quarta-feira, 7 de junho de 2017

A Idade Média é aqui...

Deparei-me com o mendigo K nesta tarde ensolarada e seca, bem ali no estacionamento de um posto de saúde. Estava com sua mulher cuspindo fogo pelas ventas. Ao ver-me foi logo parafraseando esta frase que, há dois ou três anos atrás um político lançou contra outro: o Sistema de Saúde me desperta os instintos mais primitivos! E continuou: minha mulher - apontou para uma senhora de olhar perdido, quase apagado e aos farrapos que estava ao seu lado - precisa tomar a vacina da gripe, passamos em todos os postos da cidade e nada. Não há mais vacina nenhuma... 
Mas o problema maior de minha cólera, nem é este, o problema é ver como são esses ambientes: tudo aos pedaços, gente jogada pelo chão, vidraças quebradas, cheiros de pastéis misturado com cheiro de banheiros, lixeiras transbordando, gente brigando, feridas expostas, vômitos nos berçários, a policia atrás de uma criança que foi roubada, ácaros descendo dos aparelhos sem manutenção, uma mulher chorando seu morto que é levado para uma ambulância como se fosse um bujão de gás... Um repórter fazendo a mesma matéria de há vinte anos. Filas, multidões, aglomerações, um tratamento policialesco, senhas, as malditas senhas. Um médico aparece no umbral de sua sala para chamar seu paciente número 42 do dia... parece que está prestes a desmaiar. Enxugar gelo... Uma loucura completa. Um suicídio coletivo. Uma vingança contra si mesmos... E ninguém se rebela. Por falta de uma referência todo mundo se submete. Pelo menos um analgésico doutor! Uma maca! Uma morfina! Um tiro de misericórdia!
Quando é que se declarará estado de sítio para resolver radicalmente toda essa miséria?
O quê aconteceu com essa gente para ter chegado tão passivamente a esse ponto tão miserável? Por quê armaram contra si mesmos toda essa indigência e todo esse desamparo? E os banheiros não funcionam. Não há água e o vaso está transbordando. Lavar-se as mãos... como Pilatos. Enquanto isso, ali no outro lado da Esplanada, milhares de policiais ingênuos e sem razão, cercam um dos SUPREMOS TRIBUNAIS para protegê-lo das massas e do populacho... lugar onde, desde a noite de ontem, os juízes e seus advogados tentam prostituir a linguagem para enganarem-se mutuamente. Um horror! Uma miséria ainda não descrita. Um niilismo caipira. Um complexo de inferioridade generalizado e incurável.
Impossível ouvir aquele homem acostumado a todos os horrores da rua fazendo esse discurso, sem lembrar de uma frase de Vargas Vila, falando de um dos tantos e porcos ditadores latinoamericanos: "Despreciaba mucho a los hombres para dignarse matarlos, y se conformó con oprimir-los..."p. 54 (Los Césares de la decadência)
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Em tempo:  Quando nos separamos vi que aproximou-se dele um senhor com aspecto de pastor ou de comerciante que havia ouvido seu desabafo e que lhe perguntou criticamente: 
-Mas o senhor é mesmo tão pessimista assim? O senhor não vê nenhuma luz, nenhuma chama de esperança no fim do túnel? 
Ao que ele lhe respondeu a queima-roupa e com a máxima serenidade:
-Ora, meu senhor, claro que eu vejo uma luz no fim do túnel. E que, por sinal, é uma luz bem intensa e tremulante... (fez um breve intervalo e continuou) Você vai caminhando..., caminhando túnel a dentro.., em direção a ela... vai se aproximando e sentindo uma paz e um conforto estranho em seu coração... até começar a perceber um odor a nitroglicerina e a descobrir que se trata do pavio aceso de um dinamite... 
Abriu os braços e explodiu numa gargalhada.

3 comentários:

  1. http://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/brasil/2017/06/07/internas_polbraeco,600839/mulher-deita-no-chao-do-palacio-do-planalto-e-grita-que-ama-temer.shtml

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  2. http://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/ciencia-e-saude/2017/06/07/interna_ciencia_saude,600869/homo-sapiens-surgiu-100-mil-anos-antes-do-que-se-pensava-aponta-estud.shtml

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  3. http://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/cidades/2017/06/09/interna_cidadesdf,601285/saiba-quem-sao-e-como-vivem-os-pais-do-bebe-sequestrado-no-hran.shtml

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