Quando quero ler algo com prazer, volto sempre a Dostoiévski. Hoje reabri as páginas 16,17 do livro Memórias do subsolo. onde se pode ler: "não consegui chegar a nada, nem mesmo tornei-me mau: nem bom, nem canalha, nem honrado nem herói, nem inseto. Agora, vou vivendo os meus dias em meu canto, incitando-me a mim mesmo com o consolo raivoso - que para nada serve - de que um homem inteligente não pode, a sério, tornar-se algo, e de que somente os imbecis o conseguem. Sim, um homem inteligente do século XIX precisa e está moralmente obrigado a ser uma criatura eminentemente sem caráter, e uma pessoa de caráter, de ação, deve ser sobretudo limitada. Esta é a convicção de meus quarenta anos. Estou agora com quarenta anos; e quarenta anos são, na realidade, a vida toda; de fato, isto constitui a mais avançada velhice. Viver além dos quarenta é indecente, vulgar, imoral! Quem é que vive além dos quarenta? Respondei-me sincera e honestamente. Vou dizer-vos: os imbecis e os canalhas. Vou dizer isto na cara de todos esses anciães respeitáveis e perfumados, de cabelos argênteos! Vou dizê-lo na cara de todo mundo! Tenho direito de falar assim, porque eu mesmo hei de viver até os sessenta! Até os setenta! Até os oitenta!... Um momento! Deixai-
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