Apesar de muita gente acusar Euclides da Cunha de ter sido um “vaselina” e de só ter sido tolerado no front de Canudos por fazer o discurso que interessava ao exército e à República (sabe-se de outros repórteres que, por terem outra leitura dos fatos, não puderam permanecer cobrindo o massacre) seu texto é de uma beleza única. Quem ainda não se atreveu a ler Os Sertões deveria fazê-lo.
Curiosa a coincidência de, tanto o Conselheiro como o Euclides terem sido traídos por suas mulheres. Os chifres fizeram do Conselheiro um místico e do Euclides um imortal. Por falar em chifres, não se fala em outra coisa aqui no sertão. Em qualquer papo que se ouça está lá a metáfora com pontas. Um verso recitado por um pedinte ali na feira concluia afirmando que não há família que não tenha pelo menos um corno em seu meio.
É provável que o sexismo e que o machismo brutal dessas regiões seja apenas uma reação desesperada diante da própria deslealdade e um tipo de horror diante da hipótese de ser traído. Aliás, a relação intersexos por aqui (apesar dos aparentes chamegos) parece ser tão progressista quanto aquela dos vilarejos montanhosos do Azerbaijão.
Com a mala posta sobre a poeira da estrada a espera de um ônibus (que talvez já tenha passado) e os olhos mergulhados nos espinheiros de um Xiquexique, tento interpretar melhor a frase de J.J.Audubon que diz: “O autêntico conservador é aquele que sabe que o mundo não é uma herânça dos seus pais, mas um empréstimo dos seus filhos.”
Ezio Flavio Bazzo