O simpático paraibano autor de O santo e a porca e o Auto da compadecida (entre muitos outros) esteve palestrando hoje num órgão governamental aqui na medula da república. Do alto de seus oitenta e tantos anos não se intimidou nenhum pouco ao afirmar aos burocratas que o aplaudiam que o povo brasileiro o elegeu como seu representante cultural etc. Será? Pode ser puro preconceito, mas fico enojado sempre que vejo algum “intelectual” ou “artista” mamando nas tetas estatais ou colocando sua arte a serviço deste ou daquele governo. Sou daqueles sujeitos para quem todo criador deve manter-se o mais distante possível dos umbrais do Estado e mais longe ainda de seus ladinos representantes, seja ele um Estado de direita, de esquerda, do centro ou de alguma outra estirpe qualquer. Por coincidência, no final de semana também assisti a um show de hip hop ou rap (nem sei direito o que é isso) onde apesar das letras das músicas serem de extrema agressividade e de crítica social, policial e política o evento estava sendo financiado por duas ou três estatais e até por alguns bancos. No caso da Lei Rouanet, então, nem se fala. É até deprimente ver os ditos “artistas” açucarando suas obras e rastejando pelos corredores dos ministérios atrás da "aprovação" de quatro ou cinco burocratas, requisito básico para que este ou aquele empresário, industrial, banqueiro ou coisa do gênero aceite bancá-las em troca de isenção fiscal. Isenção fiscal? Neste caso, como o mecenas está única e exclusivamente interessado em safar-se dos impostos e que no final das contas é o Estado que dissimuladamente a estará financiando, a prevaricação e a prostituição é ainda pior porque é dupla. No mundo acadêmico e nas universidades (apesar do suposto charme e da exibição obsessiva do saber) acontece a mesma coisa. Nossos profetas revolucionários dos anos 70, 80, 90 não se acanham em aceitar financiamentos, ajudas e bolsas de estudos de fundações e de corporações que até ontem eram consideradas demoníacas e cujas ideologias e cujos interesses internacionais são quase sempre radicalmente opostos a toda e qualquer pesquisa de cunho emancipatório e de interesse social. Enfim, apesar de todas as encenações do cotidiano, seguimos nessa marcha anti varonil sem grandes obstáculos e completamente amancebados com quem detém o poder, cada dia mais esquizofrênicos dentro dos muros e cada dia mais esquizoides fora deles...
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