quarta-feira, 27 de julho de 2016

A velharia em trânsito...

"De antemão dou risada do embaraço que te espera se não sabes quem és ou da vergonha que sentirás se fores confundido na multidão de idiotas..."
Denis Diderot (Em O passeio do cético)

Como o trânsito aqui na cidade está mais confuso e pior que o de Bangladesh, com carros, caminhões, carroças, cavalos, motocicletas, vendedores, tapa-buracos, ônibus escolares, mendigos, lixeiras, carros da policia, cachorros e etc, disputando espaços, tenho me valido - melancolicamente, é verdade - de uma credencial que o Estado Cristão e filantrópico presenteia às pessoas com mais de meio século. 
Com ela tenho estacionamento preferencial, isto é, há sempre uma ou duas vagas a espera desses seres que já estão prá lá de Marrakech e que ainda insistem em sair pilotando por aí. 
Mas, mesmo assim, acreditem, de vez em quando tenho assistido a duelos cinematográficos entre velhinhos e velhinhas na disputa por tais vagas. Ontem mesmo, no momento de estacionar ali em frente a uma clinica geriátrica, uma delas, com cara de dona de bordel aposentada, veio nervosa e autoritariamente perguntar-me quantos anos eu tinha e exigir que eu lhe mostrasse minha identidade... O fiz com a maior presteza e delicadeza com medo que ela, por uma razão qualquer, fosse à delegacia da esquina acusar-me de falsa identidade, misoginia, assédio sexual, fobia a mulheres ou até mesmo de gerontofilia. Quando ela se afastou resmungando, requebrando aquele esqueleto em ruínas e amaldiçoando o universo, não consegui evitar de pensar (com todo o respeito, claro!) naquele texto de Dostoiévski onde ele pergunta: 
- Quem é que vive mais de 40 anos? 
Para logo em seguida, ele próprio responder: Só os canalhas.

Um comentário:

  1. Tudo bem...mas fica aqui nesse mundo que você ainda tem muito a comentar...

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