A desgraça no Rio Grande do Sul e Karl Marx: A história se repete, primeiro como tragédia e depois como farsa...

"De modo que uma ópera de Verdi, a filosofia de Kant, um show dos Rolling Stones e uma apresentação do Cirque du Soleil se equivalem..." 

Mario Vargas Lhosa

(IN: A civilização do espetáculo)

Os gerentes da república, os que há 50 anos gerenciam as chaves das diversas arcas e cofres, estão agitados com os acontecimentos lá no Rio Grande do Sul. 

Reuniões e memorandos para todos os lados. Todo mundo fingindo sobriedade. Ministros vão e vêm! As secretárias enxugam uma lágrimas aqui, uns suores ali. Falam em situação de guerra. Mas de quem contra quem? Releituras da Constituição; promessas; surtos de humanidades; os helicópteros não param e até seus pilotos parecem consternados. Citações do Eclesiastes e até alguns soluços... E as mídias disputando "fontes"... as imagens mais dramáticas e as declarações mais chocantes daquela gente dependurada nos telhados, numa solidão do caralho, trocando olhares de afeto com seus cachorros. A propósito, observem o olhar dos cachorros que são resgatados junto a seus donos, naquelas embarcações improvisadas que lembram la mítica nave de los locos.... Nem latem, vão quietinhos e em desespero, como se estivessem envergonhados, olhando fixamente naquelas águas radioativas...  não é difícil traduzir o que gostariam de dizer...

Mas não se iludam. Não há nenhuma semente de rebelião em curso. Os barracões lotados de doações (a respeito das doações, não confundir culpa com solidariedade...) e quinze dias de sol serão suficientes para que as águas baixem e para que tudo volte literal e miseravelmente ao que era antes... 

Por enquanto, o stablishment politico garantiu 1 bilhão! Mas se for necessário haverá mais... O RS receberá (a priori) 1 bilhão para enterrar os mortos, encontrar os desaparecidos; conter as gangues de oportunistas; retirar o lodo de dentro das casas; rastrear a urina dos ratos e a leptospirose impregnada nas paredes; negar e apagar os rastos de todas as evidencias de incompetência administrativa; consolar e apaziguar o coração destroçado dos eleitores que viram mais uma vez, em um ano, suas tralhas, seus gatos, cachorros, vacas e livros serem levados no meio daquela borrasca... E, claro, para pagar carpinteiros improvisados e reconstruir aquelas casinhas no estilo de vilarejos italo/lusitanos, sempre com o mínimo possível... e com aquelas janelinhas sufocantes voltadas para um suposto luar, de onde aqueles velhinhos indefesos vão espreitar e esperar pelas chuvas de abril do ano que vem... 

Sim, choveu. Foi uma chuva intensa. Mas uma sociedade que tem gente especializada em engenharia e em rios... não conseguir previnir-se de uma chuva!!!. O que estaria acontecendo, quando até Noé, naqueles tempos em que não havia escova de dentes e nem papel higiênico, construiu de emergência aquela geringonça, enfiou nela leões e até dinossauros, e driblou aquele sádica tentativa divina de abortar o erro da criação? E os doutores que foram várias vezes a Amsterdam ver com quantos paus os holandeses fazem um dique? E com quantas comportas administram os seus córregos? Ninguém quis ouví-los?

Sabe-se que foram muitos os alertas. Ora! Se não se acredita na ciência, para que ir fazer doutoramento lá no quintal dos colonizadores? Para que manter as universidades funcionando? E os institutos e os 80 mil que vão prestar o ENEM?

Sim, eu sei: agora não adiante ficar chorando com os sapatos encharcados no leite derramado... Mas querer colocar a culpa apenas nos "rios voadores" vindos da Amazônia ou nas águas aquecidas do Pacífico... ou numa perversidade divina, isso é uma desonestidade intelectual e um um show de bufoneria...

1 bilhão! Pense bem: UM BILHÃO! E sem prestação de contas como já vem se fazendo há anos com as tais emendas parlamentares? Tudo bem! Mas é evidente que isso é uma escola de delinquência e de bandidagem, a continuidade da loucura inútil e da tragédia! Um país que não tem uma política preventiva (não apenas a respeito das chuvas) mas nem de saúde mental, nem do saneamento básico e de absolutamente nada, é bom ir pendurando as chuteiras... enquanto é tempo...

Você aí que ora parece ter uma alma de mariposa e ora um espírito de porco ou de ave de rapina, se não quer pensar nas crianças da Palestina, pelo menos pense em Petrópolis e na frase que Marx lacrou lá em seu 18 Brumário: a história se repete, primeiro como tragédia e depois como farsa...