Gustave Doré
Quem já passou um ou dois dias vagando pelos salões do Museu do Prado deve ter se deparado involuntariamente com a obra abaixo, assinada por um sujeito conhecido por Velásquez e com o título: as fiandeiras. Da mesma maneira, quem já circulou pelos sertões brasileiros, ao enfiar de forma impertinente a cabeça em uma ou outra janela daqueles cortiços à beira do São Francisco, deu de cara com um grupo de mulheres (praticamente só mulheres), de cócoras, inspiradas pelas aranhas, não fiando, mas tecendo.
Na Amsterdam de Spinosa, lá por 1660, época em que o jovem Baruch escreveu sua obra mais incendiária: O tractatus theológico-politicus (quem ainda não a leu não sabe nada de nada) obra que lhe valeu a excomunhão pela comunidade judaica de então, naquela Amsterdam, não muito distante de onde hoje pequenos burgueses e velhos voyeurs vão sistematicamente em grupos ou sozinhos espreitar as vitrines de um renomado puteiro, havia uma prisão feminina conhecida por Spinhuis, que queria dizer Casa de Fiação. Nela eram trancafiadas as mulheres que haviam cometido algum delito ou alguma transgressão porque, se acreditava, "que fiar lã tinha um efeito restaurativo sobre a índole feminina" (para não pensarem que estou inventando, vejam a página 61 do livro de Stefen Nadler: Um livro forjado no inferno.
Sem demasiado lero-lero masturbatório e intelectual, acredito que não foi por acaso e nem por inocência que Diego Velásquez, nascido na carola e reacionária Sevilha de 1660, produziu naquele momento sua obra principal (as fiandeiras) e que também não era por acaso que os cangaceiros de Lampião, bem depois, gostavam tanto de ver suas companheiras, mesmo enfezadas, com uma tesoura e uma garrucha de dois canos engatilhada ao alcance da mão, agachadas, cantarolando e tecendo... cantarolando e tecendo... tecendo e lutando em vão para 'restaurar ou alterar a índole'...
Diego Velásquez As fiandeiras
https://www.youtube.com/watch?v=z9RETHRKRoY
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