domingo, 13 de outubro de 2013

Biografias e canalhografias...

 "Nada é verdade, a não ser aquilo que não se diz..."
(Sófocles, em Antígona)

Parecem intermináveis as discussões entre nossos "artistas", "compositores" e outros malandros sobre as tais biografias. Se devem ser autorizadas, se podem ser livres, se devem ser pagas, dizer só a verdade ou se podem descambar para a gandaia, a inveja, a mentira, o puro panegírico ou para a mitologia que os leitores gostam.., bem como se o biografado já deve estar apodrecido numa cova ou se ainda pode estar por aí tagarelando, pavoneando-se e enchendo o saco do mundo etc. Sinceramente, a biografia em si não lhes parece o registro de um fóssil? Um sintoma tanto da arrogância quanto da miséria humana? E se a biografia já é um gênero suspeito e fútil tipo cobra enroscante, imaginem então as autobiografias... Ah!, e eu sei por experiência própria, que é preciso ter estômago para revirar as porcarias dos outros e pior, as próprias, e ainda por cima, edita-las! É necessário ser muito canalha e algo assim como um verme narcisista para achar que sua história de artista, político ou de traficante (seja ela autorizada ou não) tem algum interesse especial e alguma serventia para a história do resto da manada... tenha o sujeito sido um rato ou um Borges, tenha tido uma existência infernal como a de Sísifo ou protagonizado uma história de banquetes, de surubas e de aventuras nababescas como a de Calígula. E depois, observe como todo biografado, vivo ou morto, consciente ou inconscientemente é um impostor, trate-se de um Dalai Lama ou do bandido da Luz Vermelha, e como seu biógrafo, inevitavelmente assume o papel de coadjuvante dessas imposturas. 
Meu cachorro, que já visitou o cemitério de animais aqui da cidade, sempre me pergunta: por que não contentar-se com a micro narrativa biográfica que em algumas culturas vai na lápide? Aqui jaz fulano de tal! Nasceu em 1812 e pifou as turbinas às 3:45 h, do dia 04 de setembro de 1879? Na melhor das hipóteses pode haver até uma frase tipo: 

Era maçom e gostava de jogar baralho! 
Nasceu na arraia-miúda, mas se tornou misteriosamente uma celebridade! 
Lia os gregos no original, mas isto não lhe serviu para merda nenhuma! 
Matou os vizinhos por motivos legítimos e em seguida engasgou-se com uma sardinha! 
Chamava-se Diana. Ela e suas irmãs todas tinham nomes de divindades ou de cadelas francesas! 
Deixou mais dívidas e ressentimentos que saudades!

Mas não. O cara leva um tiro ou faz um samba e já passa a ser candidato a uma biografia de 400 páginas. Faz um despacho ou uma macumba em latim e já recebe convites de uma editora para contar sua trajetória. A moça é pega trepando nos gabinetes do Congresso Nacional e já é capa de revista, escrevem uma resenha sobre suas medidas e suas intimidades e fazem um curta com ela... Que necessidade e que obsessão é essa - perguntaria Fialho D'Almeida - de ejacular patifarias? E neste caso, também é interessante observar que o biografista sempre começa sua obra mais ou menos assim: Sem imaginar que Brasília era uma toca de jararacas, veio jovenzinha e casta do interior trazida por um bondoso e cristão parlamentar, só que aos poucos, influenciada tanto pelo tilintar das moedas, como pelos hormônios e pelos contos de Boccaccio, foi entregando-se ao pernicioso e saboroso vício genital...

4 comentários:

  1. http://oglobo.globo.com/cultura/biografo-toninho-vaz-entra-na-justica-contra-familia-de-leminski-10350382

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  2. http://oglobo.globo.com/cultura/joaquim-barbosa-fala-sobre-biografias-ideal-seria-liberdade-total-de-publicacao-10360948

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  3. http://www.gazetadopovo.com.br/cadernog/conteudo.phtml?tl=1&id=1417117&tit=Pellegrini-torna-publico-livro-sobre-Leminski

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  4. http://veja.abril.com.br/blog/augusto-nunes/feira-livre/liberdade-e-poder-falar-mal-de-carlos-brickmann/

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