sexta-feira, 17 de maio de 2024

O Mendigo K e sua elegia à bicicleta...



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 "BICICLETA - Alma metálica, de sorriso de níquel..."(Donnay)






Neste sexta-feira, o Mendigo K apareceu na padaria montado em sua bicicleta (que ele ainda chama de velocípede), irradiando uma alegria que, há muito tempo, não se vê no resto da humanidade... E foi relatando a seus comparsas:

Depois de 4 anos resgatei minha bicicleta. Ao lado do fogão descobri que sentia por ela um afeto indiscritível. E que a recíproca era verdadeira. Intacta, apenas com os pneus apodrecidos. Mas não me culpava por isso. Foi sobre eles que conservou o resto intacto. Dizia. E depois, no bicicletário, o amor daquele sujeito que a ia desmanchando, chamaria atenção até de uma pedra. Como um anatomista, passou a vida inteira renovando pneus, trocando correias, parafusos, pedais. E recomendando capacetes (parecidos com aqueles dos batedores nazis), não só para os velhos e para as crianças, mas também para um sujeito que estava lá se jactando de ter ido de Ouro Preto a Paraty, pela estrada velha do caminho real. Estrada por onde escoou todo o ouro que os portugueses e os espanhóis roubaram de Minas Gerais. Ouro que até hoje está decorando inutilmente as lantejoulas dos deuses e das santas nas catedrais de Toledo, de Lisboa e etc... Quando é que esses gatunos devolverão o motim? Mas, e como devolvê-lo sem que caia nas mãos de outros ladrões?

No passado, ia me dizendo aquele autêntico anatomista, se necessitava um monte de chaves para desmontar uma bicicleta, hoje, praticamente nenhuma. Se o ser humano continua o mesmo dos tempos das cavernas, a tecnologia deu um salto imenso.  Da bicicleta do barão Karl Von Drais às elétricas, foi um pulo! E a primeira ciclovia que se tem noticias foi a de Paris, construída em 1862. Quem não andou de bicicleta em seus primórdios tem um deficit parecido ao daqueles que não mamaram nas tetas de sua mãe. E isso é tão verdadeiro que mesmo com 70 ou 80 anos, ninguém se esquece de andar sobre as duas rodas e muito menos de mamar...

E o inevitável preconceito com os motociclistas! Eles que, segundo Guido Edoardo Mottini, são imbecis perigosos que vão montados em uma metralhadora... E vão chegando outros fanáticos pelo ciclismo, entre eles, entregadores de papelotes, de remédios e de pizza com a maletinha do Uber ou do ifood... Discutem se a invenção dessa geringonça se deve realmente a um chinês ainda antes de Confúcio, a Leonardo da Vinci ou ao barão alemão... Cada um querendo revelar trilhas, atoleiros, contar pequenas aventuras, acidentes, e exibir cicatrizes na nuca, nos cotovelos e nas panturrilhas. Também iam chegando mulheres que, segundo o anatomista, cada vez mais procuram por coxins e selins que sejam suaves para os grandes lábios... (risos. Uns tímida e outros descaradamente). Um dos clientes lembrou da recente teoria que a bicicleta (para os homens) poderia desencadear uma inflamação da próstata. Mas foi logo rebatido por outro que atacou: bobagem! O câncer e a próstata são os álibis de todos médicos e laboratórios de medicamentos. Como é que se atreveriam a colocar no mercado alguma pastilha de vinte centavos que evitasse esses problemas? Se pode dizer que vivem do câncer e da próstata! O clima ficou pesado. Alguém esforçou-se para voltar aos pedais e à maravilha das duas rodas... Um velhinho chinês de uns 95 anos, que costuma dar aulas de Tai Chi Chuan para amantes de deputados, saltou sobre a sua, tão antiga como ele e desapareceu em circunvoluções pelos fundos das biroscas...


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