domingo, 23 de janeiro de 2000

A Teatralidade da Vida Amorosa


O que se conhece por «relacionamento aberto» não é em sí nem melhor nem pior do que os relacionamentos tradicionais e monogâmicos, já que a questão fundamental de uma vida amorosa prazeirosa não passa pela forma, mas pelo conteúdo das relações. O que observamos na escuta clínica, é que as pessoas que conseguem relacionar-se bem com seu desejo, com seu corpo e com sua própria sexualidade, têm sempre maiores possibilidades de construir com o Outro um relacionamento amoroso satisfatório, seja ele da forma que for.


É importante notar que o que muitas vezes está subjacente em relacionamentos abertos, é a incapacidade de separar-se. Quase sempre são relações que não têm mais nada de «amorosas», onde o casal de amantes transformou-se numa «sociedade»: sócios da casa, dos filhos, do carro, etc., e que acham mais cômodo não desfazer a parceria. Outras vezes, essa necessidade de ter relacionamentos paralelos, está ancorada na incapacidade de um ou outro parceiro (ou dos dois) de desfrutar prazeirosamente da própria sexualidade, ou por frigidez ou por impotência, por disputa sexual entre os parceiros, pela intromissão de fantasîas pré-genitais conflitivas durante o ato, por raiva inconsciente do desejo e do prazer do outro, etc. etc. Já que às vezes, as espectativas ou as exigências sexuais de um dos parceiros com quem se co-habita vão se transformando em formas insuportáveis de controle e de repressão sexual.

Considerando que o gozo feminino, ainda hoje, em pleno ano 2000, é ainda um tabu, e que a maioria absoluta das mulheres ainda não consegue gozar sem sentir-se culpada, degenerada e puta, a nível de discussão, poderia-se perguntar: até onde o «relacionamento aberto», ao invés de uma alternativa ao «casamento tradicional», não é mais um truque do mundo masculino para «remediar» a incompatibilidade amorosa doméstica?

Ezio Flavio Bazzo