domingo, 21 de abril de 2019

A páscoa, os chupatintas empanturrados de cachaça e de chocolate... e a tempestade...


"...Em verdade, em verdade vos digo que eu sou a porta das ovelhas.
Todos quantos vieram antes de mim são ladrões e salteadores..."

João 10:7-9

Pela tempestade que despencou sobre Brasília há meia hora atrás, parece que os deuses não ficaram muito satisfeitos com as missas, os sermões, as promessas, as chocolatadas e as churrascadas promovidas por todos os lados da cidade, tanto ali nos bairros dos chupatintas (R. Arlt) como nas periferias mais fodidas, em homenagem à ressurreição de Cristo. Ou foi o próprio Cristo que resolveu mandar um recado a esses energúmenos?
Meu cortiço só não ruiu porque o vento mudou de lado! Quem deixou as janelas abertas e foi comemorar, encher a cara com a famiglia, é bom que ao voltar já tragam um barco salva vidas e dois ou três metros de lona, daquela preta que os Sem-Terras usam na beirada das estradas para proteger suas tocas...
Durante as lufadas que vinham de baixo, de cima e de todos os lados, se via em cada janela duas ou três velhinhas angustiadas só de anáguas com seus varões aposentados com velas acesas, com rodos e com escapulários tentando estancar as cachoeiras que se infiltravam pelas canaletas das vidraças e até pelas paredes, essas paredes falsificadas. Aliás, como já disse outras vezes, esta cidade foi tão sucateada que um terremoto de 4,5 colocará tudo por terra... E havia raios no meio das lufadas. Um deles fez estalarem as tomadas de minha casa, (também sucateadas). Se a Catedral de Notre Dame (com toda obsessão dos franceses) foi realmente queimada por um curto-circuito nós, se ainda não viramos churrasco foi por puro milagre!
O prédio tremeu! Ou foi um princípio de labirintitis?
Protegi meus livros. Principalmente a prateleira onde estão os clássicos anarquistas. Um Kropotkin escapou-me das mãos, deslizou junto ao rodo e mergulhou numa poça em baixo da mesa. Pensei em São Cipriano. Quando criança, em dias de dilúvio como este, o vilarejo inteiro queimava ervas bentas e lia em latim e em voz alta a São Cipriano (um charlatão de Cartago que foi transformado em bispo e mais tarde em Santo). Sim, era um bruxo, um feiticeiro, mas os padrecos de então mal sabiam ler e não tinham preconceito com a África.
Depois de uma meia hora com os porteiros correndo histericamente em baixo dos prédios e os bombeiros andando por aí fazendo alarde com suas sirenes.., tudo foi se acalmando, se acalmando, se acalmando... quase como no final de um orgasmo...
E por falar em orgasmo, hoje estão comemorando também o 59 anos de Brasília. 
A cantora Anita devia apresentar-se na esplanada e exatamente na hora da chuva.. Quem é que não gostaria de vê-la lá com um vestidinho de setim branco cantando e rebolando no meio da tempestade!? 

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