Com
a umidade do ar abaixo de 20% e correndo o risco de ter uma embolia cerebral ou
até mesmo um derretimento do cerebelo, passei umas duas horas lá na Granja do
Torto onde está acontecendo outro encontro anual de motoqueiros. Segundo os
jornais, uns dois mil e tantos e de todo o país. Como não tenho o mais mínimo interesse por esse
assunto, só fui até lá fazer este registro porque parece tratar-se realmente de uma
fauna exótica, de seres que sobraram da pedra lascada, algo como uma
maçonaria de andarilhos, uma legião de piratas sem caravelas, uma cavalaria sem
cavalos em busca do Santo Graal e sem as peripécias formais das cruzadas... Um bando de peregrinos em direção ao santuário da alienação e de solitários interligados pelo
asfalto... ou algo assim... Com seus casacos de couro, suas camisetas, seus
coletes pretos, suas caveiras tatuadas e seus olhinhos infanto-juvenis parecem
ter sido todos engendrados na mesma fornalha e estarem voltando de Woodstock ainda com a cítara de Ravi Shankar ecoando nos miolos... Claro que se fala mais na idílica Rota 66, em bielas e em
turbinadas do que em Heráclito..., muito mais em longos trajetos do que em
longas reflexões filosóficas..., apesar
de muitos, com certeza, terem lido o badalado ZEN E A ARTE DE CONSERTAR MOTOCICLETAS..., também On the Road e, claro, assistido várias
vezes ao filme Easy Rider... Uma cordialidade pra lá de cristã entre eles
próprios e com qualquer forasteiro que apareça por lá. Se estiver com uma
câmera fotográfica ligada então... Por falar em cristã, alguns grupos, pelos nomes, parecem ter se originado em sacristias: Esquadrão de Cristo, Cruz de ferro, Ordem dos cavaleiros de São Jorge, Monges
etc... Apesar das barbas de matusalém de alguns e dos bigodes queimados pelo
tempo e pelo sol das estradas, de outros, parecem, na verdade, uma trupe de adolescentes
exibindo e se divertindo com seus brinquedos... Digamos, uma ludoterapia... Quase todas máquinas potentes, até
umas Harley-Davidson, umas inteiras em inox, outras cromadas, outras de ferro
bruto, outras de três rodas e cada uma com o símbolo da confraria ou do clube a
qual o piloto pertence. Contei mais de cinquenta e, curiosamente, 99% delas com
nomes de animais: Bodes do asfalto; Asas de águia; Os lobos negros; Aranhas do
asfalto; Cupim de ferro; Falcão peregrino; Abutres; Os boca de porco etc.
Também havia pelo menos três confrarias femininas: Divas insanas; Medusa e
Bruxas. Dificil negar que no ar seco da tarde levitava alguma coisa derivada do tédio... Apesar de em telões aqui e ali Pink Floyd e o rock in rol já estarem comendo solto, nenhum
cheiro da erva dos anos 60. Ou lhe retiraram geneticamente o odor ou já é coisa
do tempo dos dinossauros. A cerveja sim! Cada um, homens e mulheres, exibia sua
lata como se fosse um troféu, um signo de sapiência e de adaptabilidade. Não me canso de tentar entender como foi possível
viciar tão facilmente o estômago e as tripas da humanidade com essa beberagem desprezivel.., com essa espécie de urina enlatada...
Só existe UMA cerveja possível: Heineken. O resto é urina enlatada mesmo.
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