quarta-feira, 28 de julho de 2010

Finalmente proibiram as touradas na Catalunya. Nuestros saludos a los toros y a los catalanes...

Uma imitação bufa dos teatros gregos e dos coliseus romanos?
Os vendedores de bilhetes, os fiscais, os administradores, os chefões dessa carnificina têm todos o perfil clássico do submundo. Duvido que tenham lido um livro na vida e que algum deles tenha perdido uma noite de sono tentando abrandar algum problema da cultura. Analfabetões como ocorre nos estádios de futebol ou como nos guetos de pugilistas. Que alguns intelectuais tenham feito elegias a essa barbárie e a essa ralé não significa nada. Em seu Colóquio con Garcia Lorca, tratando das touradas e do horror que elas normalmente causam aos estrangeiros, até Papini chegou a colocar estas palavras na boca do poeta andaluz:

“Não todos os estrangeiros são tão imbecis, mas a maioria dos que assistem o espetáculo de nossas corridas sentem simultaneamente atração e asco. Isto se deve ao fato de que normalmente são viajantes filisteus e que, mesmo quando se trata de pessoas cultas, carecem do verdadeiro espírito poético. Estou escrevendo um poema sobre Ignacio Sánches Mejías, um de nossos toureiros mais famosos, e espero fazer essa gente comprender a beleza heróica, pagã, popular e mística que existe na luta entre o homem e o touro”. 

Dizem-me que no subsolo, há um pequeno museu, com um desenho de Cocteau, a Capa rosa de Picasso e uma reprodução do touro que, em 1947 matou o famoso Manolete. Os turistas vão chegando, uns eufóricos, outros visivelmente intimidados, dando ao lugar o alarido típico das feiras e das zonas. Como os ecologistas lançaram sobre os apreciadores desse espetáculo e dessa epifania bovina os adjetivos mais grotescos e os palavrões mais escatológicos, muitos deles se disfarçam e quando voltam para seus países mantêm em segredo essa «aventura», como se, de alguma maneira, se sentissem até responsáveis pelo assassinato dos touros. Domingo. Dezenove horas em ponto. As arquibancadas estão lotadas. Começam os rituais. O presidente dá o sinal de entrada. Vai iniciar o Primeiro Terço. Bandas, gritos, correrias, portões que se fecham. A troupe de matadores já se exibe na arena, um «não-sei-quê» de afeminado, com calças ridículas e apertadas que lhes salientam as nádegas e os genitais. Ainda não vi o touro, mas já torço por ele. Nas arquibancadas os vendedores de bebidas, chapéus, fotos de toureiros e de postais se apressam. Cada idiota puxa sua câmera fotográfica, seu binóculo, sua filmadora. É necessário registrar a espada enterrada no corpo do touro ou, por que não, os chifres do animal estraçalhando o corpo do toureiro. Sinto que desejaria imensamente assistir a uma tormenta de chifradas, de coices e de imprevistos. Penso involuntariamente em Apis, o touro sagrado dos egípcios. Quando um touro morria e era «entronizado» um novo, era dado às mulheres apenas um período de quarenta dias para visitá-lo. Durante essas visitas elas levantavam as roupas e lhe mostravam a vulva. Penso no touro de Minos que, por uma artimanha dos deuses, teria enrabado Pasifae. Penso nos touros de minha infância, que trepavam com sete ou oito vacas no mesmo dia; nos testículos desse animal que a peãozada toda comia achando que havia neles propriedades afrodisíacas. Enfim, parece impossível dissociar historicamente esse animal da sensualidade e da volúpia. Quando teriam iniciado as touradas? Os mouros as teriam trazido para a Espanha e esta as exportado para o México, Colômbia e etc? Não tenho a mínima idéia. Só sei que esta idiotice começou aqui, lá pelo século XIII, com as corridas de rua. Naquela época, já que ninguém escapa ao fatalismo de sua idiotice, até os nobres e os reis faziam parte do espetáculo. Depois foi sendo deixado novamente para a plebe. Entre todas as idiotices que os portugueses levaram para o Brasil estava também esta. Lá pelo séc. XVII, durante as cavalhadas de Salvador, era comum ver touradas que duravam até três dias. Normalmente o sujeito toureava de cima do cavalo e o touro tinha a ponta dos chifres aparada. “Já na pré-história  - diz Lormier - o touro era venerado por sua potência e sua força, era respeitado como o símbolo solar da prosperidade e da fertilidade. (...) Nas civilizações da antiguidade, diversos hinos religiosos mencionam o Deus-Touro. No Egito antigo, 3500 anos a.C. é generalizado o culto do rei-Touro. Os hititas, 2000 anos a.C fazem do touro o primeiro de seus deuses (...) O touro é também um signo solar na astrologia e tem um significado importante no cristianismo.”Os dois mal encarados que me venderam os bilhetes na rua fumavam como loucos e pareciam ciganos. Os ciganos que Lorca, num surto lirico tanto elogiou em seu Romancero gitano.“El gitano es lo más elevado, lo más profundo, más aristocrático de mi país, lo más representativo de su modo y el que guarda el ascua, la sangre y el alfabeto de la verdad andaluza y universal..”.Verdade ou apenas a velha, frívola e conhecida tapeação dos intelectuais para com os fodidos e condenados da terra? Pelo menos os espanhóis de hoje, esse povo que até bem pouco tempo jogava gatos amarrados nas fogueiras de São João, não pensam e não sentem nada disso a respeito dos ciganos. Pelo contrário, se pudessem, os mandariam de volta para o país idílico e imaginário de onde vieram ou instalariam uma nova Treblinka para eles em algum rincão espanhol.

O portão é aberto e um touro mais preto que o azeviche entra em fúria, olhando para todos os lados, dando pequenos saltos como se fosse levantar vôo. Elege uma das bandeiras rosas e dispara contra ela. De seu nariz já escorre um líquido fumegante. Defeca, como se estivesse literalmente cagando para o mundo. Os toureiros se protegem atrás de paredes de cimento e de superstições... Ele ameaça enfiar os chifres no concreto, mas recua... Não é bobo. Os toureiros se exibem. Passos ensaiados para cá, passos ensaiados para lá. Parecem galos de briga depenados. O touro fecha os olhos e se lança sobre a capa vermelha. Não acha corpo algum. Derrapa na areia. Defeca. Dá uma rápida olhada para a platéia. Gritos. Silêncios. Cheiro de merda e de suor. O rabo para cima. Oitocentos quilos de ódio e de fel. A língua para fora. De sua pica escorre um jato de sêmen. Admiro-o por não ter vergonha de suas excrescências… Alguém das arquibancadas pede que o toureiro lhe corte as orelhas. La oreja... la oreja... la oreja.

A linguagem das touradas é quase tão hermética e tão cheia de signos, significados e significantes quanto à dos lacanianos. Para decifrar o artigo intitulado Oreja de Consolación que saiu no jornal do dia seguinte, sobre o desempenho dos toureiros, dependi da boa vontade da camareira do hotel. «rodilla en terra»; «incorrección del site»; «pasaportar al novillo devuelto»; «danzó por delante en en amago de cite al natural», etc, etc.

Nova investida. Os chifres passam a um milímetro das tripas do toureiro. Gritos. Assobios. Aplausos. Uma pequena interrupção para que entrem os dois cavalos, protegidos nas laterais por uma couraça e com vendas nos olhos. O touro se lança sobre um deles, enfia-lhe as duas aspas com tanta fúria que o levanta da areia. O cavaleiro, por sua vez, em seu exercício de crueldade, mete-lhe o arpão no pescoço e o cavalo permanece indiferente, como se não tivesse a mais mínima idéia daquilo que estava acontecendo. Torço cada vez mais para meu herói negro e solitário, mas percebo que já está entregue. Num novo assalto contra o cavalo caí de joelhos... Gritos, xingamentos... É evidente que para o touro esta é uma luta perdida. A organização do espetáculo não permitiria qualquer possibilidade de vitória para ele. Desfilar pela arena com o toureiro espetado nos chifres se esvaindo em sangue seria o fim. Soçobrariam os negócios, o sindicato dos toureiros e o pessoal dos Direitos Humanos iriam a ONU pedir providências. As poucas vezes que houve uma chifrada fatal foi mais por negligência da equipe do que por bravura do touro. Goya desenhou exaustivamente essa barbárie e Lorca a cantou em poemas e em prosa. Picasso e outros espanhóis, apesar do folclore cult que pesa sobre eles, não passaram imunes a esse costume sanguinolento. Rafael Guerra, conhecido por «Guerrita» organizou em 1896 uma espécie de tratado, em 5 vol. sobre a tauromaquia. E um tal de Pascual Millán, em 1888 escreveu em 258 páginas Escuela de tauromaquia de Sevilla y el toreo moderno, o que significa, em última instância, que essa loucura vem de longe. 

O homem obeso, sentado ao meu lado, faz um esforço enorme para ver as horas em seu relógio de bolso.

-Já se pasaron nueve minutos! Resmunga para si mesmo. E quando percebe que estou olhando para seu relógio acrescenta: un regalo de mi mujer. Disfarço o riso ao lembrar da frase de um gurú indiano que previnia: 

“nunca presenteie alguém com um relógio de bolso, porque isto simplesmente significa que você tem como certo que esse homem está acabado. O relógio é seu último presente e lhe servirá para saber quantas horas faltam para o sol se pôr...” 

Acredito que já se foram outros nove minutos. Um dos matadores lhe crava certeiramente duas «puyas», de onde, como de um vulcão, jorram dois jatos de sangue. Psicologicamente já está derrotado e a platéia pede agora que o matador cumpra seu papel metafísico. Outros dois dardos. Outros dois jatos de sangue. Um mugido que causa estremecimento na platéia. Os fotógrafos preparam as câmeras, as mulheres tapam os olhos, o toureiro coloca em cena os movimentos ensaiados por mais de mil vezes diante dos espelhos. Narcisista e vaidoso de merda! Prepara a espada. Para mexer com a histeria da platéia, dá as costas ao touro que treme estático. Não entendo por que não o ataca agora. Tem dois chifres mais eficientes que qualquer espada. Poderia acertar-lhe os rins, a coluna, os pulmões, as costelas e acabar de maneira trágica com este espetáculo. Mas não atua. Decepciona-me. Depois de tantos anos, talvez já haja uma submissão genética nesses animais, uma ética e, por que não, até mesmo um forte instinto de morte. (No sentido freudiano, de ser atraído pelo próprio fim, pela desconstrução de si mesmo, uma espécie de fascínio diante da possibilidade de «deixar de ser», de ver cada osso, cada órgão e cada célula desintegrar-se no nada, quase uma vingança contra o porvir, contra todas as esperanças e contra a vida.) 

“Uma hora após a morte – escrevia o narigudo Bergerac, em La mort d’Agrippine -, nossa alma (a alma do touro) desfeita será o que foi uma hora antes da vida...” 

A multidão suspira. Aquele homenzinho estúpido se coloca agora diante do animal com a espada na posição do ataque. O touro parece hipnotizado e disposto só a seguir às orientações do amo. Este lhe diz alguma coisa, obriga-o a atacá-lo pela última vez... O touro obedece e recebe no corpo exausto a estocada final. Um palmo de aço enfiado em seu dorso. Urra, corcoveia, defeca, olha para a platéia perde visivelmente a moral, toma consciência de que aquela era realmente sua última tarde de maio. Palmas, assovios, gozos secretos na platéia. Os sádicos se agitam, tagarelam, parecem exorcizar naquele ato os próprios crimes e as próprias culpas. Aquele corpo, uns dez quilos a menos, desaba. O toureiro levanta os braços, dá uma corridinha afeminada ao redor da arena, se exibe para a platéia. As mulheres atiram-lhe chapéus, «pañuelos blancos», flores, camisas e outros objetos que ele recolhe, dá um beijo e os lança de volta, ao léu. Esse frenesi feminino não parece ser para o «macho» como todo mundo sempre pensou, mas pelo que a platéia identifica que há de feminino e de cruel nele. Um açougueiro se aproxima do touro agonizante e lhe enfia várias vezes uma faca na nuca. É a apoteose, o consummatum est, «el momento profundo, sublime, y hasta diré casi sobrehumano, del sacrificio taurino». Em outras palavras: o momento de máxima crueldade. 

"El hombre - segue Papini - debe matar los elementos taurinos que hay en él: la adoración de la fuerza muscular agresiva y de la fuerza erótica, igualmente agresiva". 

A fanfarra reinicia sua marcha wagneriana, as arquibancadas se agitam e comemoram «la victoria de la virtud humana sobre el instinto bestial», enquanto entram na arena as três juntas de mulas cuja função é arrastar o cadáver pela porta dos fundos. E a mesma história se repete seis vezes. Sempre com touros andaluzes, pretos e da mesma raça transgênica, criados especificamente para esse fim. Deixei as arquibancadas com uma indignação contida e cantarolando a música (La corrida) de Francis Cabrel sobre a tremenda idiotice dessa exibição criminosa:

“... Si, si hombre, hombre / baila /”. Hay que bailar de nuevo / y mataremos otros / otras vidas, otros toros / Venga, venga a bailar...”

http://www.youtube.com/watch?v=SjgrOnfTrfs&feature=related

Ezio Flavio Bazzo

domingo, 25 de julho de 2010

A luta permanente e de cada dia para não transformar-se num serial killer...

Exatamente nesta semana que fui ao lançamento do livro do Julio Cabrera intitulado Diário de um filósofo no Brasil, deparei-me com um sujeito estranho nas proximidades do Ministério da Fazenda, um homem que dizia, sem modéstia alguma, ser um bom atirador, um filósofo da pistola e um livre pensador. Uma camisa branca de mangas longas, abotoada até o colarinho e caída sobre uma calça cáqui dava-lhe o aspecto típico de um matador centro americano. 

-Buenos dias, señor! Cumprimentou-me.
-Buenos dias! Respondi-lhe e, curioso, indaguei:
-Que haces por estos lados?
-Buscando inspiración y fuerzas para no transformar-me num serial killer! Vociferou.

Fiquei meio atordoado com sua resposta e tratei de cair fora o mais rápido possível. Depois, pensando com imparcialidade sobre as palavras daquele forasteiro concluí que o papel da cultura e da civilização sempre foi exatamente este: sufocar ao máximo nossas pulsões e impedir que nosso instinto de serial killer se manifeste, pelo menos com a mesma intensidade e frequencia de outrora...


Ezio Flavio Bazzo

sexta-feira, 23 de julho de 2010

Odiar-nos a nós mesmos como odiamos a nosso próximo...

Acabo de receber mais um convite para filiar-me a um partido, em anexo, veio o nome de dois candidatos, as metas e a tal plataforma de campanha. A primeira pergunta que me veio em mente foi: Quê porra é essa de Plataforma de Campanha? Depois, com calma, fui ver as promessas político/sociais desse partido, de seus respectivos candidatos e de mais meia dúzia que estão no páreo. Nada, absolutamente nada transcendente, tudo rasteiro, tudo relacionado ao estômago e as neuroses do rebanho. Desde que nasci os ouço divagar sobre o mesmo mar morto, isto é, sobre a mesma trilogia: educação/saúde/trabalho. Entretanto, a educação continua uma miséria, a saúde continua uma miséria e meia e o trabalho segue sendo uma semi-escravidão. Penso que talvez eu até me dispusesse a votar num sujeito que tivesse como objetivo único e absoluto, o controle da natalidade. Há muita gente na cidade, no continente e no mundo. E pior, gente estranha, bizarra, que nunca vi, que se olha atravessado e que se esquarteja por qualquer ambigüidade ou por qualquer rixa e que quer, antes de tudo, foder-se mutuamente. Os presídios, os bordéis e as igrejas já funcionam a quatro turnos. Os ônibus vão entulhados, os aviões passam por cima de minha casa com gente dependurada nas asas, as filas dos mercados chegam às calçadas, centenas de pessoas esperam semanas e meses nas filas dos ambulatórios, há milhares apodrecendo nas ruas, há que se copular e os motéis funcionam com lotação máxima 24 horas por dia e as maternidades, mesmo com a “cesariana” popularizada não dão conta de tantos descendentes... Na confeitaria da esquina faltam mesas e os viciados em açúcar se aglomeram como moscas, os esgotos entopem, falta água e a pressa vai agindo malignamente sobre os nervos do formigueiro. Somos uns duzentos milhões só do lado de cá das fronteiras, se um dia voltarmos a ser uns trinta, quem sabe, poderemos até idealizar novamente alguma forma, mesmo que esdrúxula, de felicidade... 

Ezio Flavio Bazzo

quarta-feira, 21 de julho de 2010

A ARTE DE FUCINHAR SOBRE AS PRÓPRIAS PEGADAS...

Sinto um prazer especial em voltar a folhear aqueles livros que li há algum tempo e reler aquelas palavras, frases, parágrafos ou páginas inteiras que sublinhei, rabisquei, coloquei entre aspas ou ao lado das quais plantei uma imensa interjeição. Fiz isso ontem a noite com as 997 páginas do CAHIERS (1957-1972) de Cioran e selecionei estes despretensiosos pensamentos:



-A diferença entre o teórico da religião e o crente é mais ou menos como a que existe entre o psiquiatra e o louco.
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-Eu tremo de horror quando ouço alguém dizer minha mulher. Sou um sujeito metafisicamente celibatário.
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-A situação do cético é menos confortável que a do demônio.
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-Todo mundo me pergunta: Que fazes atualmente? Quando sairá um novo livro? – É incrível a que ponto a necessidade de publicar se incorporou aos costumes. E somos obrigados a tal se não quisermos passar por palermas. Mas é necessário não ceder.
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-A desaparição dos animais, ou melhor, seu aniquilamento, é um ato de uma gravidade sem precedentes. Seus verdugos invadiram literalmente a paisagem e não existe mais lugar a não ser para eles. Que tristeza de ver um homem lá onde a gente poderia contemplar um cavalo!

segunda-feira, 19 de julho de 2010

O uniforme dos presidiários de Minas e os sannyasins de Rajneesh...

Todo mundo que viu a cor do uniforme dos presidiários de Minas Gerais lembrou imediatamente de Rajneesh (o Osho) e de seus sannyasins. Em Brasília e no Brasil lá pelos anos 70/80 o guru indiano foi uma febre. Dezenas de amigos e conhecidos abandonaram tudo por aqui, pegaram uns dólares e as mochilas e se mandaram para seu Ashram de Puna, Índia, próximo a Bombay e não muito distante das praias de Goa. Voltavam meses ou anos depois (uns nunca mais deram as caras) com idéias, esperanças, aromas nome e roupas diferentes. Sempre que encontravas alguém vestido de marron/laranja levando um colar ao pescoço e com um nome esquisito já sabias que estavas diante de um sannyasins. Hoje, curiosamente, não se vê mais quase nenhum por aqui. Li dele quase tudo o que me caiu nas mãos. Foi, com certeza, o charlatão mais fantástico, mais lúcido e mais interessante que conheci. Morreu em 1990. Sua biblioteca e sua “paixão”pelos livros fariam inveja a qualquer um dos intelectualzinhos arrogantes de nossas universidades (vejam vídeo no endereço abaixo).

sábado, 17 de julho de 2010

O goleiro bruno cercado de piranhas vorazes por todos os lados e o velho Giacomo Casanova...

Pelo que noticiam sobre as aventuras sexuais e a vida íntima do ex-goleiro do flamengo, somos obrigados a admitir que o famoso veneziano Giacomo Casanova que jurou ter “comido” 122 em toda sua longa existência, se comparado a nosso guarda-redes e "herói" de tantos energumenos, não passou de um pobre panaca. E por falar em goleiro, como é possível que exista a profissão de “goleiro”? De centroavante? De ponta esquerda? De volante? Zagueiro? De juiz de futebol? Prestem atenção. E mais, como é possível que esses cretinos analfabetos, junto às “modelos”, faturem salários mensais que, de tão colossais, nenhum outro profissional (cientista, profeta ou gênio) jamais se atreveu a idealizar para si? E isso, com a cumplicidade rasteira e sórdida do resto do rebanho este, mergulhado no mais absoluto mutismo enquanto rumina suas migalhas. Em algum lugar Fernando Pessoa escreveu sobre a miséria interior de seus patrícios algo que serve também para a nossa: 

[Somos incapazes de revolta e de agitação. Quando fizemos uma «revolução» foi para implantar uma coisa igual ao que já estava. Manchamos uma revolução com a brandura com que tratamos os vencidos. E não nos resultou uma guerra civil, que nos despertasse; não nos resultou uma anarquia, uma perturbação das consciências. Ficamos miserandamente os mesmos disciplinados que éramos. Foi um gesto infantil, de superfície e de fingimento...]

Ezio Flavio Bazzo

quinta-feira, 15 de julho de 2010

Charles Chaplin e a Décima Primeira Conferência sobre a mulher latino-americana e caribeña

Começou ontem aqui em BsB a Décima Primeira Conferência sobre a mulher latino-americana e caribeña. Umas 300 delegadas (não poderiam ter arranjado uma denominação menos policialesca?) de trinta e tantas nações fazem parte do evento. Pelo que tenho visto, os papos trazem a mesma melancolia dos anos 60: a “igualdade de gênero”, a "padronização dos salários", "soberania" sobre o corpo e sobre a natalidade, uma "melhor divisão de trabalho" controle da violência doméstica etc, etc. Tudo isso, e o bem estar em geral - segundo essas idealistas companheiras – poderia e deveria estar sob a responsabilidade do Estado, do Mercado e da Família. Ora, isto é uma visão servil e antihistórica. Só podem ter enlouquecido de vez, pois está mais do que claro que foi exatamente o Estado, o Mercado e a Família (com orientação da igreja) que ao longo da história e durante séculos as mantiveram infantilizadas, frigidas, subjugadas e de joelhos como escravas...

Bem que suas reivindicações poderiam ser mais ou menos assim:

1. Não nos falem mais em "igualdade de gênero". Odiamos essa idiotice cult. Não queremos ser iguais a ninguém e a nada. Pelo contrário, lutaremos cada vez mais pela incrementação da desigualdade e da diferença, não apenas com relação aos homens, mas entre nós mesmas...

2. Também é estúpida a reivindicação de “padronização de salários”. Queremos ganhar muito mais. Se os homens aceitaram a miséria que ganham e o desespero em que vivem, isso é problema deles. Nossa mão de obra e nosso saber não podem ser trocados pela misericórdia nem de um patrão e muito menos de um Estado... Aliás, nossa meta verdadeira é ver-nos livres do trabalho, dessa escravidão mesquinha o mais rápido possível... Uma civilização que em vinte e um séculos ainda não se livrou do trabalho tem que questionar seriamente o sentido de sua própria permanência...

3. Ficar resmungando sobre “soberania” a respeito de nosso próprio corpo é pura demagogia. Sempre fomos soberanas nesse particular. O homem, mesmo que quisesse, não poderia e não saberia como sufocar-nos. Para que tenham uma idéia, só descobriram que tinhamos um clitóris há menos de um século! É ridícula a idéia de que precisamos de leis e da polícia para defender-nos. Qualquer uma de nós sabe que poderemos livrar-nos de eventuais bandidos, de nossos tiranos e de nossos verdugos com a maior facilidade... E a respeito da maternidade, aquelas que não quiserem ter filhos que não os tenham em definitivo, ou então que tenham um ou dois, no máximo, mas chega de parir como vacas e de passar o resto da vida resmungando que foi pressão do companheiro, dos espíritos ou do Papa. Do contrário, os homens e até algumas mulheres seguirão pensando e sentindo por nós o que sentia e pensava o genial Charles Chaplin: "Amo, tenho tesão pelas mulheres, mas não as admiro".

4. Enfim, que seja Mesalina ou Joana D’Arc e não Madre Teresa de Calcutá nossa heroína. Chega desse papo idiota a respeito da incompatibilidade, da disputa, da exploração sexual, da divisão de trabalho, etc. E que a sociedade organizada saiba, de uma vez por todas, que muito mais que a pílula ou que a máquina de lavar, o que realmente foi revolucionário em nossa existência foi a invenção do vibrador.

Ezio Flavio Bazzo

quarta-feira, 14 de julho de 2010

Não fale mal dos crocodilos antes de ter atravessado o rio...

Nem mesmo uma Delegacia de Polícia consegue ser mais melancólica e mais mórbida que um Pronto Socorro. Neste final de semana a comida de um dos milhares de restaurantes da cidade (onde não se tem o hábito e nem a obrigação de lavar-se as mãos) obrigou-me a recorrer a um deles em plena madrugada. A recepção e o acolhimento (todo mundo já sabe) são mais que precários (se esses atendentes fizessem um estágio nos bordéis da periferia – me cochichava um paciente - as coisas já melhorariam, e muito). O médico que me atendeu não quis saber de minha pressão, nem de minha temperatura (o que tratava de minha bisavó lá no século passado checava-lhe até o pulso). Duas horas e vinte naquele ambiente. De vez em quando encostava um táxi ou uma ambulância trazendo alguém alquebrado, mancando, lívido e contorcendo-se em dores reforçando a idéia de que se nosso corpo é nosso único capital o é também nosso único mal. Diante da dor, é até compreensível que os primitivos tenham engendrado (como analgésico) a crença num “espírito”, numa “alma”, em algo além dos ossos e das glândulas. Um senhor que acompanhava sua neta chegou apressado solicitando à “enfermeira” um vomitório ou uma vomitadeira (até os acampamentos greco-romanos dispunham desses utensílios), ela sugeriu-lhe solenemente que usasse uma lixeira.

-Uma lixeira? Pago 600,00 reais por mês para ter que enfiar uma lixeira na cara de minha neta? Resmungou indignado enquanto buscava com seus olhinhos de cólera a minha solidariedade. Fiquei em silêncio respeitando a conhecida máxima dos xamãs africanos: só fale mal dos crocodilos depois de ter atravessado o rio.

O médico me prescreveu o de sempre: um antibiótico, um soro e um analgésico. Descobri que no Brasil o tal Tylenol é mais popular que a rabada de porco. A noite e a madrugada estavam completamente silenciosas. Saí à procura das farmácias de plantão. Dois travestis e três mulheres apareceram numa esquina querendo vender seus respectivos buracos. E o espírito? Murmurei para mim mesmo sentindo as bactérias devorando minhas entranhas. Das quatro farmácias de Plantão apenas uma estava funcionando. O “farmacêutico” que estava atrás de grades bebendo uma cerveja atendeu-me com desconfiança. Por que, afinal eu não poderia ser mais um dos clássicos viciados em barbitúricos e assaltantes de farmácias?

Enquanto providenciava meus medicamentos seu celular tocou e ouvi a voz de uma mulher perguntar-lhe:

- Doutor minha patroa me mandou tomar um remédio que se chama Annita. O Senhor tem aí e para que serve?
- Tenho sim. Está na moda, todo mundo toma, e sem receita, é para vermes.
- Vermes?
- Sim, combate amebíases, giárdia, lombricóide, ascaris, crysptosporidium etc...

Paguei o equivalente a 35 dólares e meti-me madrugada a dentro com minhas bactérias, minhas cólicas e com meu saco de remédios, os três produzidos por multinacionais. Apesar da demagogia de “soberania” se as Organizações estrangeiras que nos colonizam se retirassem, voltaríamos à Idade da Pedra em menos de seis meses. 

Ezio Flavio Bazzo

sexta-feira, 9 de julho de 2010

UM CRISTO SEXUADO CAUSA NOVO TERREMOTO EM PORTUGAL...

Só o terremoto de 1755 em Lisboa parece ter causado mais estragos que a edição da última PlayBoy portuguesa. Mesmo com um histórico respeitável de anticlericalismo a sociedade e a beataria por lá estão em polvorosa com a série de fotos que misturam nudez e sexualidade com cristianismo. E a repercussão foi tanta que a matriz da revista nos EEUU, num surto de hipocrisia luterana, pretende até cancelar contrato com a filial lusitana. Na revista em questão um dublê de Cristo aparece ao lado de mulheres semipeladas e inclusive assistindo com o maior interesse ao conluio amoroso e libidinoso entre duas lésbicas etc. A idéia de pauta desta revista de punheteiros, segundo os editores, seria apenas "ilustrar" passagens de um dos livros mais mistificados de Saramago, aquele intitulado O evangelho segundo J.C. Mas deu no que deu. Claro que não é de hoje o conflito da humanidade envolvendo sexo, extase e religião. Volta e meia alguém retoma esse assunto através da arte, do cinema, da filosofia ou mesmo na vida real, o que sempre detona nas massas a mesma neurose de angústia, o mesmo espanto e a mesma ambigüidade recheada de libido, culpa e mortificação. Aliás, pode-se dizer que tanto o catolicismo como as outras seitas menores que vieram ao longo dos séculos pisoteando o desejo, o prazer e o gozo, paradoxalmente, não fizeram mais do que incrementar as perversões e fomentar inovações no universo das psicopatologias e da fornicagem. Vejam como as cenas do filme, no endereço abaixo, exploram bem essa temática.

http://www.youtube.com/watch?v=ANXkzIwoKX8

Ezio Flavio Bazzo

quinta-feira, 8 de julho de 2010

Jezabel, Elisa e os Rottweilers...

Enquanto a policia confinava os Rottweilers e procurava pelos ossos de Elisa, dizem que o goleiro do flamengo, já preso, pediu uma bíblia e fez uma oração antes de repousar. O que existiria nesse livro que todos os condenados e os encarcerados pedem imediatamente um exemplar? E mais, como é que os carcereiros sempre arranjam um por lá e com tanta rapidez? Duvido que se pedissem 120 dias de Sodoma ou A Cabala – por exemplo - suas demandas seriam atendidas com tanta presteza. No caso desse crime, dá até para desconfiar que a bíblia tenha servido como inspiração aos assassinos, já que numa de suas estórias Jezabel (princesa fenícia) também é assassinada, defenestrada e comida pelos cachorros. O autor, lamentavelmente, não faz nenhuma referencia ao pedegree dos animais.

Obs: No que se refere a crimes hediondos, aqueles que quiserem se manter atualizados devem andar sempre com o Velho Testamento em baixo do braço.

 Ezio Flavio Bazzo

quarta-feira, 7 de julho de 2010

REFORMA DO CÓDIGO FLORESTAL OU UMA ODE À MOTO-SERRA?

Os ilustres parlamentares da Comissão Especial da Câmara aprovaram com facilidade a reforma do Código Florestal Brasileiro. Agora resta aos deputados e senadores a conclusão desse cinismo. O mais curioso é que o relator desse projeto retrógrado e suicida foi um arcaico e conhecido comunista. Os quatro pontos da reforma que mais fortalecem a teoria da “pulsão de morte” freudiana são: (1). A redução de 30 para 15 metros para as faixas das áreas de preservação permanente às margens de rios com menos de cinco metros de largura; (2). A dispensa de Reserva Legal para pequenas propriedades rurais; (3). A garantia da manutenção das atividades agropecuárias e florestais (leia-se do latifúndio) em áreas rurais consolidadas, localizadas em Áreas de Preservação Permanentes e Reservas Legais, até que o programa de regularização ambiental seja promulgado (isto é, até o dia de São Nunca); e (4). Claro, a suspensão das multas e sanções que foram aplicadas a fazendeiros, ruralistas etc., por desmatamentos criminosos realizados até 2008. Que tal?
 
Os ambientalistas que protestaram hoje aqui em frente ao Congresso Nacional pareciam possuídos por uma ingenuidade e por um idealismo fora do comum, como se não tivessem a mínima idéia de como funcionam as pútridas engrenagens no interior desse parlamento. Seguramente ficariam mais relaxados (ou mais desesperados?) se soubessem que o perfil dos que aprovaram a “reforma” do Código Florestal é exatamente o mesmo daqueles caducos que, no mês passado assinaram uma “petição” para a inclusão de cachaça na cesta básica. (ver vídeo no endereço abaixo)

http://www.youtube.com/watch?v=fmtbqu4VhDs

terça-feira, 6 de julho de 2010

Fiarse de la própia mujer está bien, pero no fiarse está mejor...

Foram divulgadas as Declarações Patrimoniais dos presidenciáveis e de seus respectivos vices. Relacionando a trajetória política de cada um dos candidatos com os capitais declarados chega-se a conclusão de que só pode ter havido um equivoco monstruoso na quantidade de zeros ou então, que nenhum deles está realmente capacitado e apto para lidar com dinheiro e muito menos com finanças. Ou será que, coincidentemente, todos se deixaram guiar pelo antigo provérbio que dizia: [Fiarse de la própia mujer está bien, pero no fiarse está mejor]?
Por mais policialesca, moralista e controladora que venha a ser essa desvairada sociedade ela  terá que lidar sempre com um detalhe bizarro de nosso caráter: sobre sexo e dinheiro ninguém diz a verdade.

segunda-feira, 5 de julho de 2010

NÓS NÃO TEMOS NADA CONTRA O PECADO, NOSSA CISMA É CONTRA OS PECADORES...

Para encher lingüiça em sua programação fajuta de todos os dias e para tentar manter o rebanho conectado a mídia tem convocado especialistas de todos os matizes para explicar as razões que levaram “nossa seleção” a se escafeder depois do primeiro gol e na eminência da derrota. Consultaram neurologistas, psicanalistas, mães de santo, psiquiatras, antropólogos etc, estranho que não tenham querido saber a opinião dos veterinarios e muito menos dos pedagogos. Ora, um sóbrio jogador alemão já havia feito o diagnóstico do caráter dos jogadores sul americanos três dias antes da derrota fatal tanto do Brasil, como da Argentina e do Paraguai: basta um obstáculo – dizia ele - e pronto, se desorganizam mentalmente. O pior é que é verdade e que essa fragilidade não se resume apenas ao universo dos esportes. A falta de ”substância”, a “mediocridade generalizada”, o abismo entre a pose-do-sujeito e o sujeito-da-pose têm tudo a ver com essa realidade de quarta categoria com a qual os latino americanos em geral e os brasileiros em particular se digladiam cotidianamente. É evidente que as origens desse transtorno e desse complexo de cagão estão lá no Primeiro Grau. Muita reza, muita lengalenga, titia pra cá e titia pra lá e nada de Descartes. Até nossos jogos que deveriam ser laicos parecem retiros de macumbeiros, evangélicos ou de seminaristas! Ver aqueles ignorantes agradecendo a deus depois de um chute ou de uma cabeçada é mesmo para sentir ânsias.. Ah, mas e o Segundo Grau? O segundo grau? Pesquisas recentes demonstraram que é apenas o aperfeiçoamento da farsa e do vazio do Primeiro.
 
E as evidências de que lá na Argentina e lá no Paraguai, neste particular, as coisas não são diferentes foram as promessas tanto do Maradona como de uma badalada modelo paraguaia de que iriam desfilar pelados pelas ruas se suas respectivas seleções vencessem. Sinceramente, alguem sabe o que tem a ver o rabo e a xota com uma copa do mundo? E depois, aqui entre nós, a paraguaia ainda vai, mas aquele monstrengo...