A precária condição humana e a inacreditável destruição do Rio Grande do Sul...

 

Segundo a lenda, 

"Deus fez o primeiro jardim; Caim fez a primeira cidade..."

Com toda a destruição e impotência que se vê, aquelas águas de abril colocaram em evidencia não apenas a vulnerabilidade das vilas, das cidades e dos acampamentos urbanos, mas principalmente a precariedade da condição humana. Evidenciaram a furada com a qual os pobres, os fodidos e os Condenados da Terra precisam conviver... durante 70, 80 e até 100 anos...  Unidos ou desunidos. Agarrados uns aos outros como náufragos ou cada um em sua enternecedora solidão...  Dando ao mundo a face de um imenso orfanato... Com uns adotando os outros... Impressionante! Uma tragédia mais ou menos anunciada desde 1941, mas que ninguém poderia imaginar, que viesse nessa magnitude, e pior: num encantador mês de abril.

O que fazer?

Responsabilizar os corsários açorianos... por tê-la fundado logo ali, como uma ratoeira, cercada de vertentes por todos os lados? E por falar em lusitanos, vale citar aqui uma das tantas frases reacionárias e patéticas do Fernando Pessoa: Assim é a vida... mas não concordo...

Parece não haver solução. 

Impossível apaziguar aquela quantidade de animais, de águas e de gentes... E depois, quem é que terá fôlego e saco para elaborar e ressignificar todos esses dias de horror? Quem é que se contentará apenas com algumas burocráticas condolências, com alguns elogios, reportagens, promessas vãs e com a volta de um sol desertor?... E, pior: ouvindo a turba analfabeta e até os canalhas esclarecidos cacarejando sobre a necessidade de ter empatia? 

Sim, e são os grandes ladrões e trapaceiros de sempre! Portanto, que os sobreviventes, de uma vez por todas, incluam em suas rezadeiras matinais, a frase clássica de Montesquieu: A política é uma arte - não de tornar o homem feliz, mas de depravá-lo.

Aliás, o que diria Getulio Vargas (aquele baixinho de botas) de tudo isso, ele que tinha 59 anos nos dias da enchente de 1941?

E o Brizola?

E o Jango?

E o Dyonélio Machado, romancista e 'psiquiatra', nascido em Quaraí, autor do livro OS RATOS?

A propósito, além dessa imensa tragédia ter revelado gente disposta a tudo para resistir, para salvar e salvar-se; para mergulhar heroicamente até no encalço de um gato em naufrágio, e até a perdoar o imperdoável; também arrancou das tocas uma quantidade impressionante de 'delinquentes', de petits voleurs, aproveitadores, e pequenos larápios... Sim, deu visibilidade a uma categoria invisível, empurrada e encurralada há décadas nas cadeias, nas sombras e na beirada dos córregos... Trata-se de quem??? Do famoso  lumpemproletariado... outro tipo de fodidos e de condenados da terra... Tomara que com os primeiros 14 bilhões destinados pelos cofres da República, para dar inicio à limpeza e à reconstrução de tudo, não se cogite a pueril e nefasta ideia da edificação, também, de mais uma penitenciária... Pois, elas são, não apenas para os presos, mas também para os juízes e carcereiros, um mal maior, bem maior até que todas as tempestades e as tormentas juntas... Elas são  capazes de alterar (para sempre) o DNA até de uma pedra...