“Finalmente, depois de muita bebedeira a multidão entrava na
capela de Nossa Senhora dos Prazeres e dissolvia-se...”
Gregorio de Matos
O Mendigo K que pegou sua cartela de viagra (falsificados por camelôs), duas dúzias de preservativos (doados pela secretaria de Saúde) e marchou para o carnaval de Salvador, mandou-me notícias, indignado com os cartazes com que foi se deparando pelas paredes da cidade carnavalesca.
Mas como? O carnaval não era uma festa popular para fazer um contraponto com a escravidão, com a repressão, com as restrições e com o tédio da vida cotidiana e ordinária? Acabou sendo burocratizado? E mais, por iniciativa de um partido político da chamada esquerda? Se descobrirem que levo uma cartela de viagra e vinte e tantos preservativos no bolso, será que serei preso, como o cara da pepita?
Estava não apenas indignado, mas confuso.
E em cima dos Trio Elétricos as balzaquianas e os balzaquianos de sempre (por puro business), para turbinar o imaginário da turba, iam requebrando os esqueletos e insinuando liberdade, luxo, sexo e felicidade... Mas era só insinuação. A teatralidade do camaleão e do sexo! Porque cada vez que uma das 400 igrejas da cidade balançava seus sinos, a turba ajeitava o fio dental entre as nádegas, cobria os grandes lábios e enfiava (um pouco) as tetas para debaixo dos 'abadás'... Até o cheiro antigo e vigoroso da maconha, foi substituído pelo brochante e vomitivo do incenso das capelas...
E na multidão, ninguém pintado de negro e muito menos cantando "negra do cabelo duro"; Ninguém fantasiado de padre Cícero, de rabino, de carmelita ou de Pai de Santo; e nem mesmo um furtivo olhar de malícia na direção dos gorduchos, dos gays e dos transviados. Fantasiado de judeu? Nem pensar! Suásticas, então! Acabariam com a festa; E qualquer coisa que remetesse ao massacre na Palestina seria logo enquadrada pelos supostos infiltrados do General Heleno; Qualquer menção a deficientes físicos também estão proibidas, pois invocariam o caos na saúde pública e a negligência estatal nos últimos 200 anos. E qualquer adereço que lembre o PINEL ou algum transtorno de personalidade, é cadeia na certa! E por fim, são proibidas "as fantasias que hipersexualizem as profissões" (vejam como esta palavra está escrita no cartaz). O que seria isso? Estão se referindo aos abusos sexuais ocorridos dentro dos hospitais? Ou à profissão mais antiga do mundo?
Enfim, a tão badalada festa popular estava visivelmente convertida num saltitar entre bobalhões (para inglês ver) e numa pulação moralista, reacionária e para trouxas e, pior: à beira de córregos contaminados... e no meio de uma mosquitada de dar medo... (Festa que as elites e os novos ricos assistem, desde a cobertura de seus palácios, com um certo simulacro de pena e de compaixão...)
Enfim, preste atenção: apesar do blá blá blá dos vendedores de confetes, serpentinas & de ilusões, aí estão condensados 500 anos de solidão e de erotismo religioso!
E la nave va, coi suoi poveri pazzi, dritta nell'abisso!
Nega do cabelo duro...maior gostosa!!! Kkkkkkkkkk
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