domingo, 14 de janeiro de 2018

Brasília e seus vendavais...

"Quando os antropólogos chegam, os deuses vão embora!"
Provérbio haitiano
(observação: devia ser realmente assim, mas só até antes dos antropólogos terem sido vergonhosamente cooptados pelas igrejas e se tornado cúmplices dos padres...)

Brasília assistiu ontem uma bela demonstração de exuberância e de soberba da natureza: ventania, raios, pedras de gelo, chuva na vertical e na horizontal, trovões, pedaços de árvores levitando por sobre as avenidas, esgotos transbordando, sem teto e bêbados correndo de uma marquise a outra arrastando seus trapos e do meio das nuvens um flash atrás do outro como se uma divindade ou um demônio sádico estivesse querendo fuzilar alguém e ao mesmo tempo registrar tudo, fazer um ensaio fotográfico de nossa miséria, desde a indiferença dos alienados até o desespero dos maníacos... Meu cachorro postou-se junto à vidraça e assistiu com um indisfarçável prazer e fascínio aquela espécie de dilúvio. Quando pipocava um relâmpago, seguido da explosão de um raio, ao invés de jogar-se no chão, bocejava, quase em desafio a todo aquele exagero de exibicionismo. Uma velhinha que atravessava os jardins lá em baixo quando viu seu guarda-chuva ser despedaçado, quase perdeu o equilíbrio, fez o sinal-da-cruz e soltou involuntariamente o grito clássico: Meu Deus! 
No prédio vizinho alguém caminhava de lá para cá com uma vela na mão direita e na esquerda com uns ramos de arruda ia espargindo água benta pelas paredes... Os postos de saúde e os colégios públicos sucateados desde sempre viram goteiras despencarem dos telhados sobre tomógrafos, escrivaninhas, cadeiras e macas já enferrujadas... 
Apenas por esnobismo literário associei aquela, digamos, tempestade, a um dos terremotos mais violentos já registrados no mundo: o de Lisboa de 1755. Segundo os lusitanos, foi um show de terror nunca visto. Primeiro o terremoto seguido por um tsunami e imediatamente por um incêndio que devorou quase a cidade inteira e mais: a partir daí, por uma querela interminável entre o marques de Pombal e o padre Gabriel Milagrida. O primeiro atribuindo a desgraça a uma causa natural e o segundo, insistindo que havia sido um castigo divino pela vida perversa e pecaminosa que os portugueses estavam levando. Seria aqui entre as nossas negras e índias?
 Marques de Pombal, todo mundo sabe, foi aquele que não só deu um pontapé no traseiro dos jesuítas que infestavam o Brasil, mas que, por malandragem econômica, também proibiu a profissão de ourives. A respeito do tal padre Milagrida, em função de sua insistência em seguir cacarejando que o terremoto de Lisboa havia sido uma vingança divina contra o amancebamento e à libertinagem portuguesa, foi garroteado e queimado na Praça do Rossio em Lisboa...

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