1. Esta a expressão máxima de nosso pretenso espírito eclético e conciliador: o fanatismo do mesmo. Os grupos são lugares de privilégio das elites na partilha do poder. Nesta prisão primária que é o grupo fanatizado, a visão mágica emerge. Divergir é crime. Discordar é subversão. Perguntar já é um ato de desobediência.
2. Quanto à filosofia, é grave que entre nós tenha se recusado a cumprir a missão que lhe seria própria: ser o centro de consciência crítica, de negação de nossas falsificações existenciais. A inexpressividade da filosofia no Brasil se deve ao fato de ocorrer, sem revolta, ao nivel da repressão difusa no todo social. É esta despersonalização, ainda não pensada entre nós, que destrói a possibilidade de um pensamento nosso. Se esse pensamento quiser existir deverá traçar para si um caminho marginal, ousar, sair do sério – coisas que vão contra predisposições assumidas ao longo de tanto tempo que, hábito arraigado, nos aprisiona. Assim, não somos um país jovem, mas apenas um país infantil e ameaçado de envelhecimento precoce, já que vítima de tanta história dependente, devedor do passado.
3. Ocorre, porém, uma coisa estranha: o mesmo homem que realiza a mais dissolvente conciliação, urra de ódio contra os opositores. A maldosa crítica fora de propósito, dirigida contra pessoas e não contra idéias, passa a ser então a arma de que se vale este curioso arrivista, o intelectual tupiniquim.
4. Há muitos anos calada, a “inteligência” brasileira voltou-se para um formalismo delirante, novidadeiro e pernóstico, e “esqueceu”o que a fazia calar.
5. Tendo se furtado a responder a urgências históricas nossas, a grande crise do intelectual tupiniquim é viver mendigando consideração e reconhecimento (…) Quer ser aceito sem perceber que ser aceito é morrer para a razão. Querendo ser sério – para então ser levado a sério – policia-se: o que pensar, o que ler, o que escrever. Seu esquecimento consiste nisto: esqueceu-se de que pretende ser reconhecido pelo que não é. Seu pensamento, portanto, será puro ornamento.
6. Nega-se, por exemplo, qualquer significado e importância ao passado europeu e delira-se num verde-amarelismo de bananeiras e jacas (…) Descobrir nossas alienações dói e mutila. É a tragédia. Súbito, somos filhos abandonados, obrigados a vencer por conta própria. Uma significação que venha do exterior para conferir dignidade a nossas tarefas é como uma receita – impede-nos todos os riscos e nos concede a paz reconfortante de uma mãe onipresente. Ou, noutro extremo, somos bugres. Pelados e verde-amarelos a correr pelo mato. (Roberto Gomes)
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