sexta-feira, 21 de abril de 2017

Palocci e a vingança do Estado...


"Sou a espécie de idiota que, diante de César e de seus leões famintos, precisando apenas desculpar-se para ir embora livremente, não consigo deixar de dizer 'foda-se!' a César..."
J.H.A

Entre todas as imagens e diálogos divulgados entre prisioneiros e juízes na operação Lava-Jato, a que mais me incomodou foi essa de ontem, do Palocci, diante dos juizes. Como é possível que a sociedade tolere a até fomente esse tipo de degradação, de ruína e de humilhação de uma pessoa? Enquanto o Palocci, como uma criança desesperada ou como um condenado ao inferno, colocava à disposição da justiça além de seu corpo, sua memória e sua dignidade, eu ia lembrando dos relatos de prisão do Jack Henry Abbott, no livro NO VENTRE DA BESTA, com uma introdução de Norman Mailer. Nas últimas duas linhas da página 63 Jack escreve: "O confinamento solitário, em um presídio, é capaz de alterar a composição ontológica de uma pedra..."
E não digo isso por frescura e nem por um surto histérico de humanismo, mas porque qualquer um que pense, percebe de imediato que, independente dos crimes cometidos pelos prisioneiros, a vingança da sociedade e do Estado sobre eles é muito mais bárbara e cruel, pois é friamente planejada e executada com o preso indefeso, psicologicamente desesperado e despedaçado.
Na página 60, pode-se ler: "E... depois que lhe fizeram tudo isso, depois que lhe roubaram inteiramente o medo e nada mais pode ser usado para ameaçá-lo ou constrangê-lo - de que adianta mantê-lo na prisão? Não é mais possível puni-lo. Você se tornou inatingível. A loucura é a única possibilidade. Ou a velhice..."
Abaixo todas as prisões! Abaixo essa República de bosta!
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Nota:  Na introdução desse livro estupendo, Norman Mailer, baseado nas cartas que recebia do presidiário Jack Abbott, escreve:  
1. "A prisão, fossem quais fossem seus horrores, não era um sonho cujas origens pudesse levar-nos à eternidade, mas uma máquina infernal de destruição, uma invenção apropriada ao ânus abjeto de uma sociedade monstruosamente doente".
2. Numa prisão, se os tímidos se tornam mesquinhos e desleais; os corajosos se tornam cruéis. Porque quando bravos e fracos são obrigados a conviver, a coragem vira brutalidade e a timidez, vileza. O casamento de um homem corajoso e uma mulher medrosa só perde em infelicidade para a união de uma mulher valente e um homem medroso. O sistema penitenciário perpetua tais relações.
3. Contudo, não vivemos num mundo onde se tente resolver esses problemas. Mesmo assumir o que se faz já é utopia. O mais terrível é que todos nós habitamos esse corpo político doente, mergulhado em iniquidade, tão grande, realmente, que a risada da hiena ressoa em cada aparelho de TV, e corremos o risco de que ela se torne nosso verdadeiro hino nacional. Todos somos bastante culpados, na medida em que permitimos que o mundo à nossa volta se tornasse mais vil e insípido a cada vez que nos rendemos ao terror e nele mergulhamos. A ameaça toma as dimensões de um Gólgota, e a classe média se refugia em cidadelas fortificadas, com sentinelas armadas. Aí as prisões são carpetadas, de um lado a outro, e os guardas tratam os prisioneiros de 'Senhor", enquanto fazem uma reverência. Contudo, não deixam de ser prisões. A medida do progressivo aprisionamento de toda a sociedade vai ser dada pelo estado de suas penitenciárias, elas próprias. O sentimento de culpa dessa sociedade fica em evidência quando visto através das lentes incandescentes do cárcere. Eis porque não falamos em melhorar as prisões - isto é, transformá-las por meio de alguma transmutação poderosa - mas, tão somente, de fortalecer a lei e a ordem. Todavia, isto não é mais exequível que o sonho de cura num canceroso.
4. Não se conseguirá lei e ordem sem uma revolução no sistema carcerário."

8 comentários:

  1. Bazzo, não tenha compaixão desses bandidos. Vou comprar o livro do Jack Henry
    http://oglobo.globo.com/brasil/palocci-sinaliza-delacao-diz-moro-ter-informacoes-para-mais-um-ano-de-trabalho-do-juiz-21234858

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  2. Tratar bandido como bandido ė ser bandido.

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  3. http://noblat.oglobo.globo.com/geral/noticia/2017/04/um-estado-esquizofrenico.html

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  4. "O corpo foi dobrado pouco a pouco pelo poder, de maneira sutil, através de várias técnicas de dominação" Vigiar e Punir:nascimento da prisão, corpos dóceis. Michel Foucault. Com um tempo o "condenado" confessará, sobre os olhos onipresente do panóptico, que matou Jesus Cristo, e que colocou fogo em Roma..

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  5. http://www.scielo.br/pdf/sssoc/n118/a04n118.pdf

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  6. http://g1.globo.com/rio-de-janeiro/noticia/ex-morador-de-rua-preso-em-protesto-de-2013-e-condenado-a-11-anos-de-prisao-por-trafico.ghtml

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  7. Este seu artigo é mais que excelente, é importante, é lúcido, é essencial para um reexame de tudo que o sistema prisional vem fazendo na história humana. Um sistema que somente destrói o indivíduo, o embrutece ainda mais, o desagrada e coisifica. Isto nunca vai levar a coisa alguma exceto ao exercício da crueldade crescente por parte de todos os envolvidos. É bem pior que no mundo selvagem e animal. Vou ler o livro, se o encontrar...

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  8. http://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/politica-brasil-economia/63,65,63,14/2017/04/22/internas_polbraeco,590301/entenda-o-impacto-de-uma-eventual-delacao-premiada-de-palocci.shtml

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