordando... (...) Há uma velha rebocada que chama pela fresta das portadas postas de meia jota. Dizem que essa relíquia de uma prostituição superada faz a vida ali há mais de quarenta anos, que é de tudo e pelo jeito ainda tem freguesia. Conheço-a de vista de meus passeios a pé e quando ela da janela me rejuvenesce com seu discreto sinal de cabeça (entra simpático) nunca deixo de cumprimentá-la grave e profundamente como a uma grande dama...
Sempre penso nesse mundo iluminado, poético, trágico, sinistro e orgástico quando nos meus passeios pela Glória entro na Rua Conde de Laje despida das galas de seus antigos festivais e vazia de suas multidões de machos em cio. Quem poderia me dizer que eu contemplaria as ruínas e o paredão se desagregando... ]
Pedro Nava
IN: Galo-das trevas, pp. 13, 18, 20.

Um comentário:

  1. Não escondo o meu ódio mortal por por médicos, psicólogos e psiquiatras.

    Se eu pudesse escapar da lei, matava todos eles lentamente.Pouparia só o Bazzo, só por causa do blog, que é interessante.

    Na verdade a única psiquiatra que pouparia é uma viúva pernambucana assaz culta e inteligente, e que boceta ela tinha! Jesus!Era uma máquina de foder!

    Agora fui pesquisar sobre esse tal Nava na Wikipedia, me parece um filhinho de papai bem fresco e efemeninado, um pedaço de merda, sem tirar nem por. Vejamos o que diz a Wikipedia:
    "Matou-se com um tiro na cabeça aos 80 anos, numa praça do bairro da Glória, após ter atendido, em seu apartamento, a um misterioso telefonema. Cogita-se que Nava vinha sendo chantageado por um garoto de programa, informação encoberta pela imprensa à época.Em 1928 se formou, mas já atuava em cargos públicos nos setores de Saúde em Belo Horizonte. O círculo familiar e afetivo da Nava teve boas influências tanto na sua vida intelectual, quanto na medicinal. Por ter sido filho de médico e parente de pessoas influentes nas cidades onde morou, sempre esteve em bons cargos públicos da área de saúde."

    Que se foda, o Nava e a merda de seus livros.

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