quarta-feira, 19 de novembro de 2025

O chauvinismo do chanceler alemão e o nosso...



"É preciso muita força e muito engenho para escapar ao nada..."

Paul Nizan, IN: áden arabia, p.52





Não apenas os moradores de Belém do Pará, mas o país inteiro, parece estar meio perturbado com as declarações do chanceler alemão de que foi um alívio, finalmente, poder "sair daquele lugar" e voltar para Berlim... 

Como era de se esperar, o chauvinismo dele detonou o nosso. Ah,  a pátria! A mãe pátria! A terra natal! As míseras memórias do berço, o lero lero existencial, as ficções a respeito do lado de cá das fronteiras. Os nossos defuntos... Ah! O idioma... a culinária, os botecos, o ópio da nacionalidade, essa necessidade vã de pertencer a um lugar... Essa dificuldade de assumir-se cidadão do mundo e esse nacionalismo cretino que tem envenenado ainda mais a solidão dos terráqueos. Seríamos todos, como se dizia nos anos 70, uns porcos chauvinistas?

E todo mundo se apressou em defender-se da crítica de velho chanceler alemão. O chamaram de colonialista, nazista, preconceituoso, babaca, comedor de chucrute e, claro, o associaram ao autor de Mein Kanpf. A Alemanha, faça o que fizer, dificilmente se livrará do estigma e do fantasma de Hitler, com suas fantasias de um Terceiro Reich... dificilmente se livrará da fumaça das chaminés e dos fornos onde judeus, ciganos, testemunhas de Jeová e etc, se consumiam...

Mas o chanceler em questão, não tem nada a ver com isso. É um pobre septuagenário. E um homem com mais de 70 está sempre apto a mijar nas calças, a falar todo tipo de merdas... e depois, com um nome desses: Joachim-Friedrich Martin Josef Merz... (Como diria Borges: os anos conferiram lhe essa peculiar majestade que têm os canalhas envelhecidos...).

Ao invés de tentar rebater e anular sua fala, seria muito mais interessante para Belém e para o Brasil, ouvir em detalhes, as coisas que mais o desagradaram em sua breve permanência naquela cidade. Quem é que não tem curiosidade em saber?

Teria sido os quase 40 graus com uma humidade de 100%?

O ar condicionado que não condicionava?

O saneamento básico ainda da idade média?

O carimbó?

A velhinha do famoso Ver-o-Peso, que, sempre que o via, insistia em vender-lhe umas ervas para 'pegar macho' e melhorar a ereção?

Ou foi o tal Pirarucú assado, que o comoveu, no meio daquela fornalha de outubro?

Sim, sua crítica foi inadequada, mas é importante lembrar que muita gente tem dificuldade para passar uns dias fora de seu próprio covil. A paranóia aparece do nada e o barulho de um gato, saltando de madrugada, por uma janela lhes parece o ataque eminente de panteras. Ah! A Amazonia idealizada! As borboletas azuis, as raízes, o chá de ayahuasca e as míticas Icamiabas, empoleiradas nuas na copa das árvores... Mas também cheia de monstros, de mistérios e de flechas envenenadas. Os bichos! Os morcegos bebedores de sangue... Hummm! O sangue germânico... o sangue cor de rosa dos arianos, e a herrenrasse...

E depois, é natural que o carimbó pareça uma autêntica loucura para quem nasceu e cresceu ouvindo Bach, Schumam e Beethoven...  E que Paulo Coelho lhes pareça um bobalhão esotérico para quem cresceu lendo  Stirner, Max Nordau, Schopenhauer e Nietzsche... E que uma tigela de Tacacá cause um certo mal estar para quem as salchichas e o chucrute são o Sanctum Sanctorum da culinária... Sem falar da quantidade de igrejas, do próprio nome da cidade e do catolicismo ainda medieval, escancarado nas procissões e estampado em cada esquina, para quem vem do País de Lutero... Ah! Lutero! Ele que recomendava pedacinho da própria merda, pela manhã, para curar-se de problemas neurológicos. Os luteranos! A Reforma! As balelas mafiosas em torno de uma mesma ficção!!! Ah! a melancolia daqueles violeiros, de madrugada, por debaixo dos mangueirais.. e a memória da philarmônica de Berlin... Ah, são tantas as delícias do imperialismo...

Enfim: que tal esquecer as bobagens de sempre, levantadas na tal COP 30 e começar amanhã mesmo, a dotar a cidade em questão, de Saneamento básico?... De que vale salvar a floresta e seguir com as botas mergulhadas num pântano de detritos? Sem falar que obrigar um povo a conviver com seus dejetos é a maior das desonestidades, não só sanitárias, mas também morais... 


 


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