terça-feira, 2 de setembro de 2025

Terça-feira... O dia amanheceu meio misterioso com os saltimbancos de sempre armando as lonas do circo lá ao redor do Supremo Tribunal Federal...


O surrealismo é tal, que "Se me acusassem de ter furtado as torres de Notre-Dame, eu trataria logo de me esconder..."

Achille de Harlay





A estagiária, quase excitada, liga para a mãe, dizendo que, nesta semana, estará cobrindo o Julgamento do Século! Que, pela primeira vez, desde Dom João VI, estarão julgando um ex-presidente da república, vários generais e, claro, alguns lacaios...

A polícia, com seus cachorros, cassetetes, celulares e suas ânsias por exercer o monopólio da violência (que o Estado lhe garante), se movimenta pelas beiradas da delgada arquitetura de Lucio Costa e do Niemayer... e aos fundos, bem em frente ao pombal, construído pelo Jânio Quadros, o Oráculo de Delfos... Há saltimbancos vindos de todo o país, e não faltam pedagogos: Em cada esquina um advogadozinho, um juristazinho, uma influencer, um professorzinho, um ou outro seminarista, um ou outro astrólogo que fazem suas profecias, dão explicações e destrincham os liames e os labirintos das leis e do julgamento. Um coroinha até cita a Pascal: "Não conseguindo que a justiça fosse forte, fez-se que a força seja justa..."

Mas... e a dosimetria das penas? E os embargos infringentes? E as condições das cadeias? E a pena perpétua? E se o preso ir a óbito, atrás das grades? E se der tudo errado? E se o Trump (com uma pata na Venezuela e outra aqui) mandar soltar todo mundo? E se Godot aparecer inesperadamente ali pelos lados do Itamarati, anunciando o Fim dos Tempos e a ressureição dos mortos???

Será assim e assado. Primeiro isto e depois aquilo. Os protocolos. As regras, a democracia. As artimanhas e os famosos acordãos... Gente que trabalha ali há 40 anos, que ficou milionária vendendo algemas e que conhece as trapaças em detalhes... e até o latim e a semiótica daquele blábláblá interminável, juram que faça-se o que se fizer, é impossível evitar as misérias do Processo Penal... Misérias que, inclusive, os que estão sendo julgados conhecem muito bem, e cujo conhecimento é terapêutico, os faz aparecerem no picadeiro sem grandes ansiedades e até com uma certa soberba. Conhecem o script, o rito, o início, o meio e o fim. Sabem que esse é o 'ganha pão' tanto dos juízes, como dos promotores, dos advogados, dos carcereiros, dos jornalistas e de muitos outros atores (visíveis e invisíveis) envolvidos nesse espetáculo, e que portanto, como o "espetáculo é a droga dos escravos", tem que continuar, já que todos, como você e eu, precisam fazer seu papel nele, se quiserem comprar o vinho e sobreviver. Já que, no final das contas, ser condenado ou não, dá no mesmo... Prestem atenção como os presídios e as cadeias estão cheias de gente de todos os signos, partidos e seitas... E que o que importa, realmente, é saber confundir o Código Pessoal com o Código Penal; é salvar um ou outro cânone moral, as aparências e, claro, contentar a parte faminta da turba... sempre sabendo, evidentemente, que amanhã ou depois de amanhã, tudo virará cinzas sem que ninguém, sequer, tome conhecimento... 

E por falar em Misérias do Processo Penal, nesta manhã quase misteriosa, até o velhinho que vende souvenires  na entrada do Tribunal exibia o livreto do conhecido jurista italiano Francesco Carnelutti: As misérias do Processo Penal... Conhecem?  jurista que foi figura famosa na monarquia italiana, que fundou a União dos juristas italianos católicos e que inspirou o Direito Romano (e por tabela) também o nosso. É dele este parágrafo quase metafísico e descaradamente, religioso: [As pessoas crêem que o processo penal termina com a condenação, o que não é verdade. As pessoas pensam que a pena termina com a saída do cárcere, o que tampouco é verdade. As pessoas pensam que a prisão perpétua é a única pena que se estende por toda a vida: eis aí outra ilusão. Senão sempre, nove em cada dez vezes a pena jamais termina. Quem pecou está perdido. Cristo perdoa, os homens não...]











    Nenhum comentário:

    Postar um comentário