domingo, 20 de julho de 2025

Caprichos e trapaças da memória...




Quase todos os domingos, lá pelas 10:00 horas, quando vou ao mercado da esquina abastecer minha cozinha com raízes de bardana e de nabo branco (aquele que os japoneses chamam daikon), um dos cheiros do ambiente me remete imediatamente à Benares. Como todos os frequentadores de lá sabem, os açougueiros do local, para seduzir e inebriar os clientes, costumam jogar sobre uma chapa elétrica, uns retalhos de alcatra, de maminha e etc... chapa ao redor da qual, os clientes, dos mais remediados aos mais fodidos se agregam...  e vão dando suas beliscadas através de uns palitos que são deixados ao lado. O cheiro que toma todo o mercado, não é ruim, mas quando a carne queima... esse cheiro me remete imediatamente à Bènares, aos crematórios públicos de Bènares, ao lado do Ganges. Você já foi a Bènares? Não! Continuas na janela, palitando os dentes, fazendo intrigas, cultivando uma barriga indecente, contando os centavos e esperando a morte chegar?

Então você nem imagina o que se experimenta, quando, de uma barcaça precária e sem mastro  (levitando nas águas sujas e "sagradas" do Ganges), se assiste àquelas fogueiras, queimando cadáveres, praticamente o dia inteiro, com um ou outro "funcionário" remexendo os tições e os ossos, e um ou outro guapeca de plantão, aguardando discreta e pacientemente a parte que, profana e na clandestinidade, sempre lhe cabe... Chamava atenção, além dos cães, o aglomerado de velhos que, mãos às costas, e olhando timidamente para as labaredas... lembravam da famosa, hetarista e cínica Praça dos insepultos, dos anos 70, lá no Rio de Janeiro, em frente ao Cassino Atlântico...

Sim, a memória é caprichosa e também sádica! Quem sabe, no futuro, não venhamos a admitir que o tal Alzheimer (dependendo da história de cada um), é quase uma benção...











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