Por pouco não voei pelos ares junto com os dois banheiros químicos que estavam instalados a alguns metros do altar-mor da Catedral. Não respeitam nem mais os lugares sagrados e quem está dando uma saborosa mijada! - ouvi um velhinho resmungando. Foram necessários apenas quatro coices e foi plástico e urina para todos os lados. Os black blocs podem até ser uns bad boys, mas são bons de chute. Nunca havia participado de uma manifestação tão eclética e tão holistica. Havia manifestantes de todos os tipos e de todas as colorações. De direita, de esquerda, do centro, ambidestros, beatos, ateus, torturados e torturadores, bons moços, velhos e adolescentes, burgueses, pés de chinelo, filhinhos da mamãe, riquinhos e bandidos profissionais, intelectualoides, muitos fdp e muita gente boa, todos unidos por uma utopia que dificilmente se concretizará! De mãos dadas iam niilistas e esperançosos, trabalhadores e vagabundos inveterados, agentes da polícia federal, agentes da Papuda, aposentados, gente que defende a Amazônia, grupos que pediam punição aos torturadores, um grupo que exigia a prisão imediata dos mensaleiros, alcaguetes, gente reclamando da saúde, um casal de bicicleta pedindo a expulsão da multinacional Monsanto, um velhinho com uma bandeira de ex-combatente, evangélicos destribuindo santinhos, jovens com placas contra a corrupção, discípulos do Papa Francisco, pessoas que atacavam a mãe de Renan Calheiros, uma louca gritando que em breve Jesus voltará e perguntando se estaríamos preparados? Policiais travestidos de fotógrafos, fotógrafos atuando como policiais, o Grupo dos excluídos, gente sem teto, o pessoal do transporte coletivo gratuito, a mídia oficial e a mídia doméstica, helicópteros dando rasantes, caminhões dos bombeiros lá no meio da poeira esperando por uma catástrofe, tiros, bombas, fumaça, sirenes, alguém com um rádio minúsculo comemorando o primeiro gol no Estádio Mané Garrincha. Vendedores de água torneiral e muita polícia tonta e pueril sem saber muito bem o que fazer com sua agressividade, o que estava fazendo ali e quem eram os verdadeiros inimigos, se é que havia realmente algum. Uma suruba tupi-guarani, um desvario tropical, uma confirmação de que nos próximos dois mil anos ainda estaremos no lugar surreal e cômico em que nos encastelamos.
Um pouco mais tarde, vejam que coincidência, destruíram também todas as vidraças do restaurante onde costumo saciar diariamente meus desmedidos apetites. E encontrei entre eles, sabem quem? O mendigo K. Todo de preto, uma camisa enrolada na cabeça, exercitando a ginga do capoeirista e correndo da polícia de uma calçada a outra, com um pedaço de ferro na cintura e três pedras numa pequena bolsa. Foi uma surpresa, pois sempre o considerei um bunda mole oportunista e um mendigo em paz com sua miséria e com o establishment. Depois de vê-lo arremessar as pedras certeiramente contra uma agência de automóveis e de expressar gozo e prazer com a barulheira das vidraças despencando, lhe perguntei:
- Qual a lógica e a causa?- Lógica? Causa? Que causa? Nenhuma! Não funcionamos movidos por causas! Respondeu-me, enquanto passava brilhantemente uma rasteira num soldado que tentou jogar-lhe pimenta nos olhos.
- Não tenho causa. Busco apenas o prazer subversivo de atacar o sistema! Que seja capitalista, é apenas um acaso, poderia ser comunista ou qualquer outra merda! E não pense que se trata de um dever militante a que estou obrigado para libertar esta ou aquela classe. Não. O faço apenas pelo prazer renovado do jogo subversivo da destruição de tudo. Apesar de vosso espanto e de vossa dialética, nosso amor é de outra ordem e habita outra galáxia!
O mendigo K. deveria palestrar nas universidades do Brasil.
ResponderExcluirCara, que crônica!!! Este é o mundo em que vivemos!! Muitos ainda não entenderam.
ResponderExcluirEstamos nessa também! Abraços! Também sou como o K.
ResponderExcluirO Mendigo K merece um livro com os melhores encontros.
ResponderExcluirAiii, que preguiça!
ResponderExcluirE ai? Mesmo que K e talvez o Ezio estejam com certa razão, quem é que ta se movimentando de fato, pra alterar o contexto???
Sempre tem meia dúzia de "intelectualóide" criticando o sistema, que de fato, é uma merda, mas, repito, o que é q cada um tem feito, alem de arrotar críticas?
Como diria o grande filósofo Falcão: "Sei que a burguesia fede mas tem dinheiro pra comprar perfume".
Mega fácil falar mal de tudo e viver na ponte aérea, indo pra Katmandu, Tailândia, França, Londres...
Você esqueceu Paris, que é uma maravilha!
Excluirkkkkkkkkkkkk... Ezio, tu és uma figurinha...kkkkkkkkkkkkkkkkkkkk
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