Nesta manhã ensolarada de sexta-feira, até o Mendigo K apareceu ali na padaria lusitana com a inscrição Magnitsky na camiseta, e com um cartaz onde dizia ser contra a criação do estado Palestino...
Aos clientes jubilados (e preocupados apenas com as tripas) que o olhavam com curiosidade, foi logo esclarecendo: o genocídio na Palestina e a tal Lei Magnitsky são as duas misérias e as duas vergonhas mais abomináveis desta década... Quem é que poderia imaginar que uma lei de merda destas, colocaria uma nação inteira de joelhos e com as cuecas na mão? E quem é que poderia imaginar que os filhos, netos e bisnetos dos judeus (que até recentemente, aqui nos trópicos, com a conivência da polícia, pretendiam proibir até a leitura do Mercador de Veneza (Shakespeare), pediam a prisão de quem pronunciasse o nome de Hitler e até de quem usasse numa obra de arte, imagens da suástica), fossem capazes de tamanha brutalidade? Quem é que poderia conceber que um povo que há menos de 100 anos, foi humilhado, deixado morrer à mingua, queimado em fornos e quase extinto pelos nazis, repetiria agora um crime semelhante contra uma população vizinha, pobre e quase desarmada? Que estranha sina!!! Que estranho e miserável destino!!! E pior: com o apoio e a conivência de outras cinco ou seis nações igualmente usurpadoras, miseráveis e colonialistas? Quem é que poderia imaginar que o mundo inteiro, com essa cara de babaca, mesmo assistindo a esse horror, seguiria bocejando e cacarejando sobre humanismo, dignidade e autorrealização em suas mídias, penitenciárias, igrejas e universidades? Volto a Dostoiévski, lá em Memórias da casa dos mortos: "Uma tão brutal insensibilidade chega a parecer inverosímil. Trata-se de um fenômeno, de alguma deficiência ingênita, de uma monstruosidade moral e física, ainda ignorada da ciência, e não de um simples crime..."
A platéia ficou em silêncio. Apenas um casal de velhinhos, ele já com sinais de Parkinson, que ocupava uma mesa junto à janela, resmungou o resmungo cretino e canalha de sempre: deve tratar-se de um antisemita... Ao que outro cliente rebateu cinicamente, citando a François Villon: "Tant crie l'on Noel qu'il vient..."
E sou contra a criação do estado Palestino - concluiu -, por dois motivos: primeiro, por tratar-se de uma nova e desesperada artimanha para conseguir aniquilar aquele povo... e segundo, porque o Estado é, como diria Nietzsche, entre os monstros, o pior deles...
E lá fora, ao sol, como um expulso do mundo, vai o afiador de facas.., com seu chapéu panamenho caído sobre os olhos [...] ouvindo uma música cubana carregada de nostalgia, de augúrios e de presságios...

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