Nesta segunda-feira de outubro, com um sol ameaçando derreter o que ainda sobra dos flamboyants, deparei-me com o Mendigo K num boteco, paralelo à W3, meio puteiro, meio asilo, onde a mendigada costuma ir jogar sinuca e comer moela e coração de galinha no palito, enquanto o mocotó não fica pronto... Digo meio puteiro, mas não nego que há ali um aroma de almíscar no ar e um visível esforço da proprietária (uma senhora com sinais de vertigem permanente nos olhos) em dar um clima de família ao ambiente. Pendurado na parede, por detrás do balcão (por exemplo), um quadro de meio metro quadrado de Santa Bárbara assiste a tudo, numa boa...
O Mendigo estava lá, numa mesinha minúscula com sua esposa, com quem discutia, às vezes cochichando, outras vezes até em voz alta. Ela, mais viva do que uma jararaca, quando me viu, tratou de baixar a voz e sair por uma portinhola dos fundos e ele, percebendo que eu havia percebido a encrenca, colocou-me a mão no ombro e, com bafo de cigarro misturado a café e à cachaça, "aconselhou-me": Bazzo, em questões amorosas não há meio termo. Ou você assume uma postura de babaca e de trouxa ou de canalha... Não existe (como queria Lao Tsé), o TAO, o tal Caminho do meio!
Como detectou minha surpresa, para convencer-me, agregou: e isto não sou apenas eu que estou dizendo, foi dito até mesmo por Cristo. E citou: SEJAM QUENTES OU FRIOS! CUSPIREI OS MORNOS... (chegando em casa e revisando o Novo Testamento, com todas as trapaças que nele foram agregadas pelos gregos e depois pelos romanos), encontrei no Cap III, Versículo 16 do Apocalipse a tal subversiva e ameaçadora frase daquele palestino imaginário: "Seja quente ou seja frio, não seja morno que eu te vomito (...) Assim, porque és morno, e não és frio nem quente, vomitar-te-ei da minha boca...."
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