segunda-feira, 2 de julho de 2018

Assim falou a anarquista russa EMMA GOLDMAN... (1869-1940)

(EMMA GOLDMAN) A TRAGÉDIA DA EMANCIPAÇÃO DA MULHER


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A paz ou a harmonia entre os sexos e os indivíduos não depende necessariamente duma superficial igualdade entre os seres humanos, nem tampouco supõe a eliminação dos traços e peculiaridades individuais. O problema a que temos que fazer frente na actualidade, e que se resolverá num futuro não muito distante, é como ser igual a si própria e ao mesmo tempo manter-se unida aos outros, sentirmo-nos profundamente ligadas com todos os seres humanos e, ainda assim, mantermos as nossas características pessoais. Parece-me que essa será a base sobre a qual a massa e o indivíduo, a verdadeira democracia e a verdadeira individualidade, o homem e a mulher se podem unir sem antagonismos ou resistência.
Que independência pode alcançar a grande massa de raparigas e mulheres trabalhadoras se a falta e a ausência de liberdade em casa for substituída pela falta e ausência de liberdade na fábrica, na oficina, nos armazéns ou nos escritórios? A juntar a isto há o peso que muitas mulheres são obrigadas a suportar quando tratam do seu “lar, doce lar” – frio, monótono, pouco atractivo – depois de um duro dia de trabalho. Gloriosa independência. Não  nos surpreende que centenas de raparigas estejam desejosas de aceitarem a primeira oferta de casamento, fartas e cansadas da sua “independência” atrás do balcão ou das máquinas de coser ou de escrever. Estão tão predispostas a casarem como estão as raparigas da classe média, que anseiam libertar-se do jugo da supremacia dos pais. A denominada independência,  que apenas conduz a que se receba a simples subsistência, não é tão atractiva nem tão ideal que se possa esperar que a mulher sacrifique tudo por ela. A nossa tão gabada independência é, no fim de contas, um lento processo para debilitar e atrofiar a natureza feminina, o seu instinto amoroso e maternal.
É certo que o movimento pelos direitos da mulher quebrou muitas cadeias, mas também forjou novas. O grande movimento pela verdadeira emancipação ainda não encontrou o tipo de mulher que olhará de frente a liberdade. O seu limitado e puritano posicionamento afasta o homem, como sendo um elemento perturbador e de carácter incerto, da sua vida emocional.
Segundo ele, o homem não deveria ser tolerado, em nenhuma circunstância, a menos, talvez, como procriador de uma criança,  já que não se podem ter filhos sem pai. Felizmente o mais rígido puritanismo nunca será suficientemente forte para matar o inato instinto de maternidade. A liberdade feminina está estreitamente ligada à liberdade masculina, e muitas das denominadas “irmãs emancipadas” parecem esquecer o facto de que um filho nascido em liberdade necessita do amor e da devoção de todos os seres humanos que estejam à sua volta, sejam homens ou mulheres. Infelizmente é essa concepção limitada das relações humanas que tem originado, na actualidade, a grande separação entre os homens e as mulheres.
Tem sido demonstrado, inúmeras vezes e de maneira concludente, que a antiga relação matrimonial reserva para as mulheres apenas um papel de criada do homem e geradora dos seus filhos. E, apesar disso, encontramos muitas mulheres emancipadas que preferem o casamento, com todas as suas deficiências, às limitações da vida de solteira: limitada e insuportável devido às regras da moral e aos preconceitos sociais que impedem e restringem a sua natureza.
A explicação para tais contradições, por parte de muitas mulheres que se dizem livres,  está no facto de que elas nunca entenderam realmente o que quer dizer emancipação.
Elas pensavam que o que precisavam era de se libertarem dos tiranos externos; os tiranos internos, muito mais perigosos para a sua existência  e desenvolvimento – os convencionalismo éticos e sociais – ficaram de fora e agora têm ainda mais relevo. Persistem nas cabeças e nos corações das mais activas defensoras da emancipação feminina, do mesmo modo que anteriormente estavam nas cabeças e nos corações das suas avós. Estes tiranos internos, seja na forma de opinião pública ou do que dirá a mãe, o irmão, o tio ou qualquer outro parente; o que dirá a senhora Grundy ou o senhor Comstock, o patrão, o Conselho Educativo; o que dirão todos esses intrometidos, detectives morais, carcereiros do espírito humano?
Até que a mulher aprenda a enfrentá-los, mantendo com firmeza as suas convicções, defendendo sem restrições a sua liberdade, escutando a voz da sua própria natureza, ou chamando-a o grande tesouro da vida, amando um homem, ou o seu mais glorioso privilégio que é o direito de dar à luz um filho, não poderá dizer de si própria que está emancipada. Quantas mulheres emancipadas foram suficientemente sábias para reconhecerem que a voz do amor as chamava e as atingia com prazer exigindo ser ouvida?
As discípulas da emancipação, duma forma simples e terra a terra, declararam que eu era uma pagã, que devia ser queimada na fogueira. O seu cego fanatismo não lhes permite ver que a minha comparação entre a velha e a nova mulher apenas teve como objectivo mostrar que muitas das nossas antepassadas tinham mais sangue nas veias, mais humor e inteligência e, certamente, um maior grau de naturalidade, bondade e simplicidade. do que tem a maioria das nossas mulheres profissionalmente emancipadas que enchem as faculdades, as salas de aula e os diversos escritórios. Isto não significa um desejo de regressar ao passado, nem condenar a mulher à sua antiga posição, que era a cozinha e tratar dos filhos.
O direito de voto ou a equiparação dos direitos civis podem ser boas reivindicações, mas a verdadeira emancipação não surgirá das urnas de voto nem dos tribunais. Surgirá de dentro da mulher. A história mostra-nos que as classes oprimidas só se libertam verdadeiramente dos seus amos através da sua própria luta. A mulher deve aprender essa lição e estar consciente de que a sua liberdade chegará tão depressa quanto for a sua capacidade para a alcançar. Por isso é tão importante que ela comece com a sua regeneração interior para se libertar do peso dos preconceitos, das tradições e dos costumes. A reivindicação de igualdade de direitos em todos os aspectos da vida é justa e razoável; mas, no fim de tudo, o mais importante direito é o de amar e ser amada. Se a emancipação parcial quiser transformar-se numa completa e verdadeira emancipação da mulher, deve deixar de lado as noções ridículas de que ser amada, estar comprometida ou ser mãe, são sinónimos de escravidão ou de subordinação. Deve deixar de lado a absurda noção de que existe um dualismo entre os sexos ou que o homem e a mulher representam dois mundos antagónicos.
A insignificância separa; a amplitude une. Sejamos grandes e generosas. Não descuidemos as questões decisivas devido à imensidão de ninharias que temos de enfrentar. Uma concepção séria da relação entre os sexos não deve admitir os conceitos de conquistador e conquistado; deve apenas ter esta premissa: darmo-nos sem limite com o objectivo de nos tornarmos mais ricos, mais profundos, melhores. Apenas isto poderá preencher o vazio e transformar a tragédia que tem sido a emancipação da mulher em felicidade, numa alegria ilimitada.

“Emma Goldman; Uma mulher extremamente perigosa”  (“Emma Goldman: An exceedingly dangerous woman”, 2003) é um documentário de Mel Bucklin (aqui com legendas em  castelhano)  que gira em torno da figura de Emma Goldman, considera durante trinta anos como o inimigo númerro dos Estados Unidos, não por cometer actos violentos, mas por utilizar a armas mais perigosa que está à mão de qualquer ser humano: a razão. Com uma vida apaixonante, Emma Goldman, em conjunto com Alexander Berkman, esteve no olho do furacão do movimento anarquista entre os finais do século XIX até boa parte da primeira metade do século XX. Anarquista célebre de origem lituana, conhecida pelos seus escritos e manifestos radicais, libertários e feministas, foi também uma das pioneiras na luta pela emancipação da mulher. 

3 comentários:

  1. http://andreforastieri.com.br/blog/christopher-hitchens-nosso-ultimo-ano/

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  2. https://www.youtube.com/watch?v=a1PBxaB6pNI

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